PÁTRIA EDUCADORA E A MISSÃO DO IFFARROUPILHA: DILEMAS E DESAFIOS
Resumo: Este artigo visa analisar a “missão” do Instituto Federal Farroupilha a partir das diretrizes apresentadas pela Secretaria de Assuntos Estratégicos presentes no documento “Pátria Educadora: a qualificação do ensino básico como obra de construção nacional”. O Instituto Farroupilha é uma instituição de educação que oferta educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino. Sua missão é “de formar cidadãos críticos, autônomos e empreendedores, comprometidos com o desenvolvimento sustentável e um papel ativo na sociedade em prol do coletivo”. Assim, refletir sobre os dilemas e desafios do Instituto Farroupilha a partir do programa Pátria Educadora se faz necessário, pois o documento propõe alterações em relação ao ensino básico que afetarão Institutos Federais.
Palavras-chave: educação; pátria educadora; instituto federal farroupilha.
INTRODUÇÃO
Este artigo tem como objetivo analisar a “missão” do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha a partir das novas diretrizes apresentadas pela Secretaria de Assuntos Estratégicos, cuja finalidade oficial é a qualificação do ensino básico. Essas diretrizes estão apresentadas no documento “Pátria Educadora: a qualificação do ensino básico como obra de construção nacional”, elencando um conjunto de ações para serem executadas em prol da educação brasileira. Está divido em duas partes: parte I – A tarefa, parte II – Iniciativas. Neste artigo dar-se-á ênfase a parte dedicada “A tarefa”.
A tarefa de qualificar o ensino público desdobra-se em três vertentes: a construção de ideário que oriente a transformação pretendida; a definição de elenco de ações que sinalize o caminho e identifique os primeiros passos para trilhá-lo; e a organização de debate que engaje a nação na definição e execução da tarefa. (BRASIL, 2015, p. 3)
O programa Pátria Educadora torna-se um conjunto de ações que são elaboradas visando “dar a cada brasileiro chance melhor para ficar de pé”. Para tal, o ensino médio é a parte “mais importante nesse novo modelo de desenvolvimento produtivista, capacitador e democratizante” (BRASIL, 2015, p. 4).
Mas, segundo o referido programa, para a transformação do ensino público deve-se incluir 4 campos de iniciativa: “a organização da cooperação federativa na educação; a reorientação do currículo e da maneira de ensinar e de aprender; a qualificação de diretores e professores; e, o aproveitamento de novas tecnologias” (BRASIL, 2015, p. 7).
Entretanto, percebe-se ao investigar os campos citados que eles, mesmo mencionando e propondo modificações para o ensino técnico profissionalizante integrado ao ensino médio, acabam, muitas vezes, não estando em sintonia com os objetivos dos Institutos Federais. Instituições públicas criadas para atender, entre outros, o ensino técnico no Brasil, tendo o trabalho como princípio educativo e a intervenção social baseada em uma prática pedagógica entrelaçando homem – cultura – tecnologia. Com isso, proporcionar-se-á condições para a construção de cidadãos críticos e autônomos, que percebam o ser humano como motivo primeiro e principal de suas ações.
Para tal, o Documento Base da Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio
expressa uma concepção de formação humana, com base na integração de todas as dimensões da vida no processo educativo, visando à formação omnilateral dos sujeitos. Essas dimensões são o trabalho, a ciência e a cultura. O trabalho compreendido como realização humana inerente ao ser (sentido ontológico) e como prática econômica (sentido histórico associado ao modo de produção); a ciência compreendida como os conhecimentos produzidos pela humanidade que possibilita o contraditório avanço das forças produtivas; e a cultura, que corresponde aos valores éticos e estéticos que orientam as normas de conduta de uma sociedade. (BRASIL, 2007, p. 41)
Assim, a educação profissional e tecnológica não deve ser entendida como mera instrumentalizadora de pessoas para ocupações determinadas por um mercado. Deve ser vista como um importante espaço na constituição do desenvolvimento local e regional (PACHECO, 2011).
