PARCEIRA PÚBLICO - PRIVADO: AS ORGANIZAÇÕES DAS ESCOLAS PÚBLICAS GOIANAS

Resumo: Este artigo, resultado parcial de estudos no grupo de pesquisa Estado, Políticas e Instituições Educacionais, tem por objetivo trazer reflexões sobre a parceria público-privado que ganha novos contornos no estado de Goiás com o credenciamento de Organizações Sociais para operacionalizar e executar as atividades administrativas e pedagógicas de escolas públicas. Discutimos as ideias neoliberais que interferem na condução das políticas públicas do Estado e alertamos para os desdobramentos deste novo modelo de gestão. A pesquisa é de cunho bibliográfico, documental e ancora-se em autores, como Adrião (2014), Molevande (2014), Vidal (1996), Vieira (1996), além das leis que respaldam a temática abordada.

Palavras-chave: políticas públicas, gestão, parceria público-privada


INTRODUÇÃO

Este artigo surge como resultado de estudos no decorrer da Pós-Graduação stricto sensu, linha de pesquisa Estado, Políticas e Instituições Educacionais, da PUC Goiás. Neste estudo, o nosso objetivo, dentre outros, é captar o movimento entre o público e o privado, no âmbito da educação, entendendo que transformações vêm ocorrendo no campo educacional, sendo que elas, ora interferem na gestão escolar e ora interferem na prática de atividades pedagógicas.

A pesquisa bibliográfica que vimos realizando aponta a abertura que a legislação oferece para as instituições privadas com ou sem fins lucrativos, sobre o fato impactante, quando falamos da transferência de recursos públicos à iniciativa privada. Esta parceria público-privada merece um olhar atento, especialmente no Estado de Goiás, posto estar em curso neste Estado parcerias com Organizações Sociais – OSs – para a gestão de várias unidades escolares da educação básica.

As OSs apresentam-se como uma nova configuração no contexto educacional destacando-se a discussão dos marcos entre o público e o privado, abordando divergências e convergências deste universo.

A PARCERIA PÚBLICO-PRIVADO: UMA “NOVA” OPÇÃO NEOLIBERAL

As vertentes neoliberais apoiadas no pensamento de Hayek, em especial na obra Os Fundamentos da Liberdade (The Constitution of Liberty), publicado em 1960, vão, sem dúvida, abrindo as portas para as privatizações nos diferentes setores que interferem direta e indiretamente no desenvolvimento social, como concomitantemente restringindo a participação estatal nestes mesmos setores. As políticas públicas sociais que se consolidam sob a égide do pensamento neoliberal consideram que o papel intervencionista do Estado é inoperante, pois coíbe a liberdade individual. É preciso garantir que cada indivíduo “tenha assegurada uma esfera privada, que exista certo conjunto de circunstâncias no qual outros não possam interferir” (HAYEK, 1983, p.6).

As análises de Anderson (1996) evidenciam a chegada das ideias neoliberais a começar pela Europa:

O modelo inglês foi, ao mesmo tempo, o pioneiro e o mais puro. Os governos Thatcher contraíram a emissão monetária, elevaram as taxas de juros, baixaram drasticamente os impostos sobre os rendimentos altos, aboliram controles sobre os fluxos financeiros, criaram níveis de desemprego massivos, aplastaram greves, impuseram uma nova legislação anti-sindical e cortaram gastos sociais. E, finalmente – esta foi uma medida surpreendentemente tardia –, se lançaram num amplo programa de privatização, começando por habitação pública e passando em seguida a indústrias básicas como o aço, a eletricidade, o petróleo, o gás e a água. Esse pacote de medidas é o mais sistemático e ambicioso de todas as experiências neoliberais em países de capitalismo avançado (p.10).

Para a implantação deste modelo era necessário um Estado forte para manter a estabilidade monetária e facilitar a sociabilidade do capital, investindo o mínimo no social. A competição e o individualismo ganham força, banindo as iniciativas dos movimentos sindicais e populares organizados, os quais deveriam ser desarticulados. As negociações visando aos interesses coletivos perdem força, cedendo lugar à flexibilização das relações laborais e à supressão dos direitos adquiridos pelos trabalhadores. A  intervenção do Estado só seria aceita no sentido de assegurar o mínimo de condições de alívio à pobreza e de alguns poucos serviços que não se constituíam em foco de interesse da iniciativa privada.

