A FORMAÇÃO PEDAGÓGICA DOS FORMADORES E O CURRÍCULO DAS LICENCIATURAS PARA A QUALIDADE DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Resumo: Buscamos compreender a formação dos professores formadores, a realidade do currículo e da prática pedagógica incidindo na formação docente para a Educação Básica. O delineamento metodológico contou com pesquisa bibliográfica, documental e entrevistas. Os contextos foram duas Universidades Federais do interior de Minas Gerais. Os resultados evidenciaram que os professores das Licenciaturas são pós graduados,concursados e com dedicação exclusiva. Entretanto, falta formação didática pedagógica. A formação contínua acontece individualmente e em congressos; há dificuldades para o trabalho interdisciplinar; as condições de trabalho dificultam a prática inovadora. Em conclusão, há necessidade de avançar para o alcance de maior qualidade.
Palavras-chave: Formação do formador; formação pedagógica; qualidade da Educação Básica.
Introdução
O presente artigo traz um recorte dos resultados de uma pesquisa intitulada “Formação de Professores, Qualidade de Ensino e Inclusão”, realizada em duas Universidades Federais do interior de Minas Gerais, contando com o apoio de dois bolsistas de iniciação científica, subsidiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).
O projeto guarda-chuva teve como objetivo geral conhecer a realidade das políticas educacionais e as ações implementadas no Sistema Educacional Mineiro, especialmente no interior de Minas, com relação à formação docente, tendo em vista uma educação de melhor qualidade.
O subprojeto de pesquisa, cujos resultados apresentamos aqui, intitula-se “Formação pedagógica dos professores formadores dos licenciandos das Universidades do Triangulo Mineiro” e teve como objetivo compreender qual a situação atual da formação dos professores formadores, com relação à qualidade do corpo docente, do currículo e da prática pedagógica, levantando avanços, as limitações e as perspectivas na formação dos novos professores para atuar na Educação Básica.
Fundamentos teóricos
Sabemos que, após a LDB/9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) e por força de regulamentações do MEC (Ministério da Educação e Cultura) e do CNE (Conselho Nacional de Educação), as orientações e discussões sobre a formação de professores, aliada à sua prática, têm tomado rumos diferentes. Severino (2006) afirma, com relação à LDB, que, apesar dos avanços conceituais trazidos por ela e as políticas oficiais que a implementaram, representa um retrocesso na qualidade de formação dos professores. Assim, faz-se necessário buscar maior compreensão a respeito desse impasse.
Na realidade, mediante o grande desafio, o MEC tem implementado políticas educacionais, buscando alternativas para melhorar a qualidade de ensino. A formação docente tem recebido diferentes denominações: formação continuada, formação em serviço, qualificação profissional.
Por conseguinte, o tema da qualidade de ensino já se fazia presente na antiguidade grega, constituindo-se como uma das preocupações daquela civilização. No período áureo da filosofia iluminista, na nascente modernidade, o pensador Locke, no século XVIII, chegou a classificar a qualidade, evidenciando as diferenças que ela é capaz de comportar. Nesse sentido, a história nos mostra que a qualidade não é um tema inscrito na contemporaneidade; ele vem acompanhando a trajetória da Humanidade e assumindo diversos formatos e significados, nas diversas formações sociais que o Mundo conhece.
E a escola de Educação Básica, no Brasil, tem qualidade? Silva e Vizim (2001, p.30) denunciam que, em “São Paulo, o Estado mais rico do país, a maioria dos jovens de 18 a 24 anos (56,2%) está fora da escola, sendo que destes, 44,3% não completaram o ensino fundamental.”
Mais recentemente, os resultados da pesquisa realizada pelo SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica), em 2003, apontam que a qualidade da educação pública apresenta índices ainda bastante insatisfatórios. A pesquisa constatou, por exemplo, que, em média, “os alunos de 4ª série se atrapalham ao interpretar textos longos ou com informação científica e não conseguem ler horas em relógios de ponteiros. Também não conseguem fazer operações de multiplicação com números de dois algarismos". (SANDER, 2006, s.p).
