NORMAS DE AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO ESCOLAR NO CAP UFRJ: UM ESTUDO AVALIATIVO COM PADRÕES DE QUALIDADE

Resumo: O estudo avaliou as normas de avaliação do desempenho escolar, no Colégio de Aplicação, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, nos níveis de ensino fundamental e médio, segundo a percepção de professores. Adotou abordagem centrada em objetivos. A partir de lista de verificação validada, submeteu as normas a julgamento frente a três categorias de padrões adaptados. As normas mostraram-se úteis à comunidade e fragilizadas quanto às suas adequação e precisão, pois não expressam o que o CAp considera justo e ético frente ao jubilamento e reprovação, nem embasam decisões coletivas do conselho de classe quanto à aprovação, reprovação e processos pedagógicos, nem favorecem que estas decisões sejam respeitosas à cultura e ao contexto escolar.

Palavras-chave: Normas de Avaliação; Objetivos da Avaliação Escolar; Padrões em Educação


A CENTRALIDADE E O LOCUS DA AVALIACÃO

O Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro _ CAp UFRJ_ é órgão suplementar do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFRJ, tendo representação política em instâncias colegiadas diversas. Sua estrutura administrativa consta de diretor geral, vice-diretor e sete diretores adjuntos e membros das equipes especializadas. Pedagogicamente, dispõe de 17 setores curriculares ocupados do ensino fundamental I – do 1º. ao 5º. anos; do ensino fundamental II – do 6º. ao 9º. anos; do ensino médio – da 1a. a 3a. séries, além de acolher e acompanhar a formação de estagiários dos Cursos de Licenciatura da UFRJ. O quadro efetivo funcional inclui 60 técnicos administrativos e 94 professores, sendo 95% com dedicação exclusiva e formação em nível de pós-graduação (31% doutores, 51% mestres, 14% especialistas e 4% graduados), permitindo-lhes conceber, desenvolver, implementar e/ou avaliar projetos de ensino, pesquisa e/ou extensão (UFRJ, 2015). As principais finalidades do CAp são:

(a) proporcionar condições para que o seu aluno vivencie experiências que favoreçam o crescimento bio-psico-social, estimule o espírito crítico, propicie conhecimentos e habilidades que o situem no mundo e promovam a oportunidade de se assumir criticamente; (b) proporcionar aos licenciandos da UFRJ prioritariamente campo adequado para observação, prática de ensino e estágio supervisionado, complementando a formação de professor de ensino fundamental e médio, bem como a do orientador educacional com o instrumental didático indispensável ao bom desempenho de suas atividades no campo da Educação e (c) promover a pesquisa e a experimentação pedagógica com o objetivo de apontar novas direções para o processo educacional. (UFRJ, [s. d.]).

O Projeto Político Pedagógico do CAp está diretamente relacionado à formação dos setores curriculares e à tríade ensino, pesquisa e extensão, além dos espaços democráticos de debate e deliberações (UFRJ, 2015). Em 2015, 798 alunos estavam matriculados, 498 no ensino fundamental e 300, no médio. O número de licenciandos da UFRJ, em Prática de Ensino, era 400. Para fins de preenchimento das vagas, desde 1999, o CAp realiza sorteio público anual, processo estendido para a classe de alfabetização a partir de 2000. Atualmente, a disponibilidade de vagas para sorteio tem número fixo para candidatos à classe de alfabetização e à 1as. série do ensino médio. Junto a estas turmas, bem como às de 2a. séries do ensino médio, o processo seletivo tem características próprias.

