POLÍTICAS DE FORMAÇÃO CONTINUADA PARA COORDENADORES PEDAGÓGICOS: A EXPERIENCIA DO PNEGEB/TO
Resumo: O trabalho discute a política de formação continuada para gestores escolares tomando o PNEGEB e a experiência do curso de especialização em coordenação pedagógica no estado do Tocantins. Partimos da análise dos fundamentos dos documentos oficiais de criação do Programa e do curso, cujos objetivos pretendem alcançar a formação efetiva de gestores escolares fornecendo-lhes elementos teórico-práticos. Buscamos explicitar as vozes dos egressos sobre essa formação na perspectiva de compreender se os objetivos estabelecidos têm sido alcançados. Realizamos uma pesquisa bibliográfica e documental, aplicamos questionários aos egressos e utilizamos os procedimentos da análise de conteúdo. Os dados revelam que os objetivos de formação, previstos nos documentos oficiais, têm sido alcançados.
Palavras-chave: Política de formação de gestores escolares; Programa Nacional Escola de Gestores (PNEGEB); Coordenadores Pedagógicos.
PARA INICIAR A DISCUSSÃO
Os profissionais da educação conhecidos por coordenadores pedagógicos (CP) compõe a equipe diretiva das escolas e por meio de um trabalho em conjunto, precisam desenvolver ações que auxiliem as instituições educacionais a lidar com questões de ordem técnica, administrativa e pedagógica tendo em vista contribuir para a melhoria da qualidade da educação a partir dos princípios da gestão democrática.
Dentre as ações que compõem a política de formação de gestores escolares no Brasil, destacamos o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica (PNEGEB), que apoia a criação de cursos de formação continuada para gestores escolares por meio de parcerias com as universidades, secretarias estaduais e municipais. Assim, tomamos a experiência realizada no curso de especialização para coordenadores pedagógicos (CP) no estado do Tocantins como recorte empírico da pesquisa que está sendo desenvolvida no curso de doutorado, na Faculdade de Educação da Universidade de Brasília.
Dessa pesquisa mais ampla, focalizamos neste texto, explicitar as vozes dos egressos sobre a formação desenvolvida nessa especialização, tendo em vista perceber se os objetivos estabelecidos nos documentos oficiais de criação do PNEGEB e do curso estão sendo alcançados. As diretrizes do programa apontam uma pretensão de “formação efetiva de gestores educacionais da escola pública, de modo que disponham de elementos teórico-práticos que viabilizem uma educação escolar básica com qualidade social”. (BRASIL, MEC, 2009, p.6). (grifos nossos).
Realizamos uma pesquisa bibliográfica e documental, aplicamos questionários aos egressos do curso e utilizamos os procedimentos da análise de conteúdo e considerando que esse texto apresenta um recorte da pesquisa ainda em desenvolvimento, nos detemos na análise dos dados coletados sobre a percepção dos egressos em torno das mudanças ocorridas na sua formação e no seu trabalho diário.
Para melhor compreensão, organizamos o texto a partir de três eixos de discussão, tomando as políticas de formação de gestores escolares, pontuando a criação do PNEGEB no Brasil, em seguida desenvolvemos uma reflexão a respeito do CP, suas atribuições e identidade e por fim, demarcamos elementos sobre as percepções dos atores envolvidos no curso de pós-graduação.
POLITICAS DE FORMAÇÃO DE GESTORES ESCOLARES: O PNEGEB EM AÇÃO
O PNEGEB compõe a política de formação de gestores escolares, formulada com a meta de diminuir problemas sociais de formação, considerando as históricas angustias e lutas por formação de qualidade para os profissionais da educação. Diante dessa política nos questionamos se a formação oferecida no curso de especialização em coordenação pedagógica, considerando a experiência desenvolvida no Tocantins, está possibilitando ao profissional fazer questionamentos ao seu próprio trabalho e às suas práticas cotidianas, visando transformá-las em novas ações a partir dos conhecimentos proporcionados pelo curso. Ou se o profissional que se forma acaba dominando apenas conceitos fragmentados, desconectados de seu contexto real de trabalho.