Portanto,
Derrubar as barreiras entre o ensino técnico e o científico, articulando trabalho, ciência e cultura, na perspectiva humana é um dos objetivos basilares dos Institutos Federais. Sua orientação pedagógica deve recusar o conhecimento exclusivamente enciclopédico, assentando-se no pensamento analítico, buscando uma formação profissional mais abrangente e flexível, com menos ênfase na formação para ofícios e mais na compreensão do mundo do trabalho e em uma participação qualitativamente superior nele (PACHECO, 2011, p. 14).
Com esse intuito fora criado o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha - IF Farroupilha, através da lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Uma instituição de educação superior, básica e profissional, pluricurricular e multicampi, especializada na oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino, tendo como base a conjugação de conhecimentos técnicos e tecnológicos com a sua prática pedagógica. Sua missão é “de formar cidadãos críticos, autônomos e empreendedores, comprometidos com o desenvolvimento sustentável e um papel ativo na sociedade em prol do coletivo”.
Desse modo, refletir sobre os dilemas e desafios do Instituto Federal Farroupilha a partir do programa “Pátria Educadora: a qualificação do ensino básico como obra de construção nacional”, se faz necessário e urgente. Afinal, o referido documento propõe várias alterações em relação ao ensino básico, que afetarão direta ou indiretamente o ensino integrado profissionalizante, bem como, os próprios Institutos Federais, além da educação pública em geral.
DESENVOLVIMENTO
“A educação tem desempenhado um importante papel, tanto no sentido de contribuir para a construção de uma hegemonia ideológica conservadora, quanto no de reforçar movimentos contra hegemônicos” (GANDIN, HYPÓLITO, 2003, p. 59).
Portanto, é uma prática humana usada para manutenção ou transformação social. Sendo direcionada por uma determinada concepção teórica que ordena os elementos para a prática educacional (LUCKESI, 2011). Essas, embasadas em políticas públicas que vão definindo e/ou norteando os rumos da educação brasileira e suas transformações, fazendo com que, muitas vezes, se viva em tempos de incertezas e constantes questionamentos.
Não obstante, alguns tempos são mais incertos do que outros – tempos em que os acordos sociais estabelecidos e os modos estabelecidos de ver as questões sociais e educacionais começam a desgastar-se, e não são capazes de prover respostas ou de fazer frente às forças da crise e do desmantelamento social (CARLSON, APPLE, 2003, p. 11).
Assim, “em tempos de incertezas, visões rivais de mudanças disputam umas com as outras para ver qual estabelecerá uma nova “certeza”, baseada em um novo discurso do senso comum em progresso” (CARLSON, APPLE, 2003, p. 11).
As ideias que formam o senso comum não se constituíram como resultado de uma arbitrariedade, mas porque “fazem sentido” aos indivíduos, sentido esse fundamentado nas experiências cotidianas. O senso comum é formado por diferentes posições ideológicas, que não são “falsas imagens” da realidade ou produto de uma falsa consciência, mas visões particulares da realidade que se baseiam nas relações materiais de classe, gênero e raça. Senso comum, então, é formado principalmente (mas não exclusivamente) por ideologias hegemônicas, uma vez que os grupos dominantes, apoiados em relações de poder que envolvem suas dinâmicas de classe, raça, geração, gênero, etc., conseguem apresentar suas visões como “naturais” na compreensão da sociedade. O discurso hegemônico é aceito, em parte, porque consegue ancorar-se em entendimentos anteriormente presentes no senso comum. Embora o senso comum seja visto como um caminho “natural” ou “lógico” de pensar e agir, ele é, de fato, uma construção histórica (GANDIN, HYPOLITO, 2003, p 72).
Frente a esse senso comum a educação acaba priorizando o ensino voltado às necessidades do mercado. Nesse modelo o ensino é extremamente utilitarista, tendo valor somente o que apresenta algum benefício material para a vida do aluno (TORRES, 2003).
