A EDUCAÇÃO BÁSICA NA AGENDA DO PLANEJAMENTO EDUCACIONAL: UMA ANÁLISE DO SEU CONTEXTO DE INFLUÊNCIA
Resumo: O estudo discute o planejamento da política educacional a partir da abordagem do Ciclo de Políticas. O objetivo é analisar o contexto de influência da educação básica como indutora do desenvolvimento na agenda do planejamento educacional para o próximo decênio. A partir das análises dos documentos do planejamento estratégico do governo e dos interlocutores da sociedade o estudo aponta a inexistência de um contexto de influência genuinamente nacional, o que parece estar ocorrendo é o estabelecimento de parâmetros nacionais para se pensar o planejamento estratégico da educação no país. Contudo, a forma como isso ocorre pode reduzir, senão eliminar as especificidades dos estados e municípios.
Palavras-chave: planejamento educacional; educação básica; Ciclo de politicas
INTRODUÇÃO
O estudo em andamento parte do entendimento de que o princípio constitucional do direito à educação não significa necessariamente a sua efetivação. Com isso, o planejamento educacional é o instrumento mais valorizado para garanti-lo. A educação como um setor de planejamento das políticas públicas, no Brasil, esteve presente de forma clara no Manifesto dos Pioneiros de 1932 e na Constituição Federal (CF) de 1934.
Todavia, no Brasil, a prática institucionalizada de planejamento público, com foco em resultados, ainda não se converteu em um processo indispensável para a gestão de ferramentas que proporcionam coerência e racionalidade técnica aos processos decisórios e de êxito das políticas empreendidas pelo Estado. (MELO, 2013). Apesar disso, a educação básica, no Plano Nacional de Educação- (PNE) 2014-2024 Lei nº 13.005, de 25 junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras providências., recebeu status de indutora do desenvolvimento nacional, merecendo, dessa maneira, um planejamento adequado. Consequentemente, a relação entre a educação com padrões de qualidade e o desenvolvimento nacional requer do Estado instrumentos para garantir a sua materialização e a sua efetivação.
Considerando a fidelidade dos fatos históricos apontados por Baia Horta (1932), Fonseca (2009) Saviani (2007) Vieira (2007), Fazenda (1989) Azevedo (2014) desde o ano de 1934, quando se introduziu o conceito de PNE, o maior número de planos elaborados e aprovados até hoje, permaneceu letra morta. Não ultrapassaram o limiteda intenção e tornaram politicas ignoradas pelos dirigentes políticos e sem pressão da sociedade civil para os cumprimentos de suas metas.
Como adverte Horta (1982) o sentimento nacionalista não é o insumo suficiente para materializar a agenda de um desenvolvimento planejado. Torna-se indispensável uma solida base política e administrativa aliada a uma estrutura técnica. Nesse sentido, as pesquisas de Ball (2009, 2011) revelam que o processo de elaboração, de implantação e de implementação de uma política pública sofre influências de atores sociais que expressam interesses distintos e, às vezes, contraditórios.
Desse processo, denominado pelo pesquisador de ciclo de políticas, decorre a necessidade de acordos e ajustes nos contextos de influências, de produção e da prática. As políticas públicas são iniciadas e os discursos são construídos no contexto de influência. No contexto de produção de texto, os textos, legais e oficiais, pronunciamentos, comentários, são elaborados diante dos acordos e ajustes definidos na dimensão anterior. No contexto da prática, a terceira dimensão proposta por Ball, ocorre quando os documentos chegam às instituições de ensino.
O Ciclo de Políticas tem sido utilizado também no Brasil como referencial analítico para contribuir com as análises de programas e de políticas públicas. Ao se referir ao ciclo proposto por Ball, Mainardes (2006) ressalta que seu referencial analítico permite análise desde a formulação inicial até a concretização de uma política em cada nível de abrangência.
Com isso, contribui para a compreensão das múltiplas determinações da política educacional, e permite realizar análises de forma articulada entre os níveis de sua abrangência.