Essa política de formação e, mais especificamente é elaborada num contexto em que a gestão escolar é alvo da necessidade de profissionalização tão exigida pelas diretrizes internacionais, no que refere ao discurso da gestão democrática, da formação em serviço e da educação a distância, em busca da qualidade da educação.
No Brasil, dentre outras ações, o processo de formação de professores/gestores vem sendo fortalecida por ações do Ministério de Educação (MEC) a partir do PNEGEB que inicia suas ações em 2005, sob a coordenação desse ministério e em regime de colaboração com Estados e Municípios. Considerando seus documentos oficiais, tem-se que foi formulado para auxiliar a formação de professores/gestores da educação básica por meio de cursos pautados nos princípios da “gestão democrática, da perspectiva da inclusão social e da emancipação humana”, buscando proporcionar a qualificação dos “gestores das escolas da educação básica pública”. (BRASIL, MEC, 2009, p.4)
Como objetivos gerais, as Diretrizes reafirmam a pretensão de contribuir com a uma perspectiva de formação em busca de alcançar qualidade educacional, “formação efetiva de gestores educacionais da escola pública, de modo que disponham de elementos teórico-práticos que viabilizem uma educação escolar básica com qualidade social”. (p.6). (grifos nossos).
De forma mais específica pretende promover a “institucionalização de uma política de formação nacional de gestores escolares, baseada nos princípios da gestão democrática, tendo por eixo a escola como espaço de inclusão social e da emancipação humana”, de forma que se possa “contribuir para a melhoria dos processos de organização e gestão da escola e [...] para a melhoria da qualidade social inerente ao processo educativo”. (p.7) (grifos nossos).
O PNEGEB compõe o Plano de Metas “Compromisso Todos pela Educação” e integra o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) que fora elaborado tendo em vista os compromissos assumidos em busca de ações para a melhoria da educação básica e do fortalecimento da escola pública. No entanto, esses planos fazem parte de uma agenda internacional de compromissos mundiais estabelecidos a partir dos anos de 1990, e o interesse pela educação não se manifesta no sentido da emancipação e construção histórica dos sujeitos.
Para Mota Junior e Maués (2014, p.1146), as diretrizes internacionais, no âmbito da gestão, se dão por meio das parcerias público-privadas, dos contratos de gestão e da descentralização, do financiamento com a manutenção dos padrões de financiamento como percentual do PIB em educação nas últimas duas décadas e da avaliação (entendida como instrumento de regulação e controle). Com esse tripé da nova regulação educacional na América Latina e no Brasil, é possível identificar as principais transformações operadas na educação brasileira.
POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DE GESTORES: EM FOCO OS COORDENADORES PEDAGÓGICOS
Estamos estudando uma experiência de formação de um tipo de profissional da educação que tem um papel muito importante em todo o sistema educacional. Trata-se do coordenador pedagógico (CP), mas quem ele é? Qual sua função e atribuições? Qual sua identidade no âmbito escolar?
As respostas a essas e tantas outras questões são importantes para compreendemos melhor como esses sujeitos percebem as implicações do curso de especialização em Coordenação Pedagógica na sua formação e no seu trabalho diário. Cabe ressaltar que essas questões representam apenas um ponto de partida, tendo em vista que a compreensão desses sujeitos e sua práxis no dia a dia da escola se constituem a partir de um movimento histórico e social que os transforma em profissionais da educação.
Nesse sentido, numa visão mais ampla entendemos que ele é um sujeito da aprendizagem e do ensino no âmbito da escola e da sala de aula e como tal, é no seu processo de formação e de trabalho que transforma a si mesmo e também o meio em que atua a partir da convivência com outros sujeitos. O CP é um educador antes de tudo e tem seu objeto de trabalho voltado para propiciar as relações pedagógicas necessárias para contribuir com a formação de seres humanos. Dessa forma, o seu produto de trabalho é a produção de seres humanos históricos que também se transformam enquanto sujeitos nas relações de aprendizagem.
