AS POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DOCENTE: O PIBID E SUAS INTERFACES COM O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NO CURSO DE PEDAGOGIA

Resumo: Esse artigo apresenta o resultado de um estudo sobre as políticas de formação docente. Investiga o desenvolvimento do Pibid e do estágio supervisionado no curso de Pedagogia. Esse estudo de caso qualitativo  envolveu uma IES e uma escola pública, ambas no DF. As técnicas utilizadas foram  entrevistas, grupo focal, aplicação de questionário e a interpretação se deu à luz da análise de conteúdo. Estudantes, gestoras e professoras compreendem o público investigado. O estudo revelou que Pibid e o estágio são forças propulsoras no processo de formação docente. Revelou também que Pibid é uma política restritiva e o estágio não atende às necessidades atuais do curso. Esses fatores agravam e fragilizam o processo de formação do pedagogo.

Palavras-Chave: Curso de Pedagogia; Estágio; Pibid.


INTRODUÇÃO

O processo de formação inicial e continuada de professores para atuação na educação básica está na pauta dos debates atuais, sendo constante objeto de estudo por se tratar de um assunto crucial frente às demandas da educação na sociedade contemporânea. No Brasil, esse debate se intensificou, principalmente nas últimas duas décadas em decorrência das reformas políticas, sociais e educacionais.

Nesse cenário amplia-se também o debate sobre o acesso à educação, estratégica para o acesso aos saberes historicamente construídos, com vistas ao desenvolvimento social. Todavia, os processos de escolarização dos indivíduos requerem profissionais que atendam às demandas da sociedade e nesse sentido, os debates voltam-se para a formação dos profissionais que irão atuar na educação básica, etapa que fundamenta todo o processo de escolarização.

Apesar da descrença e da desvalorização pela qual essa profissão vem sendo vista pela sociedade, cresce o número de indivíduos que buscam os cursos de licenciatura. No entanto assistimos atualmente ao descaso das autoridades políticas frente ao processo de formação docente, principalmente no que diz respeito à formação inicial. É nesse período que devem ser firmadas e fortalecidas as bases para a formação desses profissionais.

Nesse contexto que se faz necessário discutir sobre o processo de formação  no curso de Pedagogia, sobre o estágio supervisionado e suas interfaces com o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid), que visa a formação inicial e a valorização docente. Este programa é uma ação federal, institucionalizada pelo Decreto n. 7.219/10 (BRASIL, 2010), implementado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e desenvolvido por meio de projetos institucionais organizados por universidades e institutos de ensino superior.

Esse artigo apresenta a análise dos dados referentes a um estudo que teve por objetivo, dentre outros, evidenciar o processo de formação inicial docente no curso de Pedagogia. O estudo buscou evidenciar quais são as percepções de estudantes bolsistas e não bolsistas do Pibid, professores e gestores da IES e da escola pública, sobre o processo de formação inicial do pedagogo no âmbito do Pibid e do estágio supervisionado. Nessa direção, esse artigo está estruturado em três  tópicos. O primeiro discute o curso de Pedagogia na base docente; o segundo discute o Pibid e suas interfaces com o estágio supervisionado;  e o terceiro apresenta a análise das percepções dos estudantes, professores e gestores da IES e da escola pública sobre as interfaces entre o Pibid e o estágio supervisionado.

AS POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DO PEDAGOGO NA BASE DOCENTE: MARCOS LEGAIS E PROCESSO IDENTITÁRIO DO CURSO

A formação do pedagogo na base docente para atuação na educação básica vem sendo foco dos debates diante das políticas de formação e de valorização do magistério. As conquistas resultantes das lutas pelos direitos sociais ocorridas nas últimas duas décadas evidenciam a necessidade de uma educação comprometida com a emancipação dos indivíduos. Essa emancipação diz respeito a uma formação crítica e reflexiva, voltada para o atendimento às demandas sociais, ao direito,  à cidadania,  aos avanços científicos e tecnológicos. 

No entanto, a profissão docente está passando por tempos difíceis, de desprestígio social, de salários aviltantes, com péssimas condições de trabalho, o que vem comprometendo a atratividade e a permanência na carreira. Diante dessa realidade é preciso que haja uma política com claros objetivos de interferir a fundo em questões estruturais, sobre as condições de trabalho, salários, plano de carreira e o mal-estar que o professor tem experimentado na atualidade (LIBÂNEO, OLIVEIRA e TOSCHI, 2012).