Na escola, todo o processo avaliativo é regido por sistema que articula leis, portarias, resoluções, normas viando orientar e regular a avaliação do desempenho escolar. Muito especialmente, a falta de entendimento comum sobre as normas diretoras de uma instituição de ensino gera diversos prejuízos ao andamento da rotina da escola, favorecendo desde a desestruturação do calendário pré-definido de avaliações até o surgimento de conflitos internos. Durante o quadriênio 2009-2013,  na condição de diretor adjunto de ensino do CAp UFRJ, Andrade (2015, p. 15) constatou que a comunidade escolar apresentava dúvidas e divergências quanto à aplicação das normas de avaliação de aprendizagem, evidenciadas a partir de(a,o):

(a) alterações nas datas de avaliações em desacordo ao pré-definido pelo calendário escolar; (b) aplicação de avaliações em número diferente do estabelecido para cada período letivo; (c) descontentamento quanto à organização do calendário de aulas e/ou provas, em especial, nos períodos de recuperação; (d) comunicação aos alunos de eventuais alterações em dias e horários de aulas, sem a devida anuência da Direção Adjunta de Ensino; (e) críticas decorrentes de autorizações administrativas para aplicação de provas de segunda chamada, por motivo alheio ao estabelecido pelas normas; falta de clareza sobre a forma pela qual se calculam as médias de notas e/ou conceitos trimestrais e anuais.

Tais eventos indicaram a necessidade de as referidas normas serem avaliadas formalmente quer porque são elementos essenciais na definição da identidade institucional, quer porque interferem diretamente na progressão da vida escolar do aluno e até na sua permanência na Instituição. Em razão disto, o objetivo estabelecido para o estudo foi avaliar a qualidade das normas de avaliação do desempenho escolar [Resolução 02/2008], no CAp UFRJ, nos níveis de ensino fundamental e médio, segundo a percepção dos professores. Em decorrência, o objeto da avaliação passa a ser apresentado.

O OBJETO DO ESTUDO, A RESOLUÇÃO 02/2008

A Resolução Nº 02/2008 (UFRJ, 2008) trata das normas de avaliação do desempenho escolar nos ensinos fundamental e médio do CAp UFRJ, e está em vigor desde 2009. Confrontando o teor desta Resolução ao de sua anterior, a de Nº 01/2008, constata-se que as modificações introduzidas incluíram: (a) redução do número de períodos letivos do calendário escolar e de conselhos de classe; (b) ampliação do número de períodos destinados à recuperação paralela; (c) diminuição da média para aprovação no período letivo; (d) elevação da média da recuperação final; (e) flexibilização das condições para recusa da renovação de matrícula para o ano/série subsequente (a jubilação). No tocante ao quesito, ressalta-se: “Não será computada, para efeito de jubilamento, retenção no 1º ano do ensino fundamental.” (UFRJ, 2008, s/p.). Na sequência, caracterizam-se, em destaque e continuamente, os elementos normativos que regulam a avaliação do desempenho escolar no CAp.