Algumas pesquisas têm apontado respostas em torno dos problemas encontrados pelos CP para executarem suas funções. Placo, Almeida e Souza (2012) em investigação sobre esse profissional, desenvolvida em cinco estados brasileiros, apontam dentre outras questões, que é preciso rever a formação inicial deles e defendem que ela seja em curso próprio, partindo da premissa de que a formação do CP deve auxiliar nas tarefas de “articular, formar e transformar”, então sua função é diferente do professor que é “ensinar”. Dessa forma, acreditam que a formação somente para a docência “não garante o desenvolvimento de habilidades e competências para o exercício da coordenação pedagógica”. (p.768).
Vasconcellos (2002) destaca que o coordenador pedagógico/supervisor educacional deve ser um sujeito articulador e mediador do Projeto Político Pedagógico e, portanto tem a função de organizar a “reflexão, a participação e os meios para a concretização”. Suas ações devem auxiliar a que escola também realize sua função social de “propiciar que todos os alunos aprendam e se desenvolvam como seres humanos plenos”. (p.87).
Esse conceito é tomado em sentido positivo em detrimento do que ele chama de “definição negativa” do papel do CP, mostrando elementos que descaracterizam sua função e que ainda está muito presentes nas relações educacionais, o que impede que esse profissional tenha sua identidade afirmada e valorizada. Assim o autor afirma que o CP NÃO é: fiscal de professor; dedo duro; pombo correio; coringa/tarefeiro/quebra galho/salva-vidas; tapa buraco; burocrata; dicário; de gabinete; generalista.
A coordenação pedagógica é, pois, exercida por um educador, e como tal deve estar no combate a tudo aquilo que desumaniza a escola: a reprodução da ideologia dominante, o autoritarismo, o conhecimento desvinculado da realidade, a evasão, a lógica classificatória e excludente (repetência ou aprovação sem aproximação do saber), a discriminação social na e através da escola, etc. (VASCONCELLOS, 2002, p.87).
Nesse sentido, o CP tem um importante papel na escola. Para além de sua formação se iniciar no curso de pedagogia e ser continuada em cursos de pós-graduação, entendemos que ele, sendo um sujeito histórico e social, que se forma e se transforma ao longo de sua ação profissional e humana, deve se reconhecer assim, se afirmar e se impor para desenvolver seu trabalho independente das situações adversas que possa encontrar no espaço escolar.
Miziara (2014) também destaca outro exemplo relacionado aos fatores que prejudicam os CP desenvolver sua função pedagógica, o qual tem a ver com a questão da estrutura educacional imposta pelas politicas neoliberais, sobretudo nos anos de 1990, as quais requerem novas posturas por meio de um trabalho mais flexível, ágil, eficaz e competente. Por isso, chama atenção para que o coordenador pedagógico compreenda essas questões mais amplas de reestruturação do capital e suas exigências para a educação e, consequentemente, para o seu papel na escola, para que, de uma forma mais consciente, possa exercer suas funções.
Nesse sentido, a autora acredita que os CP, especialmente o da escola pública, precisam estar conscientes de que o neoliberalismo é um instrumento da política hegemônica do mundo capitalista, e que essa se encontra a serviço do mercado. Esse fenômeno reforça a ideia de privatização dos sistemas educativos como a solução para as alegações de crise de eficiência, eficácia e produtividade. (p.37).
O contexto social e político vivenciado por profundas mudanças, sobretudo após os anos de 1990, que marcaram o Brasil a partir das orientações internacionais que reconhecem o potencial inovador da educação para fazer frente aos anseios de formação de mão de obra especializada para o mercado produtor, em que a educação é ressaltada como eixo pontencializador para o desenvolvimento econômico e suas múltiplas funções são reconhecidas e valorizadas tendo em vista, mostrar que ela é responsável para manter a ordem civil e para diminuir a pobreza dos países em desenvolvimento.