Outro problema ligado à qualidade de ensino é a evasão escolar. O censo de 2010 aponta que a imagem da educação pública continua sendo a de um funil: o sistema escolar brasileiro tem quase o dobro de alunos nos anos iniciais do Ensino Fundamental em comparação com as matrículas no Ensino Médio. Os dados revelam que o país registrava 13,4 milhões de matrículas nos anos iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano; com crianças a partir dos 6 anos) e 7,1 milhões de matrículas no Ensino Médio (1º ao 3º ano). (GOMES, 2010).
Destarte, os dados estatísticos, resultados das pesquisas, mostram que a escola não tem conseguido cumprir integralmente a sua função social. E, lamentavelmente, aqueles que fracassam na escola são aqueles que justamente mais precisam dela. São os filhos das classes desprovidas de riquezas que teriam nesta oportunidade de ascender socialmente e, mais importante que isso, recordando Paulo Freire (1996), de aprender a “ler o mundo” de forma crítica, e tornando-se sujeito com autonomia para construir e transformar a própria história.
Como consequência, há o fato de que a escola de pouca qualidade acaba reproduzindo a exclusão social, criando vítimas do sistema capitalista excludente.
A Constituição Federal de 1988 (art.206, inciso I) institui como um dos princípios do ensino a igualdade de condições de acesso e permanência na escola. Além do mais, destaca a democracia, na qual se estabelece a base para se viabilizar a igualdade de oportunidades, dando lugar à expressão das diferenças e dos conflitos e, desse modo, da convivência com a pluralidade.
Mas, qual é a função social da escola? Segundo Rios (2003, p. 91), é tarefa da escola de qualidade, "[...] desenvolver capacidades, habilidades e isso se realiza pela socialização dos conhecimentos, dos múltiplos saberes”. Por isso, os conteúdos transmitidos, construídos ou socializados na escola têm de ter sentido e estar comprometido com o desenvolvimento humano. A democratização da sociedade brasileira e, especificamente, a da educação, dar-se-á não apenas pela garantia de acesso à escola, mas também pela permanência e pelo sucesso do educando.
Na construção do Projeto Pedagógico da Escola, acontece o processo amplo de discussão, trocas e interações, que também fazem parte do Currículo da escola. Tal processo também resulta em aprendizado e, portanto, em desenvolvimento de conceitos e de práticas.
Por isso, inquestionavelmente, a formação dos professores deve merecer atenção especial, pois, para ensinar a todos com qualidade, é imprescindível que se esteja aberto a aprender e a inovar sempre. Desse modo, o investimento na formação permanente dos professores é fundamental para o processo de inclusão.
Procedimentos Metodológicos
As duas Universidades Federais envolvidas na pesquisa estão localizadas no interior de Minas Gerais e fazem parte do processo de expansão universitária, tendo criado a partir de 2006 e 2007 vários cursos de licenciatura.
Por meio das entrevistas, ouvindo os sujeitos envolvidos na formação docente, procuramos identificar os discursos e as práticas relacionados à valorização do pessoal do magistério da Educação Básica e Superior. Buscamos, dessa forma, compreender quais mudanças ocorreram na busca de aperfeiçoamento da formação inicial dos docentes e o que ainda é necessário buscar/aperfeiçoar para o alcance do ideário de educação de qualidade para todos.
A metodologia da pesquisa é de cunho qualitativo, dentro de uma vertente crítica.
Inicialmente foi realizada uma revisão bibliográfica enfocando a formação de professores, a qualidade de ensino. Em seguida, o foco foi a análise dos documentos – especialmente, os projetos pedagógicos dos cursos de licenciaturas.