No âmbito das políticas voltadas para a formação inicial e continuada de professores o foco dos debates sinalizam para a questão da qualidade dessa formação e da necessidade de valorização do profissional do magistério. Esses temas estão presentes na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei 9.394/1996 (BRASIL, 1996), no Parecer CNE/CP 2/2015, de 9 de junho de 2015, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação básica Em substituição ao Parecer n. 9/2001 do Conselho Nacional da Educação/ Conselho Pleno (CNE/CP) (BRASIL, 2001).. E ainda se fazem presentes também nas metas 15 a 18, do Plano Nacional de Educação (PNE) - 2014/2024 (BRASIL,2014).

Considerando a importância dessas políticas frente aos desafios pertinentes à formação docente, faz-se importante discutir as ações que vêm sendo implementadas, com vistas à melhoria da qualidade da educação no Brasil. Essas ações devem estar em consonância com os objetivos e finalidades da educação, conforme também previsto na Resolução CNE 01, de 15 de maio de 2006, que dispõe sobre as Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia.

Dentre outras orientações, esse documento extingue as habilitações do curso de Pedagogia, transformando o curso em licenciatura, integrando a docência à participação na gestão e organização institucional escolar. O sentido da docência é ampliado, articulado à ideia de trabalho pedagógico, a ser desenvolvido em espaços escolares e não escolares. Dessa forma, a docência constitui-se na confluência de conhecimentos oriundos de diferentes tradições culturais e das ciências, bem como de valores, posturas e atitudes éticas, de manifestações estéticas, lúdicas, laborais (BRASIL, 2006).

Nessa direção, Aguiar et al. (2006) nos diz que:

Sob essa perspectiva o trabalho docente e a docência implicam uma articulação com o contexto mais amplo, com os processos pedagógicos e os espaços educativos em que se desenvolvem, assim como desmandam a capacidade de reflexão crítica da realidade em que se situam. Com efeito, as práticas educativas definem-se e realizam-se mediadas pelas relações socioculturais, políticas e econômicas do contexto em que se constroem (p.12). 

As autoras consideram que o trabalho docente deve ser visto de forma articulada para que haja uma visão mais ampla sobre os processos pedagógicos. Essa articulação, segundo Tardif (2014), faz dos professores um grupo social e profissional cuja existência depende, em grande parte, de sua capacidade de interação e de domínio desses saberes, como condição para a sua prática. Nessa linha, é preciso compreender o sentido da docência e suas

Estudo de Libâneo (2010) destaca que a docência, como base na identidade profissional do educador, é ainda um dilema frente às questões referentes ao campo de estudo da Pedagogia e da identidade profissional e da formação do pedagogo. O autor diz ainda que tem sido difícil obter consenso por parte das organizações científicas e profissionais de educadores frente a esse tema.

Na visão de Pimenta (1999), a docência vai além da atividade burocrática para a qual formam-se técnicos. Considera necessário que haja apropriação dos conhecimentos da didática e da teoria da educação e que desenvolvam a capacidade crítica sobre os seus saberes e fazeres de docentes, num processo contínuo de construção de suas identidades como professores. Para a autora, a Pedagogia é uma ciência da educação e que a docência é uma das modalidades de inserção profissional do pedagogo, enfatizando que "[...] a pedagogia é a base da formação e da atuação do professor" (PIMENTA, 2004, p. 2).  

Rodrigues e Kuenzer (2007) contribuem para esse debate quando afirmam que as DCNs da Pedagogia ampliam demasiadamente a concepção de ação docente, pois abrange a participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, a produção e a difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional em contextos escolares e não escolares. Na visão dessas autoras, essa amplitude de ações remetidas ao curso de Pedagogia, resulta na descaracterização do curso.

Cruz (2008) corrobora essas ideias, ao afirmar que a concepção de docência ampliada, concebida articuladamente à gestão e à produção de conhecimento, parece não ser suficiente para favorecer a formação de um profissional que será ao mesmo tempo professor e pedagogo ou pedagogo porque é professor. Dessa forma, o problema da especificidade do curso permanece.