Avaliação contínua. Caracteriza-se por ser progressiva e cumulativa; informa acerca do “[...] desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais.” (BRASIL, 1996). Deve ser realizada durante o desenvolvimento das atividades relativas à(s) disciplina(s). A Resolução Nº 02 (UFRJ, 2008) orienta que a continuidade da avaliação se expressa a partir das três notas trimestrais, que, por sua vez, devem resultar de, pelo menos, duas avaliações de aproveitamento. A escala de notas pode ser numérica (de 0 a 10) ou conceitual (de Muito Bom – MB a Insuficiente - I), aplicável à Oficina das Palavras, Música, Artes Visuais e Cênicas. Para os alunos do 1º ano do ensino fundamental, os resultados da avaliação contínua são descritivos e registrados em relatórios individuais com particularidades definidas. Segunda chamada. Consiste na oportunidade de aferir o desempenho do aluno que tenha faltado a uma das avaliações previstas pelo calendário escolar. Para usufruir dela, precisa comprovar a ocorrência de doença impeditiva ou dificuldade legal, no dia previsto para a realização da prova. Composição da Média Anual. No CAp, a média anual corresponde ã média aritmética das três notas trimestrais.  No caso das disciplinas que atribuem conceitos, o conceito anual resulta dos conceitos trimestrais e de critérios específicos, definidos pelos setores curriculares correspondentes. Conselhos de Classe (COC). Os conselhos de classe são realizados ao final de cada trimestre e após a recuperação anual. Visam avaliar o desempenho do aluno e o processo pedagógico. Seus membros são o diretor adjunto de ensino, membro do Serviço de Orientação Educacional (SOE) e professores da turma. Licenciandos podem  participar, na condição de observadores. A partir do 6º ano do ensino fundamental, alunos representantes de turmas compõem o Conselho. A decisão em promover ou reter o aluno que não aferiu média suficiente para aprovação no respectivo ano letivo é competência do COC final. Recuperação. Os três períodos de recuperação (duas paralelas e uma anual) são seguidos de avaliações de aproveitamento. As recuperações acham-se assim concebidas: “a) um período de orientação de estudos presencial, coordenado pelo professor da disciplina; b) estudos de recuperação desenvolvidos pelo aluno; c) avaliação de aproveitamento” (UFRJ, 2008). O encaminhamento do aluno para atividades de recuperação paralela depende de seu desempenho, no trimestre -igual ou inferior a 6,0 (seis) ou ao conceito D. A recuperação anual é aplicável, ao aluno que: (a) em qualquer disciplina tenha frequência anual igual ou superior a 75% e média ou conceito anual igual ou superior a 3,0 ou D, respectivamente; (b) média anual menor que 6,0 ou conceito anual igual a D; (c) nota inferior a 3,0 ou conceito igual a I, no 3o. trimestre; (d) frequência inferior a 75%, em qualquer disciplina. Após a recuperação anual, a média ou conceito final são recalculados com base no desempenho obtido na recuperação anual e em notas ou conceitos anteriores. A aprovação requer média ou conceito final igual ou superior a 6,0 ou R.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A condução de toda avaliação pressupõe a escolha de uma ou mais abordagens; no caso, a abordagem centrada em objetivos. Para tal, os padrões de avaliação de programas, estabelecidos pelo Joint Committee on Standards for Education Evaluation, foram estudados, pois apresentam  em “[...] linguagem clara e de fácil apreensão, diretrizes capazes orientar a elaboração de projetos avaliativos de programas ou de outros objetos de avaliação, quanto para a execução deles próprios.” (ELLIOT, 2011, p. 950). Das cinco categorias de padrões, três foram selecionadasao mostrar afinidade com o propósito do estudo: a de utilidade, ocupa-se do nível de satisfação das necessidades dos interessados (stakeholders) no programa, considerando processos e produtos envolvidos; a de adequação, diz respeito àquilo que é apropriado, válido, legal, correto, aceitável e justo na avaliação; e a de precisão,  tem a ver com a exatidão das representações, proposições e resultados decorrentes do estudo avaliativo, especialmente aqueles que dão suporte a julgamentos relativos à qualidade do programa e/ou de seus componentes. Na sequência, as análises textual e temática (SEVERINO, 2013) serviram de base à plena compreensão do teor de todos os padrões destas categorias, favorecendo a identificação dos mais compatíveis ao estudo. Em decorrência, foram selecionados quatro padrões de utilidade, dois de adequação e três de precisão. A adaptação destes padrões ocorreu com base nos pressupostos da análise interpretativa. A partir do conteúdo inerente a cada padrão, estabeleceram-se aproximações e associações entre as ideias comunicadas por eles e aquelas relacionadas ao conteúdo implicado na avaliação, isto é, conteúdos relativos à avaliação contínua do desempenho escolar, prova de 2ª chamada, composição das médias trimestrais e final, conselhos de classes, promoção, reprovação e jubilamento.   Desta etapa, os nove padrões originais deram origem a 10 padrões adaptados.