No que diz respeito ao objeto de investigação deste estudo, compreendo que o contexto de influência nacional exerceu forças para a educação básica emergir como indutora do desenvolvimento nacional na agenda dos principais instrumentos de planejamento governamental para a educação; o PNE 2014-2024 e a dimensão Pátria Educadora O documento, versão preliminar, Pátria Educadora: A Qualificação do ensino básico como obra de construção nacional. (Brasília, 22 de abril de 2015) apresenta diretrizes de um projeto nacional de qualificação do ensino básico. A partir de fevereiro de 2015, sob a orientação do ministro Roberto Mangabeira Unger, e a pedido da Presidenta, a Secretaria de Assuntos Estratégico (SAE), concentrou seus esforços no projeto Pátria Educadora, de melhoria do ensino público no país. Entretanto a SAE foi extinta em 02/10/2015, como parte da reforma ministerial e administrativa destinada a reduzir gastos da administração pública federal. do Plano Plurianual- PPA 2016-2019: Desenvolvimento, Produtividade e Inclusão Social Lei nº 13.249, de 13 de janeiro de 2016. Institui o Plano Plurianual da União para o período de 2016 a 2019. . Nessa direção, a tese que orienta este estudo é de que há razões para a educação básica, ter recebido status de indutora do desenvolvimento na agenda da atual PNE. A partir de então, intenciono contribuir com a reflexão sobre o contexto nacional que influenciou a agenda da educação básica no planejamento educacional para o próximo decênio.
DESENVOLVIMENTO
Neste trabalho tomo o quadro teórico do planejamento educacional trabalhado por Baia Horta (1983). Para esse autor, o planejamento educacional é uma forma específica de intervenção do Estado em educação. Ele inclui que essa intervenção, historicamente condicionada, se relaciona a outra que tem como finalidade levar o sistema educacional a cumprir o que lhe é atribuído pelo mesmo Estado; a legislação.
A forma de Estado Intervencionista pode ser identificada por três características principais. São elas: a acentuada intervenção na economia, o fortalecimento da tecnocracia e o reconhecimento dos “direitos sociais” para todos os “indivíduos-cidadãos”, podendo implicar em detrimento dos seus direitos civis e políticos. Baia Horta (1983, p. 207).
Isto significa, para o mesmo autor, que o planejamento, enquanto forma de intervenção do Estado, deve ser visto como um processo mais amplo, que também incorpora o elemento social.
Considerando a natureza complexa da política educacional, o planejamento educacional implica assumir compromisso em defesa de princípios para eliminar desigualdades sociais históricas. Sobre essa questão Kkuenzer, Calazans, Garcia (1990, p.13) convergem para a ideia de que “o planejamento num sistema capitalista não é mais a forma de racionalização da reprodução ampliada do capital; fica, portanto, claro que não é o planejamento que planeja o capitalismo, mas o capitalismo que planeja o planejamento”. Assim, uma análise dos movimentos do planejamento de uma política educacional não pode se esquivar do contexto da política global de um país e daqueles que a definem. Como consequência, a definição de seus fins é um problema político do qual se inserem as relações de disputa entre lideranças pelo protagonismo na definição da agenda educacional.
No cenário democrático de década de 1980, os discursos, os debates e as disputas em defesa de uma nova Constituição Federal ganham vigor. Estava colocada a possibilidade de prescrição de conquistas democráticas, descentralização do Estado, procedimentos participativos e transparentes. Nesse contexto a educação recebe influência. Por certo, a Constituição da República federativa do Brasil, 1988 (CF), também permitiu normas sólidas para a instrumentalizar o direito à educação. Dentre essas a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/1996 (LDB) e a Década da Educação 1997-2007 LDB nº 9394/1996. Art.87. É instituída a Década da Educação, a iniciar-se um ano a partir da publicação desta Lei.. Embora estivesse prevista a construção de um Plano Nacional de Educação, na CF (1988), e a determinação legal da LDB (1996), somente doze anos após a promulgação da Constituição e cinco anos após a previsão da Lei nº 9394/1996, foi aprovada a Lei n° 10.172, de 9 de janeiro de 2001 Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. e o PNE passou a vigorar entre os anos 2000 e 2010.