Esse modelo de educação enfatiza a qualidade entendida como produtividade, o fracasso, sucesso, problemas disciplinares, aprendizagem, etc., como uma situação individual, de responsabilidade de cada um. Com isso, desresponsabiliza o Estado e também os professores do seu compromisso social. São desconsiderados também outros fatores importantes, como o contexto familiar, cultural, econômico e social em que se encontra o aluno. Para os favoráveis a essa forma de pensar, adaptar os currículos às necessidades dos alunos seria o mesmo que diminuir os níveis de exigência do ensino. Isso iria contra as propostas do mercado, contrariando os interesses neoliberais (TORRES, 2003).
A escola transmite e consolida, algumas vezes de forma explícita e em outras implicitamente, uma ideologia cujos valores são o individualismo, a competitividade e a falta de solidariedade, a igual forma de oportunidades e a desigualdade natural de resultados em função de capacidades e esforços individuais. Assume-se a ideia de que a escola é igual para todos e de que, portanto, cada um chega onde suas capacidades e seu trabalho pessoal lhes permite (GÓMEZ, 1998, p. 16).
Esse discurso meritocrático é aceito facilmente por parte da sociedade. Afirma Gandin e Hypólito (2003, p. 76) que “os grupos hegemônicos transformam seu discurso em hegemônico porque são capazes de “convencer” os grupos dominados a usarem suas lentes para “enxergarem” a realidade e guiarem suas ações da vida cotidiana.”
Todavia, “a educação é uma prática moral e política, e sempre pressupõe uma introdução e preparação para formas específicas de vida social, uma interpretação particular das noções de comunidade e daquilo que o futuro pode trazer” (GIROUX, 2003, p. 61).
Assim,
mais do que transmitir informações, a função educativa da escola contemporânea deve ser orientar para provocar a organização racional da informação fragmentária recebida e a reconstrução das preconcepções acríticas, formadas pela pressão reprodutora do contexto social, por meio de mecanismos e meios de comunicação cada dia mais poderosos e de influência mais sutil (GÓMEZ, 1998, p. 26).
Nesse contexto torna-se importante o desenvolvimento humano a partir de uma educação voltada para a autonomia e o cuidado com o outro de “menos sorte”(Giroux, 2003, p. 6). Em função disso, a educação profissional e tecnológica deve ser entendida como política pública, não só porque é fonte de financiamento e manutenção, mas “por seu compromisso com o todo social” (PACHECO, 2011, p. 18).
A educação profissional e tecnológica tem um papel no contexto social não só ligado ao desenvolvimento econômico, mas na inserção cidadã de milhões de brasileiros, sendo por isso, um novo tipo de instituição. Uma instituição que tenha compromisso de modificar a vida humana e transformar a sociedade. Por isso, é “incompatível com uma visão conservadora da sociedade. Trata-se, portanto, de uma estratégia de ação política e de
Porém, de acordo com o programa Pátria Educadora, o Brasil vem evoluindo em termos educacionais nos últimos anos utilizando experimentos que seguem a lógica empresarial. Através do exemplo empresarial fixou metas de desempenho, modelos de avaliação, incentivos, cobranças, etc. “Tais práticas surtiram efeitos positivos inegáveis. Devem ser incorporadas ao projeto de qualificação do ensino público. (...) Temos muito a aprender com a lógica empresarial”(BRASIL, 2015, p. 5).
Entretanto, as mesmas diretrizes apontam que o Brasil tem um longo caminho a percorrer em termos de ensino público de “qualidade”. Nessa educação desejada pretende-se priorizar o desenvolvimento de habilidades em relação à análise verbal e raciocínio lógico. “E que permita à massa de alunos, vindos do meio pobre, superar as barreiras pré-cognitivas que os impedem de aceder às capacitações analíticas. Será obra de libertação”(BRASIL, 2015, p. 6).
Para tal, o ensino público deve introduzir alternativas em quatro campos da educação: “a organização da cooperação federativa na educação; a reorientação do currículo e da maneira de ensinar e de aprender; a qualificação de diretores e de professores e o aproveitamento de novas tecnologias” (BRASIL, 2015, p 6).