Nesta linha de pensamento encontram-se os defensores da parceria público-privado e é possível observar, que ao longo do tempo, a terceirização circula com grande expansão entre os setores da administração pública. A oferta de serviços privados, é utilizada sob o discurso de melhorar a prestação de serviços ou mesmo diminuição do gasto público, assim, intensifica-se a privatização de funções até então exclusivas do Estado. As instituições privadas com ou sem fins lucrativos são identificadas de forma geral como integrantes do terceiro setor na atuação da gestão pública.

No Estado de Goiás, desde 2011, a terceirização está presente no setor da administração pública, como por exemplo, na área da saúde, pois algumas unidades hospitalares foram repassadas para a administração das Organizações Sociais (OSs). A movimentação do governo do Estado demonstra que brevemente isso ocorrerá também em alguns estabelecimentos de ensino, com isso, as escolas públicas serão ocupadas pela vertente privada, que genericamente, são apresentadas à sociedade como parceiras. Corroboram para esta afirmação a publicação do Edital de Chamamento Público nº 001/2016, que objetivou o gerenciamento, a operacionalização e a execução das atividades administrativas, de apoio para a implantação e implementação de políticas pedagógicas definidas pela SEDUCE nas Unidades Educacionais da Rede Pública Estadual de Ensino, Macrorregião IV Anápolis. Essa mudança tem causado muita polêmica na sociedade goiana e merece um olhar mais atento.

Diante dessa nova proposta surgem inquietações como o que se entende por OSs; se são disciplinadas por lei; se podem ser financiadas com recursos públicos; quem são os representantes dessas organizações; se o poder público pode transferir ao parceiro privado o gerenciamento, a operacionalização e a execução das atividades administrativas e pedagógicas. Muitas são as perguntas a serem discutidas que este estudo, pela sua limitação, não será capaz de responder, no entanto nos coloca diante de um fato que precisa ser acompanhado pelos que defendem a educação enquanto direito de todos, portanto, pública e gratuita. Algumas questões a pesquisa foi suficiente para lucidar, outras requerem tempo e observação sistematizada, configurando-se em objeto de análise e reflexões vindouras. Ressalta-se ainda que pelas limitações de deste texto iremos lançar algumas considerações.

As OSs são disciplinadas pela Lei Federal n.º 9.637, de 15 maio de 1998, são entidades sem fins lucrativos, voltadas ao desenvolvimento de atividades sociais não exclusivas do poder público, sua parceria com o Estado acontece, por meio, de contrato de gestão, conforme o previsto no art. 5º da mesma lei. A lei refere-se às OSs instituídas e qualificadas criadas no âmbito federal, porém, Estados e Municípios, poderão instituir a figura das OSs por meio da própria lei.

No Estado de Goiás as OSs são regidas pela Lei Estadual n.º 15.503, de 28 de dezembro de 2005 e, no art. 2º, inciso I, alínea c, cita que as OSs poderão atuar essencialmente nas áreas de educação. O parágrafo único do art. 6º da referida Lei, com redação dada pela Lei estadual nº 18.331/13, determina que a transferência da gestão de escolas públicas estaduais a OSs será por meio da celebração de contratos de gestão, nos estritos termos do que estabelecem aquelas leis de regência e nos limites do que ditado pelo Decreto nº 8.469/15, por concluir que a medida mostra-se por tudo adequada atendimento do interesse público.

De posse da legislação que legitima a criação das OSs, o caminho está aberto para o credenciamento dessas Organizações e, em um segundo momento, a realização de contratos para a transferência de recursos e da condução das políticas públicas para a educação.

sua concepção no arcabouço legal, a partir da Constituição Federal de 1988, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº. 9.394/96 e Plano Nacional de Educação, Lei nº. 13.005/2014, o que faremos a seguir.

EDUCAÇÃO: DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO

O artigo 205 a Constituição Federal de 1988 refere-se à educação como direito de todos, assim como o art. 206, quando relaciona os princípios sobre os quais o ensino deverá ter como base:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais.

Todos têm o direito à escola pública e de qualidade, direito ao conhecimento e a liberdade de expressão. A escola pública é para todos, sem distinção, precisa acolher o indivíduo, independentemente de cor, raça ou credo. Sendo a escola pública, a CF garante sua gratuidade, além do direito à igualdade de condições tanto para o acesso, quanto para a sua permanência.

Ainda na CF de 1988, os defensores da escola pública lutaram para inserir no texto constitucional o princípio da destinação exclusiva de recursos públicos ao setor público, no entanto nos termos do artigo 213: “os recursos públicos serão destinados as escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas”.