Diante dessas questões, verificam-se que as mudanças relativas à concepção do curso de Pedagogia trazem ainda muitos conflitos e desafios a serem superados frente às necessidades da sociedade brasileira. Assim, se por um lado o movimento dos educadores propôs a criação de outra concepção do Pedagogo, como forma de superar a formação dualista para o magistério, assim como assegura Castro (2007), por outro lado as DCNs para o curso de Pedagogia instituem a docência no sentido ampliado, o que faz aumentar os dilemas frente à formação do pedagogo.

Esses dilemas se fazem presentes também no contexto das políticas de valorização e formação inicial dos docentes que atuarão na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental. O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência -  Pibid,  vem à tona como um importante interlocutor entre a IES e a escola pública. Nessa direção, faz-se importante  evidenciar quais são as interlocuções possíveis entre esse programa e o estágio supervisionado no contexto do processo de formação inicial docente.

O PIBID E O ESTÁGIO SUPERVISIONADO: INTERFACES NO PROCESSO DE FORMAÇÃO INICIAL DOCENTE

A implementação do Pibid tem fomentado reflexões sobre o processo de formação docente e essas reflexões sistematizam-se por meio de estudos, de pesquisas, relatórios. Esses estudos configuram-se como importantes referências sobre o desenvolvimento desse programa no âmbito das IES, dos cursos de licenciaturas e das escolas públicas. Destacam-se a seguir alguns desses estudos, com vistas à ampliação dos saberes acerca do processo de desenvolvimento do Pibid nas instituições brasileiras.

O estudo de Canan (2012) e André (2012) aponta que um dos grandes diferenciais do programa é a concessão de bolsas, não somente aos alunos e professores das IES, mas também a professores das escolas públicas que acompanham as atividades do bolsista no espaço escolar. O incentivo financeiro somado às possibilidades de desenvolver práticas docentes no processo de formação do licenciando, tem-se revelado importante nesse processo.

Para Destro et al. (2012) o Pibid apresenta-se com um duplo objetivo:  integrar-se a um conjunto de ações que visam à formação inicial e à permanência na docência junto aos estudantes de licenciaturas e contribuir para a elevação dos processos de aprendizagem. Assim, para atendimento a esses objetivos do Pibid, destacando-se os voltados à formação em docência e à articulação das universidades com as redes públicas, torna-se necessário promover, no espaço acadêmico, a profissionalização do docente. Essa profissionalização deve estar em consonância com o Parecer CNE/CP 009/2001, na perspectiva de que essa formação seja agente crítica da tradicional visão do professor (DESTRO et al., 2012).

Todavia, há também estudos que apontam críticas a esse programa e essas críticas precisam ser consideradas para que esse programa possa contribuir para o fortalecimento dos cursos de licenciatura. Tais críticas dizem respeito aos processos pertinentes ao desenvolvimento do Pibid e reacendem os debates sobre as políticas de formação inicial docente, conforme veremos a seguir. 

Soczek (2013) apresenta pontos que sinalizam algumas limitações do programa, as quais merecem atenção. O mesmo esclarece que essas ponderações não obedecem a uma ordem hierárquica, mas que têm por objetivo despertar reflexões acerca do desenvolvimento do Pibid no âmbito dos cursos de licenciatura.

A primeira diz respeito ao relacionamento entre graduandos e a Escola. Problemas ocorrem em relação à identidade e ao papel do bolsista, pois que, segundo o autor, os bolsistas confundem essa atividade com o estágio curricular obrigatório. Além disso, em algumas circunstâncias, esses graduandos são vistos como 'recurso humano disponível' no suprimento da falta pontual de professores.

Na visão de Moura (2013) o Pibid configura-se como uma investida para assegurar que os ingressantes nos cursos de licenciatura possam, pelo menos, chegar ao final do curso e concluir a graduação, sendo esse o requisito mínimo para o ingresso na carreira de docente. No entanto, o incentivo à docência pode se converter em uma permanência de sujeitos nos cursos de licenciatura somente pelo incentivo financeiro, e não pela atração em relação à carreira, pois não basta esse incentivo na formação inicial se a carreira não é atraente. 