O instrumento de medida e avaliação construído no estudo foi uma lista de verificação: “instrumentos psicométricos convenientes, econômicos e versáteis e [podem] ser adaptados na medição de uma ampla gama de condutas, características pessoais e outros objetos, acontecimentos e condições.” (AIKEN, 2003, p. 364). Construída a partir dos padrões adaptados, a lista constou de 23 declarações, com opções de respostas (atende; atende parcialmente e não atende) capazes de informar o grau de atendimento das normas aos padrões. A inclusão de campo livre garantiu o registro de considerações, nos casos de atendimento parcial ou não atendimento ao padrão. A estrutura da lista incluiu título, introdução, instruções e itens (COLTON; COVERT, 2007). Na redação dos itens, os critérios de clareza, precisão e compreensibilidade; concisão e simplicidade do vocabulário; relevância, sequenciação e suficiência dos itens foram observados (SAMPIERI; COLLADO; LUCIO, 2013). A sua versão inicial obteve validações técnica e de conteúdo; esta “refere-se ao grau em que um instrumento reflete o domínio específico de conteúdo daquilo que se mensura.” (SAMPIERI; COLLADO; LUCIO, 2013, p. 219); aquela se relaciona ao fato de o instrumento apresentar qualidade de construção em atenção às regras da literatura da área (ELLIOT; HILDENBRAND; BERENGER, 2012). O estabelecimento da validade de conteúdo ocorreu a partir da consulta a dois especialistas em Educação, que afirmaram serem os conteúdos dos itens suficientes para cobrir os padrões adaptados; o da validade técnica, a partir da consulta a especialista em Avaliação, integrante do corpo docente do Mestrado em Avaliação, da Fundação Cesgranrio. As contribuições propostas foram incorporadas à versão final do instrumento, pré-testado por três professores do CAp UFRJ (MARCONI; LAKATOS, 1999, p. 34). Procedidas as modificações na versão pré-testada, obteve-se a versão final do Instrumento. Autorizada pela Direção Adjunta de Licenciatura e Pesquisa, e Conselho Pedagógico, a administração da forma impressa do instrumento ocorreu no período de 11 a 17 de novembro de 2015, junto a 32 professores respondentes: os cinco membros da Direção Adjunta de Ensino, 21 dos 87 professores efetivos, e seis dos 54 substitutos, lotados nos setores pedagógicos do Colégio. À exceção do grupo de diretores, a escolha  dos demais professores foi aleatória e correspondeu a 22,7% da lotação do CAp. A devolução dos instrumentos respondidos ocorreu uma semana após a sua distribuição e foi mediada pela Direção Adjunta de Ensino.

A análise e a interpretação se fizeram a partir dos dados quantitativos e qualitativos: os primeiros apresentados por tabelas e gráfico, possibilitando conhecer o atendimento das normas aos padrões adaptados; os segundos, lidos com base na análise de conteúdo sintetizadora, técnica que condensa as declarações dos respondentes em formulações mais amplas, de modo a sintetizar as ideias a um nível de abstração mais elevado (FLICK, 2014).

RESULTADOS

A princípio, apresentam-se, em linhas gerais, dados de caracterização dos 37professores, em 52, que devolveram o instrumento de avaliação: (a) sexo: feminino (24) e  masculino (13); (b) faixa etária: de 21 a 30 anos, seis; de 31 a 40 anos, de  41 a 50 anos, e de 51 a 60 anos, 10 em cada; acima de 61 anos, um; (c) vínculo funcional: 31, efetivos e seis, substitutos; (d) tempo de serviço no CAp: de 0 a 2 anos, sete; de 3 a 6 anos, oito; de 7 a 10 anos, cinco; de 11 a 15 anos, dois; acima de 16 anos, 15; (e) formação acadêmica: graduação, dois; especialização, cinco; mestrado, 16; doutorado, 14; (f) atuação/nível e/ou segmento de ensino: fundamental I e II, respectivamente, 10 e cinco; ensino médio, sete; ensinos fundamental II e médio, 12; ensinos fundamental I, II e médio, um.

Em seguida, os resultados da avaliação mostram o julgamento das normas de avaliação frente aos padrões adaptados, representados por itens do instrumento. O atendimento efetivo a cada padrão dependeu do atingimento ao ponto de corte arbitrado, 22, que, em um total de 37 respostas por item, corresponde a 0,84 de concordância, o que justifica a importância das normas para a orientação do processo avaliativo, no CAp UFRJ.

Atendimento aos padrões de utilidade

Da Tabela 1, consta o julgamento das normas frente aos padrões de utilidade.