Neste sentido, a Carta Magna abriu caminhos para a existência de instituições privadas, e consequentemente, a destinação de recursos públicos para o setor privado, desde que as escolas comprovem “finalidade não lucrativa” e apliquem seus excedentes financeiros em educação (Art. 213, I e II).  

No processo de elaboração e de aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, n.º 9394/96, embora a queda de braço entre publicistas e privatista tenha prosseguido, verifica-se, no seu texto final, que ela reitera os princípios da coexistência de instituições públicas e privadas de ensino (Art. 3º, V) e as classifica em duas categorias administrativas, as públicas “assim entendidas as criadas ou incorporadas, mantidas e administradas pelo poder público” e as privadas, que constituem as “mantidas ou administradas por pessoas físicas ou jurídicas de direito privado” (VIEIRA; VIDAL, 1996).

Nesse dispositivo legal citado acima, a LDB assegura às pessoas físicas ou jurídicas de direito privado a abrirem escolas em qualquer estado ou município da Federação, ou Distrito. Dentro desse contexto legal, a rede privada de ensino, que desde a colonização do Brasil se assegurou na oferta da educação, ratifica seu direito de ofertar serviço educacional, melhor dizendo, de vender seus serviços educacionais. 

Em relação às escolas privadas, há que se notar a distinção apresentada na legislação, conforme consta no art. 20 que “as instituições privadas se enquadram em particulares em sentido estrito, comunitárias, confessionais e filantrópicas podem ser definidas por categorias”:

I - particulares em sentido estrito, assim entendidas as que são instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado que não apresentem características dos incisos abaixo;

II - comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas, inclusive cooperativas de professores e alunos que incluam na sua entidade mantenedores representantes da comunidade;

III - confessionais, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas que entendem a orientação confessional e ideologia específicas e ao disposto no inciso anterior;

IV – filantrópicas, na forma da lei.

Cabe ressaltar que as redes de ensino público e privado têm abertura à concessão de recursos financeiros surgindo assim, uma temática permanente e polêmica acerca da destinação desses recursos. Embora esta transferência de recursos seja prevista em lei, conforme é possível perceber nos termos da Constituição Federal de 1988, no artigo 213, “os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, eles podem ser dirigidos as escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas” e só serão permitidas as transferência para as escolas que:

I - comprovem finalidade não-lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação;

II - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades.

§ 1º Os recursos de que se trata este artigo poderão ser destinados a bolsas de estudo para o ensino fundamental e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública na localidade da residência do educando, ficando o Poder Público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua rede na localidade.

§2º As atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio financeiro do Poder Público.

§ 2º As atividades de pesquisa, de extensão e de estímulo e fomento à inovação realizadas por universidades e/ou por instituições de educação profissional e tecnológica poderão receber apoio financeiro o Poder público. (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 85, de 2015).

Podemos dizer que a rede privada se faz presente na educação básica, em todos os níveis e modalidades Dessa maneira, as concessões de recursos financeiros podem ser “destinados a bolsas de estudos para a educação básica” para aqueles que possam demonstrar “insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares na rede pública de domicilio do educando”, conforme estabelece o art. 77, § 1º, da LDB, ou ainda por meio de parcerias público-privado.

Esta parceria tem sido legalizada por leis específicas e de forma subliminar por meio das políticas públicas que indicam a participação da sociedade como fundamental para o alcance das metas educacionais propostas para o decênio 2014-2024.

No Plano Nacional da Educação (2014-2024), Lei nº. 13005/2014, a polêmica entre o público e o privado mais uma vez é reeditada referente aos recursos destinados à educação pública.

Em relação à Educação Infantil, por exemplo, no atual PNE vimos a concretização desta parceria na estratégia 1.7 referente à Meta 1 que prevê universalizar, até 2016, a educação infantil na pré-escola para as crianças de 4 a 5 anos de idade e ampliar a oferta de educação infantil em creches de forma a atender, no mínimo, 50%  das crianças de até 3 anos até 2024.  Diz a estratégia: “articular a oferta de matrículas gratuitas em creches certificadas como entidades beneficentes de assistência social na área de educação com a expansão da oferta na rede escolar pública” (Lei 13.005/2014).