Dessa forma, ao considerar algumas questões necessárias para haver mudanças nas práticas dos CP tendo em vista esse movimento de reestruturação da educação, as novas demandas para formação dos profissionais da educação, Vasconcellos (2002) aponta que, por resistência, desânimos ou mesmo pela falta de entendimento de seu papel, muitos CP não agem para mudar o que está instituído na escola, apenas age para continuar o que já esta em desenvolvimento.
Não podemos ignorar que as condições adversas são muitas e certamente dificultam um trabalho mais, mas acreditamos que esse profissional ao compreender essa dimensão mais ampla de sua atuação, sobretudo de sua função mediadora, pode se articular com docentes, propor ações, mediarem situações, intervir para prevenir problemas, enfim, pode coordenar pedagogicamente escola em conjunto com outros atores.
Não se trata de um trabalho individualizado, nem competitivo, ou apenas técnico, mas de um trabalho coletivo e humano que é desenvolvido em um processo que demanda tempo de qualidade para convivência, para reflexão, para construção. Nesse sentido, o CP é um sujeito histórico que, precisa transcender a tudo o que existe fora da sua vontade e de sua ação por meio da produção de sua própria existência material, a partir do momento em que “afirma sua vontade, expressa nos valores por ele criados historicamente”, (PARO, 2002), ou seja, a partir de atividades transformadoras pelo seu trabalho, que é feito na convivência com outros sujeitos.
POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DE GESTORES A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO PNEGEB NO TOCANTINS
Tomando como referencia o curso de especialização em Coordenação Pedagógica ofertada no período de 2010 e 2011, destacamos do seu projeto de criação o objetivo geral de contribuir com a formação do CP que atua em instituições públicas de educação básica, visando a “ampliação de suas capacidades de análise e resolução de problemas, elaboração e desenvolvimento de projetos e atividades”. (PPC/UFT, 2010).
Esses objetivos estão em consonância com os objetivos gerais das diretrizes do PNEGEB de contribuir com a formação dos gestores da escola pública por meio da disponibilização de elementos teórico-práticos. A partir desses objetivos e dos estabelecidos nos documentos oficiais de criação do curso de especialização para os profissionais da educação, e em especial para os CP, buscamos evidenciar as percepções dos egressos do curso no Tocantins a respeito da contribuição sobre os elementos teóricos e práticos do curso em suas práticas pedagógicas.
O Projeto Pedagógico do MEC de referencia para a criação do curso de especialização em coordenação pedagógica no âmbito do PNEGEB, destaca que sendo o CP um membro da equipe gestora da escola, ele “desenvolve o importante papel de articulador e integrador dos processos educativos”. (p. 5). Não temos dúvida que esse profissional é muito importante para as relações pedagógicas na escola, na sala de aula e no convívio com a comunidade escolar. No entanto, a partir dessa visão mais discursiva do documento, buscamos entender como o curso proporcionou, ou não, elementos teóricos e práticos para a formação dos CP, de modo que em seu trabalho, possam desenvolver a articulação e a integração nos processos educativos.
Esses princípios emanados dos documentos oficiais são também esperados por educadores que ao longo da história da educação no Brasil tem lutado em busca de formação adequada para os profissionais da educação, assim como também é o anseio dos próprios egressos do curso pesquisado, que por sua vez, declararam, na grande maioria, que o curso os ajudou para o repensar de suas práticas, de sua identidade e no auxilio de instrumentos para o fortalecimento da educação inclusiva e da gestão democrática, destacando que no trabalho diário passaram a desenvolver ações mais democráticas e participativas.
Sabemos que construir um ambiente democrático não é tarefa fácil, mas é indispensável nas atribuições do CP, tendo em vista que ele é um mediador das relações pedagógicas na escola e fora dela. Essas relações, contrárias ao posicionamento autoritário e coercitivo do poder, devem ser alcançadas por meio do diálogo, da persuasão, do saber ouvir, do respeito ao próximo, do incentivo à participação e do debate, num movimento de aprendizagem e formação continua e compromissada com a formação humana.