Tabela 1 – Julgamento em relação aos padrões de Utilidade
Padrões Itens avaliados A AP NA
Atenção aos Interessados (stakeholders) As normas de avaliação orientam, de forma suficiente, a comunidade escolar quanto ao processo avaliativo do CAp UFRJ. 21 15 1
Informação Relevante As normas de avaliação contêm informações indispensáveis à composição das médias trimestrais, anual e final. 34 3 0
As normas de avaliação contêm informações indispensáveis sobre os tipos de atividades previstas para os períodos de recuperação paralela e anual. 17 14 6
As normas de avaliação fornecem informações essenciais para o estudante solicitar prova de segunda chamada. 31 4 2
As normas de avaliação especificam as condições necessárias para que se autorize a realização de prova de segunda chamada. 29 6 2
Processos Significativos As normas de avaliação contêm informações significativas para orientar o cálculo da composição de médias trimestrais. 31 5 1
As normas de avaliação contêm informações significativas para orientar o cálculo da composição da média anual. 35 2 0
As normas de avaliação contêm informações significativas para orientar o cálculo da composição da média final. 34 3 0
Preocupação com Consequências As normas de avaliação explicitam as condições que garantem a promoção do estudante para o ano ou série seguinte. 32 4 1
 As normas de avaliação explicitam as condições que levam o estudante ao jubilamento. 32 3 2
 As normas de avaliação explicitam as condições que levam o estudante à reprovação no ano ou série escolar. 30 6 1
Legenda: A=Atende, AP=Atende Parcialmente, NA=Não atende
Fonte: ANDRADE (2015).

A partir da Tabela 1, constata-se o atendimento a dois dos padrões da categoria: processos significativos (itens 6, 7 e 8) e preocupação com consequências (itens 9, 10 e 11). O padrão informação relevante foi atendido em parte: dos seus quatro aspectos,  três tiveram julgamento favorável: composição das médias trimestral, anual e final, (item 2), solicitação e autorização para realização de provas de segunda chamada (itens 4 e 5). O aspecto não atendido (item 3) evidencia que as normas não explicitam todo o conjunto de informações indispensável ao desenvolvimento das atividades nos períodos de recuperação paralela e anual. Os comentários são ilustrados em cinco segmentos de falas de professores:

As normas levam em conta apenas as aulas e a provas, esquecendo-se de outros instrumentos como trabalhos etc. 2. As atividades de estudo não são bem compreendidas por alguns pais e professores. 3. As atividades são tratadas de forma ampla e genérica [...]. 4. Existem lacunas sobre as possibilidades de atividades previstas e da concepção do processo em si. 5. Há certa indeterminação de quais procedimentos qualitativos podem ser combinados com a prova de recuperação paralela.

Submetidos à análise sintetizadora, os comentários permitiram identificar que as normas não ilustram possíveis atividades didáticas capazes de integrar o período de recuperação. Neste sentido, compreende-se que, havendo amplo conjunto de possibilidades pedagógicas, deve a coordenação pedagógica do setor curricular correspondente fornecer ao professor as orientações necessárias. Outros pontos evidenciaram a necessidade de: (a) o professor apropriar-se dos procedimentos metodológicos que lhe permitam transitar entre as abordagens qualitativa e quantitativa da avaliação; (b) as normas serem do amplo conhecimento da comunidade escolar, incluindo todos os seus segmentos específicos. Entende-se que o suprimento destas lacunas requeira a colaboração de setores especializados do CAp, a exemplo da Direção Adjunta de Ensino.

Na categoria, o único padrão de atendimento parcial foi atenção aos interessados (item 1). As razões que justificaram o julgamento de 15 (em 37) professores acham-se ilustradas nos três segmentos de fala:

1. É necessária maior clareza quanto aos artigos 12º b [reprovação] e 13º b [recuperação anual. 2. As Normas se baseiam muito na estrutura da composição das notas, o que não é suficiente para o processo geral. 3. As Normas [...] mencionam no artigo 1º que serão considerados os aspectos quantitativos e qualitativos. No entanto, trata apenas dos aspectos quantitativos.