Para Araújo Filho (2014) as avaliações do referido Plano, indicam dois motivos para sua falha: a ausência dos planos estaduais, distrital e municipais de educação; e a falta de recursos, com veto na meta de ampliação e aplicação dos recursos para até 7% do PIB. Não obstante às suas limitações, a análises de Azevedo (2014) permitem reconhecer que o PNE 2000-2010 apresentou contribuições relevantes para a organização da educação, ao sistematizar um conjunto de diretrizes, metas e estratégias para todos os níveis e modalidades de ensino.
Apesar disso, prossegue a mesma autora, durante a sua vigência, houve mudanças na conjuntura política do país, com a ascensão de uma nova coligação ao Governo Federal (2003-2007). A nova coligação estabeleceu marcos significativos para as políticas sociais e privilegiou a inclusão social e a democratização. Entre as iniciativas implantadas após 2003 pode ser citado o crescimento do acesso à educação básica, em decorrência da Emenda Constitucional nº 59, de 11 de novembro de 2009.
Esse documento representa um avanço em termos de garantia ao direito e à oferta da escolarização obrigatória da população de 4 a 17 anos. Reconhece a meta de ampliação e aplicação dos recursos de 10% do PIB. Também, muda a condição do PNE, que passou para uma exigência constitucional com periodicidade decenal, dentro de um sistema nacional de ensino. Portanto, é no cenário de novas orientações de políticas sociais, mais uma vez com marcas progressistas e conservadoras, que o direito constitucional à educação foi concebido na agenda do PNE 2014-2024. (CURY.2011). Em razão disso, o período entre 2009 e 2014 marca o contexto de influência deste estudo.
Sob o esse ponto de análise especulo que os projetos desenvolvidos pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), e do Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (NAE A Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República foi criada em 2007, inicialmente chamada Secretaria de Ações de Longo Prazo, com o desafio de construir um projeto de Estado. Para desempenhar esta tarefa, a SAE conta com o apoio do IPEA, e do NAE. Cadernos NAE: n. 1, julho 2004, (p. 5).), podem apresentar as primeiras justificativa para questões norteadoras do estudo. Por que a Educação recebeu a prioridade das prioridades na política do Estado para o próximo decênio?
O NAE coordenado pela Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica, tem a missão de construir o planejamento estratégico nacional de longo prazo. Esse planejamento dever responder às seguintes indagações: “Qual deve ser o percurso do País para assegurar um futuro de prosperidade? Como identificar, hoje, as oportunidades estratégicas que, no longo prazo, maduras, transformarão a realidade brasileira e realizarão as expectativas da sociedade? Que riscos e alternativas o futuro nos reserva? ” (NAE, BRASIL 2004, p. 5).
Debruçado sobre estas questões, o NAE desenvolveu, o Projeto Brasil 3 Tempos: 2007, 2015 e 2022. Seus elaboradores reconhecem que a indução do desenvolvimento por meio da implementação de algum tipo de planejamento não é recente. Essa atividade teve sua origem no governo Dutra, passou pelo plano de metas de Juscelino Kubitschek (1956-1961). Em seguida pelos planos nacionais de desenvolvimento (PNDs) dos governos militares, pelo Programa Avança Brasil do Presidente Fernando Henrique Cardoso e chegou ao Plano Brasil de Todos do Presidente Lula.
Assim, o Projeto Brasil 3 Tempo, segundo seus elaboradores, estabelece as bases de um trabalho conjunto do Estado e da sociedade, visando um processo de cooperação para um projeto de nação. Além disso, busca metas para um cenário a médio e longo prazo para uma “sociedade satisfatoriamente desenvolvida, plenamente democrática, mais igualitária, portadora de valores inclusivos de cidadania, inserida de maneira soberana na economia mundial e participante dos processos decisórios internacionais” (p. 5).