O curso foi desenvolvido por meio da metodologia do ensino a distância, mediado por Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDICs), utilizando como ambiente virtual de aprendizagem o Moodle. No estado de Tocantins, representou a primeira experiência de formação continuada para coordenadores pedagógicos no âmbito do PNEGEB, que dentre os princípios norteadores das atividades formativas, destaca-se a gestão democrática das unidades escolares, que se apresenta como uma das dimensões que deve contribuir de forma significativa para viabilizar o direito à educação como um direito universal. (BRASIL, PPP/MEC, 2009).
Considerando as análises dos questionários aplicados aos egressos do curso, evidenciamos um perfil predominantemente feminino, o que reflete uma característica histórica da profissão de professores e gestores em nosso país. A maioria possui idade ente 30 a 50 anos e a maioria cursou a graduação em pedagogia ou fizeram o curso normal superior.
Após quatro anos de realização do curso de especialização, pelo menos a metade dos egressos afirmou estar atuando na função de CP nas escolas públicas do Tocantins. Os outros respondentes destacaram que atuam na função de professores, diretores ou vice e em outras funções como a de Técnico da Educação, Orientador Educacional, Assistente Administrativo e Coordenador de Apoio.
Comparando esses dados com a função profissional exercida durante a realização do curso, nota-se que a quantidade que atuava na função de CP era bem maior, sendo mais de 75%, o que indica que a condição de formação especifica na área não revela a manutenção na função ou até mesmo o ingresso nela, pois se trata de uma função em que há rotatividade de profissionais e também porque como destaca alguns egressos, ela depende de indicações políticas internas ou externas à escola.
Ao indagarmos sobre como eles assumem a função de coordenação pedagógica, mais da metade afirmou ser por meio da prática de indicação, seja pela escola ou pela Diretoria Regional de Ensino. O restante dos egressos apontaram outras formas como, por exemplo, as práticas meio de concurso, modulação por graduação, processo seletivo ou nomeação.
Mesmo considerando que as unidades escolares em suas diferentes regiões brasileiras tem autonomia para definir as atribuições dos profissionais para a função de coordenador pedagógico, e até mesmo de dar-lhes outros nomes que não seja esse, elas precisão adotar a premissa legal de que, o profissional da educação CP, seja formado no curso de pedagogia, como condição inicial para assumir essa função e também, ter formação continuada por meio de cursos de pós-graduação. (BRASIL, DCN/CP, 2006).
É reconhecido que todo profissional da educação que tenha uma formação mais ampla na pedagogia, possa atuar “na gestão de processos educativos e na organização e funcionamento de sistemas e instituições de ensino”. (BRASIL, DCN/CP, 2006). Nesse sentido, parece coerente que os egressos se mostrem insatisfeitos com as práticas de indicação política para a função, na qual não se considera esses preceitos legais e em algumas escolas do Tocantins, assumem a função profissionais aqueles que não tem nem a formação inicial em pedagogia, nem mesmo realizaram curso de formação continuada ao nível da pós graduação.
Esses elementos ficam perceptíveis pelo registro de alguns egressos na opção “outros” do questionário, em que eles tinham liberdade para escrever comentários. Destaca um egresso: “Uma pena que não exerço a função de coordenador. Na minha cidade o cargo de coordenador está sendo sucateado por políticos”. (EG1). Outro egresso também sinaliza essa questão quando indagado sobre como se torna CP, o EG2 registra: “Através de indicação política. A formação não é um critério. Na minha escola, por exemplo, um professor de área deixa a sala de aula a qualquer momento e se torna coordenador, por intermédio de indicação”. (EG2).
Sobre os motivos que levaram os egressos a realizar o curso, mais da metade associaram a resposta à busca por melhorias na formação e os outros destacaram que o motivo estava ligado tanto pela busca de melhorias na formação, quanto também pela questão de aumento salarial. Quase 90% pontuaram que o curso supriu as deficiências que tiveram na formação inicial e aproximadamente a mesma quantidade de egressos destacaram que o curso respondeu às suas necessidades e anseios de formação continuada em relação à coordenação pedagógica.