Por conseguinte, realizamos entrevistas, utilizando o roteiro semiestruturado. Selecionamos, por amostragem, trinta e duas pessoas. Os informantes, quatorze professores da Educação Superior atuantes nos cursos de Licenciatura de duas Universidades Federais do interior de Minas Gerais; dezoito alunos das Licenciaturas. Dentre os professores estavam também os gestores dos Cursos. Para a seleção, em reunião, foram esclarecidos os objetivos da pesquisa e demos oportunidade para as pessoas livres e interessadas em contribuir com a investigação, se manifestarem.
Análises dos dados empíricos: os cursos de formação de professores na Universidade Pública
Por meio das entrevistas, ouvindo os sujeitos envolvidos na formação docente, procuramos identificar os discursos e as práticas relacionados à formação iniciação e continuada dos professores. Buscamos, dessa forma, compreender como está a formação dos formadores e qual é a formação oferecida aos futuros docentes da Educação Básica, quais mudanças ocorreram na busca de aperfeiçoamento da formação inicial dos docentes e o que ainda é necessário buscar/aperfeiçoar para o alcance do ideário de educação de qualidade para todos. segundo as políticas atuais.
O roteiro semiestruturado que orientava as entrevistas, trazia as questões, com os objetivos abaixo: identificar a formação dos formadores bem como a formação didático-pedagógica dos mesmos e a oferecida nos currículos da formação inicial; se os professores formadores buscam atualização e como acontece a formação continuada; se o currículo do seu curso oferece formação ampla, multidisciplinar e interdisciplinar, se os alunos recebem formação e se sentem preparados para trabalhar com a diversidade presente nas escolas públicas.
Nas entrevistas, selecionamos alguns depoimentos para ilustrar a questão: “ os professores do curso de licenciatura são bem preparados? Têm boa Didática?”:
-Sim, são bem preparados. A maioria tem mestrado e doutorado e fez concurso público. Variam bem as estratégias de ensino e apresentam domínio do conteúdo, salvo exceções. (Disc.A. 1)
-Nem todos. Há professores que mesmo sendo doutores, são muito tradicionais no processo de avaliação. São muito rigorosos e reprovam a maioria. (Disc.A. 7)
-Alguns sabem o conteúdo, mas não sabem como passar. Não tem didática. Tem dificuldade na comunicação. (Disc.A. 2).
-Tem professor que manda os alunos apresentar seminários o tempo todo e não dão aula e pouco interferem para tirar dúvidas...(Disc. A.3).
Os depoimentos dos alunos evidenciaram que alguns acreditam que todos os professores são bons, exaltando a formação de mestres e doutores. Contudo, percebem também limitações. As limitações da formação vão desde a fragilidade no domínio de conteúdos até a formação pedagógica, especialmente na forma tradicional e rigorosa de avaliar. A avaliação somativa e quantitativa conduz a um elevado número de reprovações.
Em seguida, selecionamos os seguintes depoimentos na questão “Os professores das licenciaturas buscam formação continuada? Como e onde?”
-Sim, vão a congressos nacionais e até internacionais. Publicam artigos e estão sempre buscando novos conhecimentos. (Disc.A. 3)
-Sim, os professores são bons, são pesquisadores e há vários alunos fazendo iniciação científica com eles, em grupos de pesquisa. (Disc.A.2)
-Pelo que sei, na Instituição não tem cursos de formação continuada para os professores. Cada um procura a formação que necessita, individualmente. (Disc.A.3).
Os depoimentos revelaram que os professores buscam, por meio de pesquisas e congressos, a atualização permanente. O destaque importante é para a existência de grupos de pesquisa e a oportunidade de os alunos participarem da iniciação científica. Contudo, ficou claro também que, nas Instituições, não existe um projeto sistematizado de formação dos formadores, voltado para atender às necessidades do contexto de cada curso. Cremos que isso seria fundamental para o crescimento coletivo do grupo de professores e para favorecer o trabalho coletivo e interdisciplinar.