Tal estratégia implica na transferência de recursos públicos para entidades privadas que atuam na Educação Infantil, por meio de convênios, ajustes, contratos entre outros dispositivos legais, que permitem a transferência de recursos. São parcerias público-privado que visam a manutenção destas instituições em troca da oferta de vagas sem a garantia da gratuidade, tampouco a interferência pública na condução pedagógico-administrativa.

O SURGIMENTO DE UM NOVO FENÔMENO NA EDUCAÇÃO PÚBLICA NO ESTADO DE GOIÁS

Falar de ensino público e privado não é tarefa fácil, pois, estão em constantes movimentos, por muitas vezes, abordam polêmicas, como a qualidade da educação. É comum atrelar a qualidade ao ensino privado e a deficiência ao público. No entanto, estas afirmações corroboradas por índices, resultados de avaliações de larga escala ou ainda pelo senso comum, não se constituem em elementos de análise suficientes que revelam e interpretam a realidade educacional no país. 

A pauta no presente momento é a terceirização, como solução para todos os problemas. Na verdade a terceirização percorre o Brasil, há tempos, perpassando vários setores. No Estado de Goiás, não foi diferente, em 2011, tivemos as principais unidades hospitalares repassadas para a administração das OSs, e conforme pronunciamento do atual  Governador do Estado (2015-2018), esse modelo administrativo será encaminhado para a área da Educação Pública.

As OSs visam atingir três setores: pedagógico, político e econômico da educação pública no estado de Goiás, mas, vamos nos ater a parte econômica, partindo do pressuposto que a educação sempre foi vista como uma fonte de negócios para o setor privado, constituindo o ensino em uma mercadoria, assim como qualquer mercadoria regulada pelas leis de mercado. O que muda a partir das OSs será a forma como esse mercado será conduzido, pois irá ampliar a autonomia das empresas, retirando assim, a participação de pais, comunidades e gestão democrática. O documento do Edital de Chamamento 001/2016 da Secretaria de Estado, Educação, Cultura e Esporte (SEDUCE) diz que:

Instrumento de CHAMAMENTO PÚBLICO n.º 001/2016, destinado à seleção de organização social, qualificada em educação no âmbito deste Estado, para elaboração de Contrato de Gestão objetivando o gerenciamento, a operacionalização e a execução das atividades administrativas, de apoio para a implantação e implementação de políticas pedagógicas definidas pela SEDUCE nas Unidades Educacionais da Rede Pública Estadual de Ensino, Macrorregião IV Anápolis.

4.1. Podem participar do presente procedimento de seleção as entidades privadas sem finalidade lucrativa, devidamente qualificadas no Estado de Goiás como Organização Social de Educação OSE, nos termos do art. 6º-G da Lei Estadual nº 15.503, de 28 de dezembro de 2005;

Podemos perceber que existe uma concorrência para esse mercado, operado por OSs. Há uma expectativa de lucros, pois as OSs são organizações da sociedade civil, não estão vinculadas a organização religiosa o que retira delas o caráter filantrópico. São, pois, empresas que se lançam ao mercado para ampliar seu capital. Encontrarão formas legítimas de fazê-lo em detrimento das classes menos favorecida sejam elas os trabalhadores/as da educação ou as classes que necessitam da escola pública para o acesso e a permanência na Educação Básica

A Tabela 1, contida no Edital 001/2016, traz elementos que nos chamam a atenção

Tabela 1: Previsão de repasses anuais para escolas da primeira Chamada.
Fonte: SEDUCE (2015).

Total de Escolas

Total de Alunos

Sala de Aula

Professor Efetivo

Professor Contrato

Repasse Mensal por Aluno Mínimo

Repasse Mensal por Aluno Máximo

Valor Total Anual Mínimo

Valor Total Anual Máximo

23

16.016

291

636

229

250

350

48.048.000,00

67.267.200,00

O número de professores em situação de contrato temporário representa 26,4%. Este percentual tende a crescer, uma vez que, as novas contratações não serão realizadas por meio de concurso público. A precariedade do trabalho docente pode comprometer a qualidade da educação, além de indicação de uma redução nas despesas referentes à folha de pagamento. Sabemos que o Plano de Cargos e Salários, que prevê benefícios aos professores, conquistado por meio de muitas lutas dos movimentos sociais não se aplica aos professores admitidos por meio de contratos temporários. Não há garantia de valorização deste profissional, a partir de uma política de formação continuada, o que configura em ganho de capital para o empresário da educação, que economiza no pagamento da mão-de-obra.