Como destacamos no tópico anterior, algumas pesquisas mostram que a formação inicial apenas na docência não tem proporcionado aos profissionais da educação todos os elementos necessários para desenvolverem suas funções e isso também fica perceptível na visão dos egressos. Assim, eles acreditam que o curso de formação em serviço os ajudou, suprindo suas deficiências.
Retomando o discurso do MEC no texto do PPP do curso, sobre o reconhecimento da importância da formação do coordenador pedagógico para o fortalecimento da educação inclusiva e da gestão democrática para a educação pública no Brasil, temos que também são discursos utilizados para justificar a criação de cursos de pós-graduação lato sensu para formação de professores/coordenadores pedagógicos.
Tomando como referencia os objetivos desses documentos, de auxiliar a formação dos profissionais da educação oferecendo-lhes elementos teóricos e práticos para que esses possam proporcionar que a escola seja mais democrática e inclusiva, solicitamos que os egressos refletissem se o curso desenvolvido forneceu esses elementos e especificamos algumas afirmações no sentido deles compreenderem como esses elementos os auxiliaram, ou não, na formação e em suas práticas diárias.
Na opinião dos egressos houve concordância de 100% deles em considerar que o curso colaborou para proporcionar-lhes os fundamentos teórico-práticos necessários sobre o fortalecimento da educação inclusiva e da gestão democrática. Como todos os participantes confirmaram que houve colaboração, de forma mais específica, alguns destacaram que o curso forneceu elementos que os auxiliaram no planejamento de suas ações na escola e outros apontaram que o curso os ensinou a manusear novas ferramentas e metodologias de trabalho. Outros ainda destacaram que embora o curso tenha sido muito teórico, eles conseguem aplicar o conteúdo em sua prática de trabalho e consideram que esse conteúdo se aplica à realidade de suas escolas no Tocantins.
Sobre a frequência com que os egressos utilizam os conhecimentos adquiridos no curso, mais da metade afirmou que usam sempre e os outros respondentes ponderaram que usam os conteúdos "quase sempre" ou "eventualmente”. Nenhum egresso apontou a opção "quase nunca" ou "nunca". Isso implica em considerar que a formação forneceu conhecimentos que estão sendo úteis ao trabalho pedagógico dos profissionais.
Sobre as mudanças percebidas na formação e na prática profissional, os egressos afirmam que passaram a repensar o seu papel, a compreender melhor suas funções, valorizando sua identidade profissional. 98% reconhecem e passaram a perceber melhor que seu papel pode representar contribuições importantes ao trabalho da equipe gestora da escola.
Essas mudanças de posições certamente contribuem para a construção e afirmação da identidade do profissional da coordenação pedagógica. Nesse sentido, a identidade de qualquer profissional se constrói cotidianamente e no conjunto das relações, no exercício de sua função a partir das necessidades concretas do dia a dia da escola, em convivência com outros sujeitos, mas que se transforma a partir de um objeto comum de educação, exigindo planejamento, organização e utilização de meios adequados para se alcançar os fins desejados.
A identidade se constrói na ação e na reflexão das ações, em meio aos relacionamentos, as trocas e vivências com os professores, diretores, orientadores, alunos, pais e tantos outros colaboradores da escola. Vale reafirmar novamente que é nesse processo que ocorre a formação e a transformação do CP e dos outros sujeitos envolvidos.
A maioria dos egressos também afirmou que houve mudanças em suas práticas pedagógicas, somando mais de 80% em todas as afirmativas propostas para a reflexão. Quando perguntamos se eles conseguem organizar seu trabalho de forma mais eficiente e prazerosa, quase 90% afirmaram que sim, com destaque para 8,5% que ficaram indiferentes e 1% que discordou. Assim, quase todos os egressos também percebem que suas ações estão ajudando na melhoria da qualidade da escola, sendo que apenas 2% não quiseram opinar.
Quando questionados sobre a melhora nos relacionamentos internos, a maioria também confirma que o curso tenha auxiliado para que pudessem melhorar esse fator de convivência na escola. Mais de 95% percebem melhoras no relacionamento com os professores e funcionários e quase 93% apontam melhoras nos relacionamentos com os alunos. As vozes dos egressos são expressivas, pois mais de 97% concordam que o curso os ajudou a propor soluções para problemas práticos e pedagógicos na escola, sendo que os outros respondentes ficaram indiferentes ou discordaram.