Para que isso ocorra, prosseguem os elaboradores, os objetivos nacionais estratégicos devem ser implementados em três marcos temporais. Sendo o primeiro, o ano de 2007 marcado com o início de um novo governo, o segundo o ano de 2015, data em que o Brasil deverá ter cumprido as Metas do Milênio estabelecidas pela ONU As metas do milênio foram estabelecidas pela ONU, em 2000, com apoio de 191 países. São elas 1- acabar com a fome e a miséria; 2- oferecer educação básica de qualidade para todos;3- promover a igualdade entre sexos e a autonomia das mulheres; 4- reduzir a mortalidade infantil; 5- melhorar a saúde das gestantes; 5- combater a Aids, a malária e outras doenças; 7- garantir qualidade de vida e respeito ao meio ambiente; 8 estabelecer parcerias para o desenvolvimento. (Grifo nosso) e outros desafios que a própria nação estabelecer. Finalmente, o terceiro marco definido foi o ano 2022, espera-se que a nação brasileira possa comemorar 200 anos de independência num contexto de máximo bem-estar social e desenvolvimento econômico possíveis.
Esses marcos temporais, por atravessar vários períodos de mandato eletivo, caracterizam um projeto de nação, transcendendo a uma visão de governo. O desafio do Estado, segundo os pesquisadores do NAE, será, “simultaneamente, regular o processo de desenvolvimento que apresenta lógica de mercado e atuar diretamente sobre o processo de desenvolvimento do Brasil que se encontra à margem do desenvolvimento”. (p.9)
Posteriormente, o NAE apresenta o documento Agenda para o Futuro do Brasil (2007). Esse reúne, de forma sintética, o conjunto de 300 encontros para debate dos temas estratégicos do Projeto Brasil 3 Tempos. Os encontros contaram com a participação de mais de 600 pesquisadores e de quase 20 instituições de pesquisa nacionais e internacionais. De acordo com as análises, as reflexões apontaram para “o novo modelo de desenvolvimento social, que deverá ser lastreado no conhecimento e que conformará uma nova sociedade neste Século XXI”. (NAE, BRASIL,2007, p. 6).
Neste mesmo estreito, para os técnicos NAE, o perfil do trabalhador deverá incorporar o aprendizado continuado, com características e amplitude holísticas. O conhecimento de um saber aplicado para o saber criado; de uma tarefa padronizada para a tarefa específica; de uma rotina repetitiva para a criação diferenciada. A partir desses dados, a Educação não só foi sugerida como a base de sustentação da sociedade de conhecimento, mas também modelo de disseminação democrático do acesso ao conhecimento. Essas características contribuirão para construir novas formas de organização social, com destaque para a gestão política e a econômica. (NAE, BRASIL,2007).
O documento Agenda para o Futuro do Brasil (2007) defende o modelo de desenvolvimento estratégico, de longo prazo, com três eixos estruturantes: a concepção social, a concepção política e a concepção econômica. A concepção social deseja contribuir para a criação da sociedade do conhecimento, uma nação mais igualitária dentro do novo modelo de desenvolvimento. Com isso, a qualidade da educação básica, foi considerada pela sociedade, nas consultas, realizadas pelo NAE Período: maio a outubro de 2005. Para maiores informações sobre os dados da pesquisa, consultar Agenda para o Futuro do Brasil. Brasil. NAE, 2007. , prioridade para o País. Contudo, o documento esclarece que a prioridade atribuída à educação básica não poderá comprometer a ampliação da educação superior e o aumento dos investimentos em ciência, tecnologia e inovação.