As falas evidenciam dúvidas dos professores quanto às normas; outros as acusam de pouco claras ou de valorizarem o quantitativo. Na primeira delas, a inquietação refere-se ao teor de artigos relativos a elementos essenciais da avaliação; nas seguintes, à prevalência de orientação de caráter conteudista.

Atendimento a padrões de adequação

A Tabela 2 exibe julgamento das normas frente a padrões da categoria.

Tabela 2 – Julgamento em relação a padrões de Adequação
Padrões Itens avaliados A AP NA
Orientação Responsiva e inclusiva  As normas de avaliação orientam, de forma responsável, todo o processo avaliativo na escola. 22 11 1
 As normas de avaliação incluem todas as possíveis situações relacionadas à avaliação do desempenho escolar. 10 16 11
Clareza Textual  As normas de avaliação têm redação simples e precisa. 29 7 1
 As normas de avaliação apresentam informações claras. 26 10 1
Orientação Justa  As condições estabelecidas pelas normas de avaliação, em relação à aprovação do estudante para o ano ou série seguinte, são justas. 20 12 2
 As condições estabelecidas pelas normas de avaliação, em relação à reprovação do estudante, são justas. 15 13 6
Legenda: A=Atende, AP=Atende Parcialmente, NA=Não atende
Fonte: ANDRADE (2015).

A leitura da Tabela 2 evidencia que, na categoria, o único padrão atendido foi clareza textual (itens 14 e 15). O padrão Orientação Responsiva e inclusiva foi atendido em parte; apenas um de seus aspectos teve julgamento favorável: “As normas de avaliação orientam, de forma responsável, todo o processo avaliativo na escola.” (item 12); o outro aspecto foi parcialmente atendido: “As normas de avaliação incluem todas as possíveis situações relacionadas à avaliação do desempenho escolar.” (item 13). Seguem comentários ilustrativos:

De fato, [as normas] não atendem, pois não trazem uma conceituação sobre o que é avaliação para a escola. A aferição aparenta ser meramente formal e técnica. 2. Nem sempre são dadas as informações que, realmente, não “cabem” nas “normas”, mas que deveriam ser trabalhadas pela escola internamente e com as famílias e alunos também. 3. Falta uma reflexão sobre as possibilidades das atividades avaliativas em um Colégio de Aplicação – de experimentação. 4. Há necessidade de maior esclarecimento quanto aos aspectos qualitativos e seu peso.

Parte do que subjaz à discussão refere-se à amplitude com que as normas orientam o processo avaliativo; como lembra a declaração de docente: “Especificidades são especificidades e na maioria das vezes não podem ser contempladas nas normas.” Outra parte aponta para a necessidade de o CAp: (a) conceituar amplamente a avaliação; (b) ousar em metodologias inovadoras em relação à ela; (c) rever a sua posição ante as dimensões objetivas e subjetivas do processo avaliativo; (d) adotar estratégias pedagógicas que deem conta de necessidades especiais. Em decorrência, a ampla reflexão deste conjunto de argumentos aponta a importância de o CAp investir na conceituação da avaliação, pois, com isto, estará abrindo caminho para atender aos  demais aspectos julgados relevantes pelos professores.

O padrão Orientação Justa não foi atendido: nenhum dos três aspectos que avaliaram justeza das normas frente a situações de aprovação (item 16), reprovação (item 17) e jubilamento (item 18) foi julgado favoravelmente. Relacionam-se três comentários:

1. Não atendem às diferenças entre os alunos no que se refere a capital cultural, experiência escolar acumulada, diferenças no aproveitamento, dificuldades de aprendizagem etc. 2. Não acho que cabe jubilamento por rendimento em um Colégio de Aplicação. 3. [É preciso] entender o limite do jubilamento enquanto ‘fracasso’ da escola e descaso do indivíduo.

Por ocasião da análise sintetizadora, a apreciação dos comentários dos professores evidenciou rejeição à prática do jubilamento, considerada ou injusta ou  limitada ante às diferenças imbricadas no processo de avaliação.