Tendo em vista os objetivos de formação propostos nos documentos e as vozes dos egressos, os quais passaram a reconhecer-se no processo de formação, é possível compreender que eles podem ser mediadores do processo pedagógico, como aponta Vasconcellos (2002), que a mediação é um fator determinante nas práticas desse profissional para auxiliar o seu trabalho pedagógico e o trabalho pedagógico do professor em sala de aula, cuja tarefa de ensinar precisa estar conectada também com o ensinar para a formação humana.
A mediação pode ocorrer também, de acordo com o autor, nas ações do CP com o trabalho da própria administração escolar no sentido de fazê-la entender qual seja o objetivo e a função social da escola, assim como desenvolver também mediações das relações com a comunidade, num processo continuo de aprendizagem. “É possível afirmar, portanto, que a especificidade da atuação da coordenação pedagógica são os processos de aprendizagem, onde quer que ocorram”. (p.90).
Nesse sentido, tomando o CP como um sujeito que faz parte da administração escolar, portanto que é membro da equipe diretiva, concordamos com Vasconcellos (2002) e Paro (2002), que esse profissional tem um caráter mediador das relações pedagógicas e administrativas e, portanto não pode se restringir a um papel de controle do trabalho alheio, mas sim ser um agente democrático para desenvolver ações também democráticas.
Paro (2002) ao abordar sobre o conceito mais amplo de administração escolar ressalta que ela trata da “utilização racional de recursos para a realização de determinados fins”. Assim, como o coordenador pedagógico lida também com as relações sociais, o autor destaca que “não é possível alcançar fins promotores da democracia e da afirmação de sujeitos históricos” que não sejam também os democráticos. (p.17).
PARA NÃO ENCERRAR A DISCUSSÃO – APONTAMENTOS FINAIS
Cientes de que apontamos alguns elementos para reflexão sobre a formação de gestores escolares, no que tange à formação para coordenadores pedagógicos em curso de especialização lato sensu e que se faz necessário aprofundar essa discussão, pontuamos que, de uma forma geral, as percepções dos egressos do curso na experiência de formação desenvolvida no estado do Tocantins, são positivas e revelam que, em certa medida, os objetivos propostos nos documentos oficiais foram alcançados.
Como analisamos uma experiência pontual de formação no âmbito do PNEGEB, não podemos afirmar que essas percepções representam as visões de outros participantes em outras experiências ao longo do Brasil. No entanto, podemos compreender que, pelas vozes expressas, o curso pode ter representado uma resposta contra hegemônica aos ideais que influenciaram a concepção das políticas de formação por meio de melhoria da educação continuada de professores/gestores, ao contrário da tônica atual que é pelas vias da formação para o mercado.
Fica evidenciado que a formação continuada dos coordenadores pedagógicos forneceu-lhes elementos teóricos e práticos para que em suas ações diárias possam contribuir com o fortalecimento das práticas de gestão democrática na escola. No entanto, é preciso estar atentos sob que condições essas práticas têm sido desenvolvidas, pois as mesmas vozes apontam que, embora tenham tido uma oportunidade de formação, declaram que não podem desenvolver e aplicar o aprendizado, pois alguns nem mesmo chegaram a assumir a função de CP, como fica evidenciado nos relatos de alguns egressos que se manifestaram na opção “outros” do questionário.
EG 3 - Foi uns dos melhores cursos que fiz, porém continuo na coordenação de convênios na SME. Assim, ainda não foi possível realizar um trabalho como Coord. Pedagógica.
EG 4 - O Curso foi ótimo, mas a SEDUC não garantiu ate hoje nossos salários como coordenadoras, recebemos como professor diferentemente de outros Estados, mas na pratica estamos utilizando muita coisa.