O estudo realizado por Gatti et al. (2014) evidencia que há um número razoável de pesquisas sobre o programa Pibid, sendo a maioria estudos de caso de caráter local, com foco qualitativo. Esses estudos podem oferecer uma visão mais ampla sobre os efeitos do Pibid na formação inicial de docentes, pois enfatizam, de forma geral, os aspectos positivos do programa. Essa pesquisa ressalta a necessidade de prosseguir nesses estudos com vistas à ampliação das fontes de revisão e aprofundando as análises dos estudos disponíveis. 

Nesse cenário, é salutar também discutir sobre o Pibid e o estágio supervisionado, uma vez que esse último também pressupõe atividades pedagógicas efetivadas em um ambiente de trabalho, com a mediação de um professor supervisor acadêmico. Ambos conferem ao licenciando condições para que se forme como autor de

Estudo de Jardilino (2014) sobre o estágio supervisionado e o Pibid,  apresenta uma ambigüidade nessa relação. Essa ambigüidade diz respeito à concessão de bolsas para os participantes do Pibid, para os coordenadores de área e o professor supervisor, e a não concessão de bolsa para os estagiários dos cursos de licenciatura, para os professores que ministram a disciplina e o professor que atua com os estudantes nas escolas. Segundo o autor, essa dualidade pode fazer com que professores da escola básica recusem-se a receber estagiários, sob alegação de que estão sobrecarregados com os bolsistas e as atividades do Pibid. Diante desse embate,

os estagiários, por sua vez, reclamam que não são bem recebidos na escola pelos gestores e professores, fato que não ocorre com os bolsistas do PIBID. Os bolsistas possuem condições e recursos financeiros para desenvolver atividades extras na escola, enquanto os estagiários tentam realizar tarefas que demandam baixo ou nenhum custo. Os estagiários, que também são bolsistas do programa, pleiteiam que o estágio possa ser substituído ou reduzido pelo PIBID (JARDILINO, 2014, p. 361)

No entanto, ainda segundo Jardilino (2014), o Pibid e o estágio estão separados por legislações e financiamentos que estabelecem que os alunos em formação inicial, participantes do Pibid, também devem proceder ao estágio, independentemente dos objetivos que aproximam esses projetos de formação. O estágio refere-se ao cumprimento de um componente curricular, enquanto o Pibid é um programa de formação que se agrega aos cursos de licenciatura. Essa distinção permite a afirmação de que o estágio supervisionado não deve ser substituído pelo Pibid, pois o que deve prevalecer é a ideia do compartilhamento de estratégias e de propósitos, não a da exclusão.

Além disso, surge também a ideia de complementaridade entre Pibid e estágio, no que diz respeito à melhoria da educação na escola básica: os alunos do ensino regular têm a oportunidade de participar, tanto nas atividades de estágio, quanto nas atividades oferecidas pelo Pibid. Dessa forma, os professores da escola passam por uma formação continuada ao acompanhar estagiários e bolsistas e essa troca de saberes pedagógicos ocorre na relação entre professores, estagiários e bolsistas.

CAMINHOS METODOLÓGICOS

Esse estudo foi desenvolvido na perspectiva do método científico de abordagem qualitativa, com o subsídio de dados quantitativos para a coleta de dados sobre os processos pertinentes ao desenvolvimento do Pibid. Essa abordagem configurou-se como uma opção para esse estudo por possibilitar o aprofundamento sobre os aspectos ligados aos objetivos definidos para essa pesquisa, com ênfase à indissociabilidade entre os indivíduos pesquisados e a realidade em que estão inseridos Estudantes bolsistas: 5 entrevistas semiestruturadas, 20 questionários distribuídos, com 8 devoluções, 8 participantes no grupo focal. Estudantes não bolsistas: 5 entrevistas semiestruturadas. Gestoras da IES: 2. Gestora da escola pública(1). Professoras supervisoras do Pibid (2). . Como estratégia optou-se pelo Estudo de Caso. Segundo Lüdke e André (1986), essa estratégia permite que o estudo se desenvolva numa situação natural, sendo rica em dados descritivos,  além de focalizar a realidade de forma complexa e contextualizada. A análise dos dados foi feita com base na análise de conteúdo.