Atendimento a padrões de precisão

A Tabela 3 apresenta o julgamento das normas frente aos padrões de Precisão.

Tabela 3 – Julgamento em relação aos padrões de Precisão
Padrões Itens Avaliados A AP NA
Decisões Justificadas  As normas de avaliação informam as condições que devem ser consideradas pelo Conselho de Classe para deliberar sobre a aprovação e reprovação de estudantes 11 11 15
 As normas de avaliação informam as condições que devem ser consideradas pelo Conselho de Classe para avaliar o processo pedagógico nas turmas. 8 11 18
 As normas de avaliação favorecem decisões que respeitam a cultura e o contexto escolar 11 12 12
Informação Válida  As normas de avaliação contêm informações válidas para orientar o processo avaliativo na escola. 21 10 5
Informação Fidedigna  As normas de avaliação contêm informações precisas para orientar o processo avaliativo na escola 15 18 3
 As normas de avaliação contêm informações precisas para orientar o processo avaliativo na escola. 14 18 4
Legenda: A=Atende; AP=Atende Parcialmente; NA=Não atende; SR= Sem resposta
Fonte: ANDRADE (2015)

Os dados da Tabela 4 revelam que, segundo a opinião dos professores, apenas um dos padrões da categoria foi atendido: informação válida. Em relação ao padrão decisões justificadas, desdobrado em três aspectos, os dois primeiros, evidenciaram que as normas de avaliação não especificam as condições a serem consideradas pelo Conselho de Classe para: (a) deliberar sobre a aprovação e reprovação de alunos (item 19) e (b) avaliar o processo pedagógico nas turmas (item 20). Ilustram-se opiniões registradas:

1. Esse é um ponto que o CAp deveria trabalhar melhor. A ausência, escrita ou mesmo compartilhada, oralmente, dessas condições, tem gerado problemas crescentes. 2. Não. Fica a critério de cada Conselho decidir, o que pode prejudicar a alguns e a outros não. Até quem pode votar a reprovação do aluno, muda de acordo com o Conselho. 3. O Conselho final delibera de acordo com a subjetividade de cada professor e não por normas.

Ao proceder a análise de conteúdo sintetizadora, constata-se que, segundo os professores, as normas não explicitam as condições necessárias quer à deliberação dos casos de aprovação e reprovação de alunos, quer à avaliação do processo pedagógico. Os entendimentos distribuíram-se em dois polos: em um, entende-se que não cabe às normas determinar todas as condições relativas a cada caso; no outro, que a ausência de diretrizes mínimas para subsidiar a tomada de decisão tem gerado conflitos, posições instáveis do COC e, por vezes, antagônicas, dificultando o tratamento igualitário das situações. O terceiro aspecto, expresso pelo item 21, busca saber se as normas respeitam o contexto e a cultura escolar. A distribuição equilibrada dos professores pelos níveis de julgamento demonstra que os respondentes não têm posição definida em relação a ele. Diante disto, importa ao CAp refletir acerca da necessidade de as normas espelharem a própria cultura e contexto.

O último padrão da categoria, Informação Fidedigna, não foi atendido; os professores declararam que as normas não contêm informações suficientemente precisas para orientar o processo avaliativo na escola (item 23). De modo geral, os comentários enfatizaram a importância de as normas precisarem os pontos centrais da avaliação:

1. É preciso uma redação mais específica no art.16 [condições das normas em relação à aprovação são justas], de modo a evitar que não ocorra isonomia nos critérios adotados para turmas que não possuem o mesmo corpo docente. 2. Acho problemático também a avaliação final ficar no mesmo patamar da média resultante do aproveitamento do aluno ao longo do ano. [...] uma nota no final do ano pode não traduzir o desempenho do aluno no decorrer do ano. 3. As normas ficam presas às questões burocráticas. 4. É preciso discutir como avaliar turmas diferentes. 5. Precisas não, já que há pontos a serem mexidos.. 6.  A precisão é apenas quantitativa.