Em relação à “organização da cooperação federativa na educação” destaca-se duas iniciativas. Primeiramente o uso da prova Brasil para criação de um cadastro nacional de alunos, facilitando a “individualização das oportunidades de ensino”. Soma-se a isso, a segunda iniciativa realizada a partir do desempenho do “INEP ou entidade alternativa” que identifique dentro do sistema público de ensino os melhores experimentos a fim de servir de modelo para os demais (BRASIL, 2015).
A ofensiva neoliberal tenta criar um novo senso comum em todos os campos da vida social, especialmente na educação. Assim, a educação, para consolidar a hegemonia dominante, deve ela mesma ser submetida às regulações neoliberais. (...) No neoliberalismo, a liberdade de mercado é a solução para todos os problemas. (...) Todos possuem as mesmas oportunidade, aqueles que fracassam são incompetentes e sofrerão o processo de seleção natural (darwinismo social) (GANDIN; HYPÓLITO, 2003, p 61).
Na “reorientação do currículo e da maneira de ensinar e de aprender” destaca-se o “aprofundamento seletivo” com o fim do enciclopedismo através de campos de aplicação. Soma-se a isso o currículo nacional comum, acompanhado de protocolos que oferecerão exemplos práticos e detalhados de como “liderar cada aula em cada
Nessa linha de reformulações aparece nas diretrizes do Pátria Educadora a criação de oportunidades diferenciadas para alunos de maior potencial, bem como, para a formação dos professores através de “Centros de Qualificação Avançada”. Essas oportunidades dar-se-ão através da criação de uma “rede federal de escolas médias de referência chamadas Escolas Anísio Teixeira”, onde os alunos concorrerão para lá serem admitidos (BRASIL, 2015, 11). Tudo isso para, segundo o documento, “sacudir a mediocridade”.
Não se sacode a mediocridade apenas para acomodar elite de talentosos. Sacode-se a mediocridade, é certo, para impedir que nossos Newtons e Darwins continuem a baixar à sepultura sem se haverem reconhecido. Mas sacode-se a mediocridade, também, para levantar a todos. Os que não quiserem ou conseguirem, em primeiro momento, admissão aos programas especiais ou às escolas de referência seriam prejudicados pela negação de oportunidades a alunos com potencial extraordinário. Seriam empurrados para baixo, como são agora, pela supressão de fontes de inspiração no sistema de ensino, ao mesmo tempo que a nação é empobrecida pela rendição à mediocridade, travestida de compromisso igualitário (BRASIL, 2015, p.12)
Gómez (1998) expõe que, muitas vezes, se socializa as novas gerações na desigualdade usando os artifícios da competitividade e da meritocracia. Com isso, não se considera todas as diferenças, discriminações, experiências e contextos que cada grupo social pertence e pode usufruir.
Corrobora Bourdieu afirmando que,
Gómez (1998) expõe que, muitas vezes, se socializa as novas gerações na desigualdade usando os artifícios da competitividade e da meritocracia. Com isso, não se considera todas as diferenças, discriminações, experiências e contextos que cada grupo social pertence e pode usufruir.
Corrobora Bourdieu afirmando que,
Em outras palavras, tratando todos os educandos, por mais desiguais que sejam eles de fato, como iguais em direitos e deveres, o sistema escolar é levado a dar sua sanção às desigualdades iniciais diante da cultura. ( ) A igualdade formal que pauta a prática pedagógica serve como máscara e justificação para a indiferença no que diz respeito às desigualdades reais diante do ensino e da cultura transmitida, ou, melhor dizendo, exigida (BOURDIEU, 2007, p.53).
Para diminuir essas desigualdades o Documento Base que rege os Institutos Federais afirma que a evolução econômica e as exigências democráticas abrem espaços para a união entre o ensino geral e o prático, privilegiando as demandas pelas tecnologias contemporâneas de produção que são flexíveis e genéricas. “As escolas técnicas federais devem pouco a pouco reorganizar-se de acordo com este figurino” (BRASIL, 2015, p. 13).