Essa perspectiva, da educação básica como prioridade sem comprometer o ensino superior na agenda educacional, pode encontrar portas no Plano Nacional de Pós-Graduação 2011-2020 (BRASIL, 2010), elaborado pela Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Este plano situa a pós-graduação stricto sensu diretamente ligada aos demais níveis de ensino. Segundo o documento, “o tema da educação básica será objeto de estudo por parte do Sistema Nacional de Pós-Graduação”. Dentre suas proposições recomenda que o sistema realize estudos sobre formação de professores, padrões mínimos de qualidade, gestão da escola e adequação curricular ao interesse dos estudantes. Nesta direção, mesmo diante do ceticismo de muitos, a criação da Diretoria de Educação Básica na Capes, pode indicar uma preocupação por parte do governo para desenvolver políticas voltadas para esta etapa da educação formal. Ao mesmo tempo, reconhecer que sem um investimento nesse nível de ensino, coloca-se em risco a produção científica de qualidade no Brasil.
Na intenção de definir o foco prioritário do planejamento: econômico, social ou de expectativa da sociedade, de acordo com o documento do NAE (2007), uma nova consulta à sociedade foi realizada Dados da pesquisa. Disponível também em: www.biblioteca.presidencia.gov.br, em que os temas estratégicos foram, mais uma vez, submetidos à sociedade. Embora não tenha encontrado outro dado de confirmação da consulta junto à sociedade, “os resultados apontaram, mais uma vez, a qualidade do ensino básico como tema prioritário” (NAE, BRASIL,2007, p.20).
Também, nesse contexto de influência, é possível identificar arranjos institucionais entre o Ministro da Educação Fernando Haddad (2005-2012) e Roberto Mangabeira Unger (2007-2009); (2013-20015), ministro extraordinário de Assuntos Estratégicos. Em artigo publicado pelo Jornal Folha de São Paulo São Paulo, segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008. os ministros afirmam que melhorar a qualidade do ensino público é prioridade da nação. Para traduzir esse consenso em ação informam que deverá ser construída uma rede de escolas médias federais, com dimensão técnica e profissional. Também buscarão reconciliar a gestão das escolas pelos Estados e municípios com padrões nacionais de investimento e qualidade.
Em seguida, o Plano para o Brasil em 2022 (2010), foi apresentado pelo Ministro de Ministro de Assuntos Estratégico Samuel Pinheiro (2009-2010). Na apresentação do documento, teria ele dito que as características principais do Plano são a viabilidade; a representatividade; e a possibilidade de avaliação e de correção. Portanto, prossegue o Ministro, para ser representativo, o planejamento deve ser objeto de ampla consulta a todos os setores da sociedade e do Estado. A sua viabilidade leva em conta a experiência da Administração Pública, que será necessariamente instrumento de sua implementação. Para ser passível de avaliação, o Plano apresenta metas claras e mensuráveis. Pinheiro (2010)
Nesse processo, para atingir esses objetivos, foram constituídos 37 Grupos de Trabalho, cada um correspondente a um Ministério, para garantir que nenhum tema escapasse à análise e à formulação de metas. As versões finais dos documentos setoriais foram aprovadas formalmente pelos respectivos Ministros de Estado. Segundo o seu idealizador, a partir desse esforço de preparação e discussão dos trabalhos e de consulta à sociedade, foi elaborado o Plano Brasil 2022. “Esse Plano, nas palavras do Presidente Lula, deveria apresentar as aspirações do povo para a sociedade brasileira no ano de comemoração do Bicentenário de nossa Independência”. Pinheiro (2010, p 5).
Desse modo, seguindo seus elaboradores, o plano projeta uma sociedade brasileira mais justa em 2022. Para enfrentar este desafio foi definido um conjunto de metas com foco na economia, sociedade, Infraestrutura e o Estado. A educação aparece como estratégia para o desenvolvimento da sociedade. Nesse modelo social, todos os brasileiros terão igual acesso aos bens públicos da saúde, da educação, do transporte, da habitação, da justiça e da cultura. Para que isso ocorra, segundo Pinheiro (2010, p 59), a educação é compreendida como um “processo permanente, e a cada momento mais sofisticado de preparação de homens e mulheres para uma participação política cada vez mais complexa, para seu pleno desenvolvimento cultural e para uma atividade produtiva que se transforma, contínua e rapidamente”.