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

O estudo revelou que a possibilidade de maior contato com os processos pedagógicos na escola de educação básica é imprescindível no processo de formação inicial docente. Nesse sentido, as estudantes bolsistas se referem ao Pibid como um importante articulador entre a IES e a escola pública.  Com uma carga horária ampliada em relação ao estágio supervisionado, o Pibid promove experiências mais significativas e  proporciona mais segurança e conhecimento sobre a realidade da comunidade em que a escola está inserida.

As estudantes não bolsistas, ao serem indagadas sobre essa questão, referiram-se ao estágio supervisionado como a única experiência que vivenciaram no processo formativo. Dentre as cinco entrevistadas, quatro disseram que gostariam de terem sido bolsistas do Pibid, mas devido ao horário de trabalho não puderam participar do programa. Uma estudante faz menção ao curso de magistério, no qual teve a oportunidade de concluir alguns anos antes de ingressar na graduação. Segundo a estudante, a carga horária destinada ao estágio era superior à carga prevista no curso de graduação. Os depoimentos abaixo das estudantes 2 e 4 ilustram essas inquietações:

[...] os estágios eram feitos o ano inteiro com a professora e a avaliadora em sala (...) aqui no ensino superior eu me senti meio solta, apesar de que reconheço que não consegui acompanhar tudo, por falta de tempo, pois eu trabalho e estudo (Estudante não Bolsista 2).

Fiz o estágio numa escola particular (...) lá os professores e os diretores te prendem um pouco, eles querem que você assine papel (...) você não passa pela experiência de elaborar um plano de aula, não pode explorar (...) (Estudante não Bolsista 4).

Esses relatos contribuem para a discussão sobre a origem das críticas que recaem sobre os processos que envolvem o estágio curricular obrigatório no curso de Pedagogia.  Essas argumentações explicitam o quanto essa atividade é importante para o processo de formação docente, mas que precisa maior atenção sobre a forma como está sendo desenvolvido como conteúdo curricular.

O estágio é importante sim, mas é muito limitado. Às vezes a gente fica com vontade de fazer algumas coisas, mas você não tem liberdade, tem que fazer o que os professores mandam e isso acaba dificultando o trabalho do estagiário (Estudante não bolsista 1).

O estágio curricular é compreendido como um espaço de construção coletiva, de estruturação e de sistematização de saberes, de articulação entre teoria e prática, de aprofundamento nas relações interpessoais no âmbito da realidade escolar. Nesse sentido, esse componente curricular precisa ser encarado com responsabilidade e compromisso, tanto por parte do estudante, quanto por parte das instituições que recebem esses estudantes.

Conforme relato da estudante não bolsista 1, o estágio foi o único espaço para a efetivação dessa construção.

Para a estudante bolsista 4, o diferencial do Pibid em relação ao estágio está na autonomia. A estudante relata que no Pibid as ações são compartilhadas e isso resulta em maior interação com as professoras supervisoras, e isso favorece o processo de autonomia dos licenciandos. Na visão da estudante, a atuação no estágio é mais restrita ao processo de observação e regência.

Os relatos das gestoras também sinalizam sobre a importância de se refletir sobre como o estágio supervisionado está sendo desenvolvido no âmbito do curso de Pedagogia. Além disso, chamam a atenção para a importância do acompanhamento sistemático sobre esse conteúdo curricular, tanto por parte da IES como das instituições que oferecem esse espaço de formação. É possível também perceber nesses relatos como o Pibid está articulado a esse conteúdo curricular:

O aluno do Pibid tem uma coordenação informando sobre os processos e no estágio não, o aluno fica solto, na maioria das vezes só em observação, não convive com a realidade, ao contrário do aluno do Pibid que vai para a escola pública e adquire experiência (Gestora IES 2).

[...] a professora da escola, responsável por receber uma estagiária falou: minha filha, o que você está fazendo aqui? Que estágio? Vai pra casa e me dá essa folha aqui que eu assino [...] (Gestora IES 2).