Ainda em relação a “reorientação do currículo e da maneira de ensinar e de aprender” destacam-se as capacitações pré-cognitivas, indicando que “grande parte da massa de alunos pobres no país enfrenta obstáculos que podem parecer intransponíveis em subir a escada das capacitações analíticas. São as inibições, às vezes chamadas socioemocionais, que barram o caminho” (BRASIL, 2015, p 13).
Trata-se de trabalhar no terreno de capacitações pré-cognitivas que faltam a crianças saídas da pobreza mais comumente do que faltam aos filhos da classe média. Estas capacitações não trazem bondade: trazem poder. Empoderam os maus tanto quanto os bons. São capacitações de comportamento tanto quanto de consciências (BRASIL, 2015, p. 13)
Das capacitações descritas, ganham ênfase a disciplina e a cooperação. A disciplina abrange concentração para a realização das tarefas e da aprendizagem, consequentemente aprendendo também a manter uma rotina de trabalho, selecionar prioridades, organizar o tempo e se dedicar a realmente cumprir todos os compromissos sem se deixar levar pelas tentações e distrações do mundo contemporâneo (BRASIL, 2015).
Soma-se a disciplina, também a cooperação.
As práticas cooperativas representam porta para as formas superiores de aprendizagem e de produção. É o método do trabalho científico tanto quanto é, cada vez mais, a base de qualquer atividade produtiva densa em conhecimento. As formas mais avançadas da produção são aquelas que pedem ao trabalhador fazer tudo aquilo que ainda não aprendemos a repetir e que, portanto não podemos delegar a máquinas (BRASIL, 2015, p 14).
Todavia, segundo o programa Pátria Educadora , “não se consegue qualificação decisiva do ensino público sem mudar a situação, o equipamento e a composição do professorado e dos diretores de escola” (BRASIL, 2015, p 14). Entretanto, sabe-se que essas mudanças não são fáceis de serem implementadas, visto que, as dificuldades são de toda ordem e estão interligadas, exemplo disso é a questão salarial do professor. Entretanto, as evidências apontam que “[...] aumentar, ainda que substancialmente, o salário do professor não resulta, por si só, em melhora do ensino, ainda que, junto com muitas outras medidas, possa tornar a carreira (quando ela existir) mais atraente” (BRASIL, 2015, p 15).
Complementando, aponta ainda o programa que em relação aos professores são, geralmente, os alunos mais fracos do ensino médio e que acabam cursando suas graduações em instituições privadas e muitas vezes de origem duvidosa. Já, em relação aos diretores, afirma que, “em grande parte do país, são nomeados por apadrinhamento político ou eleitos em processos que favorecem a irresponsabilidade e a indiferença ao mérito”. Já (BRASIL, 2015, p 15).
Assim, como alternativa para alcançar os objetivos da mudança educacional proposta, deve-se também premiar as escolas que alcançarem as metas de desempenho desejadas, bem como, intervir na formação dos diretores e na qualificação dos professores através dos já mencionados “Centros de Formação de Diretores”. Para os professores criar-se-ão “Centros de Qualificação Avançada”, proporcionando cursos para suplementar a formação. Além disso, dar-se-á ênfase a carreira nacional com metas de desempenho, adicional ao salário ligado ao cumprimento das metas e um complemento da carreira nacional através da “Prova Nacional Docente”. Essa, organizada para as licenciaturas e pedagogia, dividida em duas partes: teórica e prática, para que, através da avaliação seja possível que os professores demonstrem se estão preparados para ensinar nas áreas em que se credenciaram (BRASIL, 2015, p 17).
Todavia, todo esse processo de formação de professores e diretores é demorado e envolve várias questões, tornando seus efeitos perceptíveis mais em longo prazo. Desse modo, para acelerar esse processo de transformação pode-se optar pelo uso das tecnologias, divididas em duas formas: “as aulas em vídeos e os softwares interativos. Os primeiros permitem enriquecer e sacudir o ambiente da escola com inspiração vinda de fora. Os segundos acrescentam à inspiração vinda de fora a oportunidade para o aluno avançar por conta própria” (BRASIL, 2015, p 19).