De igual modo, as análises de Filho e Aguiar (2013) apresentam convergências de metas do Projeto “Metas educativas 2021: a educação que queremos para a geração dos bicentenários” O projeto “Metas Educativas 2021” originou do desejo ministros da Educação dos países ibero-americanos e da decisão política do conjunto de chefes de Estado e de governo das nações ibero-americanas, elaborado por um comitê que envolveu representantes da própria Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI,) da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) e da Secretaria Geral Ibero-americana (Segib) e aprovado em dezembro de 2010 em Mar del Plata, Argentina. (FILHO E AGUIAR, p.49, 2013), com as metas do plano Educacional para o próximo decênio. Ambos reconhecem a centralidade das políticas educacionais para a superação da desigualdade social e a condição de pobreza a que importante parcela da população se encontra submetida. Além disso, são fruto de ampla discussão social. “Para além de um plano de metas, para os pesquisadores, o Projeto Metas educativas 2021, trata-se de um projeto que, ao reconhecer a profunda desigualdade econômica em que vivem seus países--membros, institui um fundo solidário para a cooperação educacional” (2013, p.49).
Os instrumentos de mobilização e cooperação educacional para o planejamento educacional, também foram preocupação no Brasil. A vigência do Estado Democrático de Direito estimulou a construção de espaços democráticos para construção de políticas públicas. A mobilização dos profissionais da educação e do governo federal, permitiu mecanismos mais integrados e democráticos para elaborar o seu programa de metas para enfrentar as desigualdades sociais.
Aqui a mobilização dos profissionais da educação pode ser destacada na Campanha Nacional pelo Direito à Educação e no movimento Todos pela Educação, ambos apoiados pela Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência – SBPC. O governo federal se mobilizou convocando a Conferência Nacional da Educação Básica – CONEB–em 2008. Naquele momento o Ministério da Educação assumiu o compromisso institucional de organizar a Conferência Nacional de Educação – CONAE e a programou para abril de 2010. Segundo os organizadores da CONAE (2010), percebe- se, a partir desse movimento, o interesse do MEC em institucionalizar conferencias organizadas conjuntamente pela iniciativa da sociedade civil com as convocadas pelo Poder Executivo.
Imediatamente após concluir seus trabalhos, a CONAE encaminhou à Presidência da República o documento base do PNE. O documento representa a síntese de expectativas e demandas nacionais para a década atual. Vale lembrar que o diagnóstico do Projeto Metas Educativas 2021 sinalizou o analfabetismo, a evasão escolar precoce, o trabalho infantil, o baixo rendimento de alunos e a baixa qualidade de oferta educacional pública, como as demandas para o planejamento educacional. Logo, a proposta do plano é, conforme a Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI,) é, “melhorar a qualidade e a igualdade na educação para fazer frente à pobreza e à desigualdade e, desta forma, favorecer a inclusão social”. (OEI, 2010, p. 9). Certamente, em que pese à existência de planos anteriores, segundo Cury (2001) o PNE 2014-2024 tem uma história de construção baseada na amplitude da participação de todos os segmentos da sociedade por meio da CONAE 2010. Todavia o autor não desvela os dados que o permite tal afirmação. Ao tomar como seu objetivo de estudo e deliberação, a educação nacional, coube a CONAE alguns desafios. Dentre esses destaco o processo de institucionalização do Fórum Nacional de Educação (FNE), e a institucionalização da Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (SASE).