A análise de conteúdo sintetizadora evidencia que, para serem efetivamente precisas, as normas necessitam de ajustes e exemplificações. Além disto, torna-se notória a necessidade de a avaliação qualitativa ser valorizada no contexto da avaliação escolar.

Sintese do desempenho dos itens no nível atende

O Gráfico 6 mostra o desempenho dos 23 itens frente aos padrões das três categorias.

Gráfico 6 – Desempenho dos itens no nível de julgamento atende
Fonte: ANDRADE (2015).

O Gráfico 6 mostra que, do conjunto dos itens, 13 deles atenderem aos padrões considerados, atingindo ou excedendo o ponto de corte, 22. A categoria utilidade foi a que obteve o mais alto desempenho: nove entre 11 itens atenderam aos padrões a que estavam relacionados. A categoria adequação, com o segundo maior desempenho, três dos sete itens atenderam aos padrões a que se referiam. O mais baixo desempenho  foi o da categoria precisão: apenas um item, em um grupo de cinco, atingiu o ponto de corte.

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

As conclusões do estudo respondem à questão avaliativa: Em que medida as normas de avaliação da aprendizagem escolar, do Colégio de Aplicação da UFRJ, atendem a padrões de utilidade, adequação e precisão?

As normas de avaliação do CAp UFRJ atendem diferentemente às categorias de padrões consideradas: os de utilidade foram atendidos em maior número que os demais, evidenciando que o documento normativo mostra-se útil para a comunidade, pois, em grande parte, supre as suas necessidades de informação quanto a aspectos do processo avaliativo escolar. Em menor grau as normas revelaram-se adequadas, pois “não expressam aquilo que a comunidade considera justo e ético em relação às condições estabelecidas, especialmente, para as decisões que levam à jubilação e reprovação de alunos. ”(ANDRADE, 2015, p. 48). A falta de amplitude das normas para orientar suficientemente todo o processo avaliativo foi outro aspecto responsável pela  fragilização do seu julgamento. O pior desempenho das normas de avaliação ocorreu junto à categoria precisão; as normas não se mostraram consoantes a sua visão geral: “precisão resulta da exatidão das representações, proposições e resultados, em especial aqueles que fundamentam julgamentos acerca da qualidade dos programas [normas] [...].” (JOINT..., 2001, p. 1). Por conseguinte, na categoria, a qualidade das normas mostrou-se vulnerável quando “nem embasam as decisões coletivas tomadas pelo COC, em relação à aprovação, reprovação e processos pedagógicos desenvolvidos nas turmas, nem favorecem decisões que respeitem a cultura e o contexto escolar.” (ANDRADE, 2015, p. 48).

As recomendações do estudo avaliativo são as que se apresentam: (a) promoção de debates, junto aos setores envolvidos, acerca da suficiência das normas de avaliação e de sua estrutura constitutiva (avaliação contínua, provas de segunda chamada, períodos de recuperação paralela e final, aprovação, reprovação e jubilação), privilegiando, inclusive, as competências atribuídas aos Conselhos de Classe; (b) revisão dos setores específicos quanto à propriedade e adequação dos critérios utilizados para fins de avaliação, observados seus tipos (quantitativa e qualitativa), pesos e fórmulas que servem à composição de médias (trimestral, anual e final); (c) apresentação textual das normas de avaliação em consonância ao contexto e à cultura do CAp; (d) acréscimo às normas de todas as informações que se fizerem necessárias, a exemplo daquelas indispensáveis à realização das atividades previstas nos períodos de recuperações paralela e final; inserção das normas de avaliação na página eletrônica da escola, tornando-as públicas para toda a comunidade interna e externa.

REFERÊNCIAS

AIKEN, Lewis R. Tests psicológicos y evaluación. 11 ed. México: Pearson Educación, 2003. 

ANDRADE, Marcos Vinicios Pimentel de. Normas de avaliação do desempenho escolar do Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro: um estudo avaliativo. 59 f. 2015. Dissertação (Mestrado Profissional em Avaliação)-Fundação Cesgranrio, Rio de Janeiro, 2015.

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