O professor que atua na Universidade tem de atender a muitos outros projetos, tais como pesquisa e publicações, extensão, coordenações, reuniões, representações, comissões, etc. São tantas as cobranças que a atualização, o planejamento para o exercício da docência, que seria a função principal, acaba ficando em último plano.
Dando continuidade à investigação, fizemos o seguinte questionamento aos alunos e professores dos cursos de Licenciaturas: “O Currículo do seu curso oferece formação ampla, multidisciplinar e interdisciplinar?”
-Creio que mais formação multidisciplinar. É muito rico. Mas, a interdisciplinaridade penso que fica a desejar. (Disc.A. 6)
-Acho que o currículo forma mais o professor pesquisador do que o professor para a sala de aula. Acho que na hora da prática, em sala de aula, vamos ter dificuldades. (Disc.B. 1)
-Falta formação pedagógica nos cursos. Ex.: Psicologia da educação. Mais didática, com aulas prática, também seria bom. (Disc.B. 5)
-Ainda são disciplinas, mudou só o nome. Não há interdisciplinaridade. (Prof. 1).
Quanto ao currículo, os depoentes demonstraram que há diversificadas disciplinas que oferecem conteúdo denso e importante para a formação docente. Os mais críticos observam que existe um esforço para o trabalho multidisciplinar; contudo, o trabalho interdisciplinar fica falho. Aparece também preocupação do currículo com muita teoria e pouca prática. Sugerem que falta ensinar como revolver os problemas da sala de aula, lidar com os alunos, dentre outros. Nesse sentido, apontam a formação pedagógica deficiente e a falta de uma disciplina de Psicologia da Educação para entenderem o desenvolvimento das crianças e adolescentes, como aprendem e como lidar com eles em cada faixa-etária. Citam ainda a questões como a relação professor aluno, e os limitas da formação para ligar com as síndromes e dificuldades de aprendizagem, etc.
Contudo, nos Projetos Pedagógicos dos cursos afirma-se que
[...] A implantação concomitante de tais licenciaturas permitirá uma organização curricular que conte com um núcleo de integração especificamente voltado para o desenvolvimento de um trabalho interdisciplinar (exigência da contemporaneidade) e para a ampliação cultural do professor. (PPP História, 2009. P.13).
Mediante os relatos apresentados, verificamos que para o trabalho interdisciplinar, precisa-se muito mais do que o registro dessa intenção no PPP do Curso. Exige-se dos profissionais docentes muito estudo, diálogo, mudança de concepção educacional, trabalho coletivo e cooperativo, abertura para o novo, enfim, a revisão dos conceitos, de como se ensina e como se aprende.
Por conseguinte, perguntamos aos discentes: “Sente-se preparado para trabalhar com a diversidade de alunos presentes nas escolas? Pode trabalhar com a diversidade e ensinar a todos os alunos?”
-Apesar de ter LIBRAS acho que ainda não me sinto preparado para trabalhar com alunos com deficiência. Como agir com o cego e deficiente mental? As salas são lotadas e não há apoio nenhum. (Disc.B. 3)
-Não estou preparado. Prova disso é que no nosso curso há alunos com deficiências e nem nossos professores sabem lidar com eles. Uns são mais tolerantes e outros menos... (Disc.A.8).
-Um pouco. A inclusão de pessoas com deficiência penso que mais do que o esforço do professor, há necessidade de apoio na escola. (Disc. B4)
-Só na Universidade não é possível se preparar para atender alunos com deficiência. É preciso buscar outros cursos de formação continuada. (Disc. A.2)
-Nem nossos professores da Universidade estão preparados para isso. Como eles vão nos preparar? Nós temos um colega cego, que sofre as consequências... (Disc.A.5)
As vozes dos alunos revelam que recebem formação para o atendimento ao surdo, por meio do curso de Libras; o que é positivo. Entretanto, falta formação para compreender outras deficiências e dificuldades no processo de ensino-aprendizagem. Afirmam que não saberiam lidar com os deficientes mentais, com alunos com diagnósticos de síndromes ou distúrbios de comportamento.