Assim o FNE torna-se instância de consulta, proposição, articulação, organização e acompanhamento da política nacional de educação, um espaço inédito de interlocução entre a sociedade civil e o Estado brasileiro. Lembram Filho e Aguiar (2013) que em 14 de setembro de 2011, o Fórum Nacional de Educação debruçou-se sobre as 2.906 Números obtidos, pelos autores, na “Nota Pública do Fórum Nacional de Educação sobre as emendas apresentadas pelos Deputados Federais ao Projeto de Lei no 8035/10, em tramitação no Congresso Nacional”, publicada em: conae.mec.gov.br Acesso em: 2 maios 2013emendas apresentadas pelos deputados federais, selecionando para análise 666 emendas consideradas “mais significativas”, das quais julgou 417 recomendáveis e 249 não recomendáveis. Da mesma forma, frente às disputas e conflito de interesses em transformar metas e estratégias em ações, a institucionalização da Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (SASE), pode ajudar a firmar acordos de integração dos principais instrumentos de planejamento governamental para a educação, o PNE 2014-2014 e o PPA 2016-2019.
Diante deste desafio, os caminhos de base política do governo federal, para o quadriênio 2014-2024, são desvelados e legitimados pelo discurso da Discurso da Presidenta da República, Dilma Rousseff, durante a abertura da Conferência Nacional de Educação (CONAE 2014) - Brasília/DF, “continuar construindo uma política de Estado que tenha na educação a sua base” . Além disso, quando em seu pronunciamento de posse, do segundo mandato, a Presidenta ratifica a centralidade da educação ao afirmar “De pé e com fé porque o Brasil será a verdadeira pátria educadora e os brasileiros terão acesso à educação de qualidade, da creche à pós-graduação”. Discurso da Presidenta da República, Dilma Rousseff, durante a abertura da Conferência Nacional de Educação (CONAE 2014) - Brasília/DF. Pronunciamento à nação da Presidenta da República, Dilma Rousseff, no Parlatório do Palácio do Planalto. Publicado 01/01/2015
Mensagem Presidencial no documento do Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão reafirma a expansão das oportunidades educacionais como a estratégia essencial para o desenvolvimento do país. Por isso, a perspectiva de uma Pátria Educadora perpassa todas as dimensões do PPA 2016-2019. Em seguida ressalta que não é suficiente construir uma escola de qualidade sem enfrentar a realidade material e simbólica da pobreza e da desigualdade. É no desafio de redução das desigualdades que se delineia a estratégia para o desenvolvimento de uma Pátria Educadora. Mensagem Presidencial, (Brasília, 2015, p. 27www.planejamento.gov.br
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise dos movimentos do planejamento de uma política educacional não pode se esquivar do contexto da política global de um país e daqueles que a definem. Como consequência, a definição de seus fins é um problema político do qual se inserem as relações de disputa entre lideranças pelo protagonismo na definição da agenda educacional.
As conclusões deste estudo apontam a inexistência de um contento de influência genuinamente nacional. Embora o princípio constitucional do direito à educação não significa necessariamente a sua efetivação, o que parece estar ocorrendo é o estabelecimento de parâmetros nacionais para se pensar o planejamento estratégico da educação no país. Contudo, a forma como isso ocorre pode apontar para a redução, senão a eliminação, das margens das especificidades locais dos estados e municípios. Uma vez que nos contextos de produção de texto e da prática de uma política pública há tensões e difíceis articulações entre o global, regional e o local. As publicações analisadas sobre a definição da educação básica na agenda do planejamento educacional, apontam nesse sentido, indicando a secundarizarão da participação dos estados e municípios na definição do planejamento estratégico.
Além disso, a analise o contexto de influência dos instrumentos de planejamento educacional, não nos permite afirmar a correlação entre as metas e estratégias estabelecidas no PPA 2016-2019 e o cumprimento das metas e estratégias estabelecidas no PNE 2014-2024. Por outro lado, com a aprovação dessa legislação a sociedade e o governo estão, mais uma vez, convocados para o desafio de combater os privilégios e garantir oportunidades educacionais a todos. Porquanto, frente a este desafio todos que lutam por uma educação pública democrática, eficiente e libertadora de privilégios rogam por uma concepção diferente das políticas estabelecidas para manter a reprodução social do capitalismo pela reprodução das forças reprodutivos e das relações de produção.
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