EG 5 - O fato é que não temos estímulo nenhum em fazer uma pós graduação. Por nada. Sou uma professora que amo meu trabalho, mas como muitos outros, desacreditada com os rumos que a educação tem tomado.
Certamente essas vozes e outras percepções não reveladas, demonstram a necessidade de se continuar os estudos sobre a formação em serviço proporcionada aos coordenadores pedagógicos e para além dela, desvendar os reais interesses das políticas de formação dos gestores escolares, tendo em vista que o PNEGEB compõe o Plano de Metas “Compromisso Todos pela Educação” e integra o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).
Dourado (2007) lembra que o PDE é um dos programas centrais na área da gestão que compõe o Fundo de Fortalecimento da Escola (FUNDESCOLA). Desde sua origem, o PDE busca conformar o ideal de melhoria educacional associado aos parâmetros de mercado, de autonomia restrita e ao caráter diretivo e centralizador, tendo em vista a ressignificação do conceito de gestão democrática e da participação por meio de mecanismos e instrumentos coletivos nas escolas.
O autor aponta também o distanciamento dos ideais do PDE com os marcos legais sobre os princípios da gestão democrática e ainda sobre as próprias ações do FUNDESCOLA com o PDE, quando a gestão dele passa para o FNDE, ocorrendo “sobreposição de ações e planos e programas com concepções político-pedagógicas distintas no âmbito do governo federal”. (p.932). Dessa forma, ressalta que o PDE tem “foco e ação político-pedagógica baseados em concepção gerencial”.
Nesse sentido, é preciso questionar até que ponto o PNEGEB representa apenas uma resposta a esses ideais por melhoria da educação pelas vias de mercado, ou se de fato, ele tem contribuído para a formação de profissionais que podem contribuir com a gestão democrática da escola, pois sabemos que essas políticas têm recebido influencias dos OIs. Silva Jr. (2002) destaca que esses agentes passam a representar as possibilidades de sedimentação e consolidação da nova ordem emergente, na qual vai ganhando terreno o neoliberalismo, que requer um Estado que se configura por um modelo cujas intervenções passam a ser mínimas para as questões sociais e máximas para as questões de mercado.
Nessa visão, a educação passa a ser compreendida como um papel estratégico, pois por meio dela é possível formar e preparar indivíduos aptos aos interesses capitalistas de produção (AZEVEDO, 2001). Assim, os documentos dos OIs defendem ideologicamente um tipo de educação, não no sentido amplo de formação para a cidadania, de emancipação dos sujeitos, de contribuição com a sociedade, mas apoiam-se numa visão restrita quando propõe que ela seja o instrumento de resolução de todos os problemas sociais.
Trata-se de uma visão que está diretamente ligada aos interesses da teoria do capital humano, na qual importa que os indivíduos, considerados como recursos humanos, se qualifiquem, obtenham competências técnicas e habilidades necessárias para desenvolver com presteza, eficiência e rapidez os exercícios de sua profissão.
Muitos documentos dessas agencias internacionais enfatizam que todas as pessoas devem ter direito de acesso aos conteúdos mínimos, ou seja, conhecimentos básicos e considerados necessários para a obtenção de profissionais com competências especificas e adequadas às vagas de emprego, para que possam aumentar os rendimentos econômicos.
Estudo de Vieira e Moraes (2014) sobre as políticas de formação de professores e a educação a distância mostra que vários programas e ações dos governos brasileiros, sobretudo após os anos de 1990, orientam-se pelas diretrizes do Banco Mundial e “não considera o professor como insumo mais importante em sala de aula, colocando, antes dele, a biblioteca, os livros didáticos, entre outros” (p.386).
Não temos dúvidas de que a proposição do PNEGEB busca atender a uma determinação legal, que por sua vez é resposta também que surge dos anseios de muitos educadores por uma formação continuada para os profissionais da educação. No entanto, como ressalta Paro (2002) é preciso estar atentos sob que condições têm sido desenvolvidas tais determinações.
REFERÊNCIAS
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Universidade Federal do Tocantins. Projeto Político Pedagógico do Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica. Palmas, UFT, 2009.