Porém, alguns alunos acreditam estar preparados para atender a diversidade, com o apoio da escola. Entretanto, a maioria afirma que se sente despreparada para trabalhar com pessoas com deficiências, que exigem atendimento diferenciado. Outros depoentes reconheceram que nem os professores formadores têm esse preparo para atender às pessoas com deficiência. Assim, os cursos de licenciatura, nas Instituições investigadas, não estão conseguindo formar, com qualidade, profissionais aptos a trabalhar com todos os alunos matriculados na escola, independente de suas condições físicas, sociais ou emocionais.
Mas, com a diversidade presente nas escolas, não podemos ficar indiferentes às diferenças. Mantoan (2003) disse que a escola inclusiva é aquela que possui docentes que conseguem sucesso ao ensinar a turma toda, cuja característica principal é a heterogeneidade, a qual exige muito conhecimento teórico e prático para se garantir a efetivação do binômio ensino/aprendizagem.
Destarte, das questões apresentadas para os alunos, concernentes à qualidade dos professores e das aulas nos seus respectivos cursos, sintetizamo-las na tabela abaixo:
-Os professores formadores têm didática para ensinar?
- Você se sente preparado para atender à diversidade de alunos da escola pública e realizar uma educação inclusiva?
- Os professores formadores participam de formação continuada?
- Os professores formadores trabalham numa perspectiva interdisciplinar?
N. entrevistados 32 |
% SIM |
% NÃO |
Didática |
28 |
72 |
Diversidade e Educação Inclusiva |
33 |
67 |
Formação contínua |
33 |
67 |
Interdisciplinaridade |
33 |
67 |
Vimos que 72% dos entrevistados denunciaram as limitações na formação do formador quanto ao aspecto da Didática, relativo à utilização das estratégias de ensino, ao relacionamento professor/aluno e, principalmente, à forma de avaliação adotada.
Quanto ao trabalho pedagógico dentro da perspectiva interdisciplinar, em torno de 67% dos entrevistados afirmaram que não existe, ainda, trabalho interdisciplinar, ou seja, trabalha-se com disciplinas isoladas.
Com referência à formação continuada, aproximadamente, 67% afirmaram que os professores procuram se aperfeiçoar, por meio de participação em congressos, seminários etc. Entretanto, afirmaram também que, em ambas as Instituições, não existe um projeto de formação contínua, que garanta a formação permanente dos professores e atenda às necessidades locais. Além disso, acontecem poucas reuniões de estudo e planejamento na Instituição. Diante disso, os professores procuram atualização, participando de congressos e apresentando os resultados de suas pesquisas no Brasil e no exterior.
No aspecto de sentir-se preparado para atender à diversidade e à inclusão, 67% dos depoimentos explicitaram que não se sentem preparados para atender a alunos com diferentes necessidades. Afirmaram, ainda, que o curso oferece um breve curso de Libras, que não os prepara suficientemente nem para atender aos alunos surdos, e não há formação para o atendimento das outras necessidades físicas e/ou psicológicas; e nem para os distúrbios de comportamento, linguagem, dentre outros. Entretanto, significativo número de informantes ainda acredita que o Curso de Licenciatura cursado é de qualidade, pois há muita exigência e cobrança dos professores.
Por conseguinte, continuamos a investigação, com a questão: As políticas para a formação docente com maior qualidade têm se efetivado? Em que medida?
-Não totalmente. Falta valorização do profissional docente. (Disc.A. 1)
-Penso que falta maior investimento nesse aspecto. Há mais discurso do que prática referente à formação dos professores. (Disc. B.7).
-Penso que muita coisa tem sido feita, mas ainda não é suficiente para resolver todos os problemas. (Disc. B6).