A este respeito Marx (1978) nos alerta:

Com o fim imediato e (o) produto por excelência da produção capitalista é a mais- valia, temos que só é produtivo aquele trabalho – e só trabalhador produtivo aquele que emprega a força de trabalho – que diretamente produza mais-valia; portanto, só o trabalho que seja consumido diretamente no processo de produção com vistas à valorização do Capital. É produtivo o trabalhador que excuta trabalho produtivo; é produtivo o trabalho que gera diretamente mais-valia. Isto é, que valoriza o capital. A determinação do trabalho produtivo (e, por conseguinte, também a do improdutivo, como seu contrário) funda-se, pois, no fato de que a produção do capital é produção de mais-valia, e em que o trabalho empregado por aquela é trabalho produtor de mais valia (p.70-80).

Para Freitas (2015): “As relações do setor privado são distintas do setor público. O estado de Goiás está entregando à administração privada um bem público e isto chama-se privatização por concessão de gestão”.

Para Adrião (2014), qualificar a gestão pública, por meio de uma articulação entre os entes federados e com apoio técnico e financeiro do governo federal, apresenta-se como alternativa possível e necessária e não a transferência desta função para o setor privado. Para Monlevade (2014), a luta deve ser para que se aprove 10% de recursos públicos para educação, o que foi conseguido no PNE 2014-2024, e que sejam encontradas fontes, que sejam ativadas e destinadas à educação pública de qualidade.

Um dos principais nós na relação público-privado é a imensa desigualdade tributária entre as diferentes esferas de governo (federal, estadual e municipal), entre Estados e entre Municípios de um mesmo Estado desigualdade essa que impõe um limite objetivo à constituição de um sistema nacional de educação com um padrão de qualidade razoável (DAVIES, 2012).

Como podemos perceber a luta para a efetivação de educação de qualidade social, a e gestão eficiente da educação pública passa por outros caminhos de lutas e conquistas. A LBD 9.394/96 deixa claro que a gestão da escola pública deve ser democrática, o que significa dizer pensada, discutida, elaborada, realizada, operacionalizada pela comunidade escolar e não por Organizações alheias a este processo.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

A educação brasileira sempre apresentou grandes desafios, e a complexidade da temática abordada entre o público e o privado na educação brasileira não é recente, mas, vem ao longo dos tempos sendo assunto de discussão e reflexão.

O estudo permitiu percebemos que a privatização é complexa e está presente na realidade objetiva, uma vez que vem ocupando em larga escala espaços da administração pública no estado de Goiás. No entanto, há que se refletir sobre a capacidade financeira das OSs que pretendem “gerir” a educação. Os dados nos levam a inferir, pela observação dos movimentos que culminam na transferência de gestão, é que as entidades privadas com ou sem fins lucrativos, buscam sua manutenção pelo repasse de recursos que são públicos. 

Com a implantação e implementação das OSs, surge o conceito de um novo modelo no meio educacional, que vai de encontro ao que preceitua a LDB no que diz respeito à gestão democrática, além do arcabouço legal que disciplina a transferência de recursos públicos para entidades privadas. É indispensável a reflexão quanto a prestação desses serviços, sendo eles pedagógicos e administrativos. Esta discussão deve considerar a presença de entidades privadas, alheias à comunidade escolar que passam a gerenciar, a operacionalizar e a executar as atividades administrativas e pedagógicas.

Os estudos realizados até o momento nos permitem dizer que com este novo modelo de gestão haverá uma diminuição crescente dos concursos públicos, o que corrobora para a exploração e precarização do trabalho do professor e demais profissionais da educação. Cabe ressaltar, que os novos profissionais do magistério o técnicos administrativos, serão regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o que implica na perda dos seus direitos e garantias que foram conquistados ao longo do tempo, como por exemplo, a estabilidade no emprego, quinquênio, licença remunerada para formação continuada, planos de cargos e salários entre outras.  

O transferência da gestão e oferta da educação pelas  OSs  configura-se como a privatização do público, e incerteza em relação às políticas educacionais vindouras, uma vez que a ausência do público na educação não mais a assegura como direito público e subjetivo.

REFERÊNCIAS

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DAVIES, Nicholas. O Financiamento da Educação Estatal no Brasil: novos ou velhos desafios? Revista Educação On-line PUC-Rio nº 10, p. 31-63, 2012. Disponível em http://www.maxwell.lambda.ele.pucrio.br/rev_edu_online.php?strSecao=input0

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