CONCLUSÃO
A lógica do pensamento conservador, influenciado pelo modelo neoliberal, faz com que a escola, muitas vezes, priorize as questões relacionadas ao emprego e ao mercado de trabalho. Escolas e professores que não se adaptam a esse sistema são criticados, afinal a ideia de outro mundo, outra possibilidade de ser e agir são percebidos como utopia, ilusão. Com isso, “parece existir mais preocupação em memorizar fórmulas, dados e generalizações descontextualizadas que em chamar a atenção para realidades concretas, tanto longínquas quanto locais” (TORRES, 2003, p. 203).
Assim, cada vez mais se torna necessária outra forma de lidar com o conhecimento que supere o modelo hegemônico disciplinar. Para tal, deve-se “pensar um profissional da educação capaz de desenvolver um trabalho reflexivo e criativo e promover transposições didáticas contextualizadas que permitam a construção da autonomia dos educandos” (PACHECO, 2011, p 27). Pois, mesmo sabendo que os discursos podem ser reproduzidos, sabe-se também que se pode resistir a eles, desde que as pessoas tenham condições de perceber, analisar e pensar outras formas e condições de trabalho, relacionamento, ideias e ações. Afinal, “as crenças e ações humanas são construídas e modificadas em função das circunstâncias em que se vive e se trabalha” (TORRES, 2003, p. 240).
Entretanto, torna-se notório que o documento “Pátria Educadora: a qualidade da educação básica como obra de construção nacional” não vem ao encontro do documento base que norteia os Institutos Federais, nem comunga com as mesmas ideias apresentadas oficialmente na missão presente no documento de criação do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha.
Desse modo, talvez seja ingenuidade esperar que organizações sociais estejam dispostas a oferecer aos novos cidadãos condições para que desenvolvam o pensamento autônomo e crítico sobre a sociedade em geral. “Seu interesse, mais ou menos legítimos, orientam-se em outras direções mais próximas da inculcação, persuasão ou sedução do individuo a qualquer preço do que da reflexão racional e da comparação crítica de pareceres e propostas. Somente a escola pode cumprir esta função (GÓMEZ, 1998, p. 25)”. Entretanto, a escola e a educação do professor são elementos cruciais no processo de realização de uma sociedade mais justa. Para isso, a própria escola deve propor e agir considerando como objetivo prioritário o cultivo, em estudantes e docentes, da capacidade de pensar criticamente sobre a ordem social (SACRISTAN, 1998, p. 374).
Ordem social que não será transformada se o professor não assumir seu lugar nesse espaço de lutas e tensões. Afinal, “não assumir nosso lugar e responsabilidade nesse espaço significa entrega-lo a forças que certamente irão moldá-lo de acordo com seus próprios objetivos e esses objetivos podem não ser exatamente os objetivos de justiça, igualdade e um futuro melhor para todos” (TADEU, 2010, p. 13).
REFERÊNCIAS
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GIROUX, Henry A. Atos impuros: a prática política dos estudos culturais. Trad: Ronaldo Cataldo Costa. Porto Alegre: Artmed, 2003.
GÓMEZ, A. I. Pérez. As funções sociais da escola: da reprodução à reconstrução crítica do conhecimento e da experiência. In: SACRISTÁN, J. Gimeno. Compreender e transformar o ensino. 4ªed. Artmed, 2007.
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PACHECO, Eliezer (org.). Institutos Federais: uma revolução na educação profissional e tecnológica. Ed Moderna Ltda, 2011.
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SANTOMÉ, Jurjo Torres. Globalização e interdisciplinaridade: o currículo integrado. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
TORRES, S. J. Currículo escolar e justiça social: o cavalo de troia da educação. Porto Alegre: Penso, 2013.