- Professores ganham pouco, são muito cobrados, excesso de trabalho, pouco apoio... além da formação tem muita coisa a ser vista...(Disc.08)
Alguns alunos acreditam que as políticas de formação de professores têm sido eficientes. Notam, entretanto, que há mais discursos políticos do que ações práticas para a garantia de uma formação de qualidade, que deveria incidir na melhoria da qualidade de ensino.
Diante do exposto, é evidente que os Currículos da formação inicial de professores, bem como da formação continuada, devem ser repensados. Para nos orientar nesse propósito o Ministério da Educação publicou a Resolução Nº 2, de 1º de julho de 2015, a qual “define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de segunda licenciatura) e para a formação continuada”. Esta resolução explicita a preocupação com a formação, pois, no Art. 1º foram instituídas as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada em Nível Superior de Profissionais do Magistério para a Educação Básica, definindo princípios, fundamentos, dinâmica formativa e procedimentos a serem observados nas políticas, na gestão e nos programas e cursos de formação.
A Resolução traz, ainda, no parágrafo primeiro do Artigo 13, que os cursos de licenciatura devem ter, "[...] no mínimo, 3.200 (três mil e duzentas) horas de efetivo trabalho acadêmico, em cursos com duração de, no mínimo, 8 (oito) semestres ou 4 (quatro) anos, todos os currículos das licenciaturas devem revisar os seus currículos, adequando-os com o mínimo de 3.200 horas aulas". (p.11).
Essa orientação legal explicita a exigências dos cursos de Licenciatura que formam professores para a Educação Básica, em suas diferentes áreas e especificidades, adequarem seus currículos e carga horária com o propósito de garantir sólida formação aos licenciados.
A necessidade de busca de inovação e aperfeiçoamento do Currículo de formação docente é uma realidade e agora tornou-se uma exigência para atender a Resolução Nº 2, de 1º de julho de 2015, apresentada acima e, ainda mais, para cumprir as metas do PNE/2014.
Mediante tal contexto, destacamos que o novo Plano Nacional de Educação PNE - 2014-2024 - (Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014) traz entre suas diretrizes no Art.2º, no ítem IV - a garantia da "melhoria da qualidade da educação" e no ítem IX, a garantia de "valorização dos (das) profissionais da educação".
Ademais, destacamos a Meta 13, na estratégia 13.4 garante
[...] promover a melhoria da qualidade dos cursos de pedagogia e licenciaturas, por meio da aplicação de instrumento próprio de avaliação aprovado pela Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior - CONAES - integrando-os às demandas e necessidades das redes de Educação Básica, de modo a permitir aos graduandos a aquisição das qualificações necessárias a conduzir o processo pedagógico de seus futuros alunos (as).
Formar professores bem formados é uma exigência para se alcançar uma educação pública de qualidade e acessível a toda população brasileira. E, como disse Saviani (2014, p.104) o foco da melhoria da educação pública está na defesa de que "[...] a qualidade será assegurada pela instituição de um sólido Sistema Nacional de Educação operado segundo metas claras definidas no Plano Nacional de Educação, que também deverá garantir os meios pelos quais as referidas metas serão atingidas."
Ademais, subsidiados pelas ideias de Saviani (2014) defendemos a premissa de que não bastam as políticas e legislações, - que também são imprescindíveis - mas, além disso, é preciso oferecer meios como recursos, apoios e condições para que elas se concretizem, de fato.
A educação de boa qualidade é uma prática exercida por profissionais educadores, comprometidos com o desenvolvimento, sob todas as formas, da classe oprimida. Sem dúvida, a educação escolar de boa qualidade deve colaborar com a emancipação do indivíduo enquanto cidadão partícipe de uma sociedade democrática e proporcionar-lhe recursos para viver bem, usufruindo dos bens sociais e culturais que, lamentavelmente, hoje são privilégio de poucos.
Conclusões
Entre os alunos dos cursos de licenciaturas das duas Universidades localizadas no interior de Minas Gerais, dentre os futuros professores, a maioria destaca a vantagem de estar cursando uma Universidade Pública e, sobretudo, a importância de ter professores com boa formação – mestres, doutores e pesquisadores –, mas percebem também as limitações destes na formação didática. Analisa-se as contradições do currículo dos cursos quanto à repetição de conteúdos, fragmentação, avaliação somativa, falta de integração entre os conteúdos, carência de formação pedagógica e pouca formação para o trabalho com a diversidade da escola pública e, especialmente, os alunos com deficiência. Alunos e professores afirmam que não há projeto institucional de formação contínua e planejamento coletivo dos formadores, na Instituição; o que dificulta o trabalho interdisciplinar e a qualidade de ensino. Assim, não há cultura para se encontrar tempo para se reunir, planejar e estudar juntos. A atualização dos formadores acontece na participação em congressos, muitas vezes isolados.
A formação pedagógica dos cursos necessita aperfeiçoamento e redimensionamento, pois há carência de conteúdos como didática e psicologia da aprendizagem e educação. Os licenciandos e os professores sentem-se despreparados para a inclusão, ou seja, encontram-se inseguros em como atender a toda diversidade de alunos presentes no sistema educacional dito democrático, portanto, aberto a todos. O conteúdo e discurso dos projetos políticos pedagógicos dos cursos são muito mais avançados do que aquilo que acontece, realmente, na prática cotidiana da sala de aula. Além disso, as condições de trabalho não colaboram com a viabilização de uma prática mais inovadora. Vale alertar que professores com formação precária e más condições de trabalho acabam por reproduzir tais condições, criando-se um círculo vicioso. Assim, a formação docente na Universidade Pública necessita de planejamento e maiores investimentos para a garantia, de fato, de professores e de educação de qualidade.
Os professores formadores confirmam que, ainda, não trabalham de forma interdisciplinar e que há limitações na formação continuada. Percebem limitações no currículo e reclamam das condições de trabalho. Na voz dos professores os problemas estão presentes na formação inicial e a formação contínua tem sido insuficiente para atender às necessidades e aos desafios que enfrentam na sala de aula. Tais problemas envolvem questões sociais, familiares, de saúde e políticas; exigem uma soma de esforços para serem superados.
As condições inadequadas para o trabalho docente, o excesso de trabalho e a desvalorização profissional são explicitadas tanto na Educação Básica como na Educação Superior. Assim, forma-se um círculo vicioso: alunos com formação básica insuficiente formam-se professores com limitações nos saberes e habilidades que, consequentemente, formarão outros alunos com limitações na qualidade do ensino. Portanto, obviamente, a formação dos professores da Educação Superior incide radicalmente na formação inicial dos professores da Educação Básica.
Acreditamos que muito investimento tem sido feito na formação docente inicial e continuada. Mas, não o suficiente para garantir a melhoria da qualidade do ensino na escola pública e nem melhores condições de trabalho dos profissionais da área. Para que a educação brasileira seja mesmo democrática e inclusiva, precisamos de que as políticas educacionais ultrapassem os discursos e invistam, de fato, na concretização de uma Universidade Pública de boa qualidade, para todos e todas. Desse modo, a re-organização curricular dentro da Legislação atual deve ser um caminho promissor para melhorar a qualidade da formação do profissional docente.
A visão crítica sobre essa realidade e a união dos profissionais docentes com ações coletivas e interventivas, poderá mudar o quadro atual da formação nos cursos de Licenciatura da Universidade Pública. E, só assim, teremos professores bem formados e que poderão contribuir com a construção de uma sociedade com maior inclusão social.
Por fim, percebemos que os investimentos em pesquisa, estudos, políticas educacionais viáveis, investimento sério nos salários, na formação, nas ações, na conscientização da sociedade, dentre outros, representam trabalho a ser realizado em longo prazo, conjuntamente, na busca de atenuar a precariedade em que se encontra a formação de professores para a Educação Básica, nos dias atuais.
Referências
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