Esses relatos apontam questões que permeiam o processo de estágio supervisionado também sob o ponto de vista ético que envolve os atores responsáveis pelo processo de formação do pedagogo. Além disso, sinalizam que, tanto as IES quanto as escolas responsáveis pela acolhida dos licenciandos, precisam assumir uma postura ética, responsável e compromissada com o processo de formação docente

Por outro lado, verificou-se que é necessário que haja maior envolvimento e compromisso por parte dos licenciandos, conforme nos diz a professora supervisora 1:

[...] a estudante fica preocupada em conseguir nota e não com o aprendizado [...] precisa preencher fichas porque será avaliada (Professora Supervisora 1)

[...] o tempo do estágio é muito pouco (...) tanto no estágio como no Pibid tem estudantes que se interessam, mas no estágio não é possível fazer um trabalho de acompanhamento do estagiário mais de perto, como é possível fazer no Pibid (Professora Supervisora 2).

Esses relatos revelam que é necessário que haja maior interação entre os cursos de formação e também dos licenciandos. A professora supervisora 1 ressalta que muitas vezes o estagiário fica muito preocupado com o preenchimento de fichas e com os relatórios, em detrimento do aprendizado das questões que envolvem o cotidiano no trabalho docente.

Outra questão importante, presente nos relatos das gestoras, reforça a importância do processo de formação inicial também para conhecer, observar e lidar com as questões emocionais dos atores envolvidos no ambiente escolar.  Essas são questões que envolvem a diversidade cultural, diversidade de gênero e principalmente a diversidade religiosa. O relato da gestora EP sinaliza para essa questão:

Os professores chegam à escola cada vez mais despreparados para lidar com as crianças (...) não conseguem perceber que a sociedade mudou e que o imediatismo é a palavra chave e a escola não tem acompanhado esse raciocínio (...) (Gestora EP).

Na opinião dessa gestora, esses são pontos relevantes, que precisam ser melhor abordados nos processos de formação inicial e o estágio precisa ser um espaço de aproximação do estudante com esta realidade. No entanto, a gestora aponta os desafios que permeiam essa prática frente à formação docente e às necessidades e exigências do mundo contemporâneo.

Considerando que uma formação voltada para as questões do mundo contemporâneo requer maior investimento e maior envolvimento de todos os atores envolvidos nesse processo. Dessa forma, programas como o Pibid podem ser propulsores , uma vez que articulados ao estágio supervisionado, com uma carga horária mais ampliada,  podem propiciar melhores condições para a formação inicial docente.

Para tanto, essa política precisa ser ampliada. É preciso que haja maior investimento por parte das políticas voltadas à formação docente,  de forma a garantir que o licenciando do curso de Pedagogia tenha acesso a uma formação que possibilite sua atuação nos contextos marcados pela diversidade, de forma crítica e reflexiva e transformadora.

Todavia, essa é uma tarefa desafiadora que requer o envolvimento de todos os atores que permeiam esse processo. Essa tarefa requer, sobretudo, o fortalecimento do diálogo entre a IES, a escola pública e as autoridades políticas. É necessário que haja um esforço conjunto para a superação das dificuldades hoje instauradas no âmbito da formação e valorização da docência, com vistas à elevação da educação básica no país.

CONCLUSÃO

As políticas de formação e de valorização docente precisam ser melhor visibilizadas e discutidas por todos os atores envolvidos nesse processo. O Pibid vem sendo apontado como uma estratégia  importante para o fortalecimento da formação do pedagogo. No entanto, essa tem sido uma política restritiva, que necessita ser, portanto, ampliada, com vistas ao alcance de melhores resultados no processo de formação inicial dos docentes do país.

O estágio é um espaço privilegiado que pode oferecer muitas possibilidades de aprendizagem no contexto real da prática docente, no tocante à formação inicial e à formação continuada dos profissionais docentes. Esse estudo apontou que muitas têm sido as críticas a este componente curricular. Falta acompanhamento e maior interação por parte das IES e também por parte das escolas de educação básica.

As novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação Básica (BRASIL, 2015), propõe, dentre outros, o aumento da carga horária do estágio. Assim, esse componente curricular passa de 300 para 400 horas, na área de formação e atuação na educação básica, contemplando também as demais áreas específicas, conforme o projeto de curso da instituição.

Esta pode ser uma alternativa frente às dificuldades vivenciadas na atualidade em relação ao estágio supervisionado. Porém, o aumento da carga horária poderá agregar-se à formação dos licenciandos, desde que haja também um melhor acompanhamento desses estudantes.   

Frente a esse cenário, cumpre-nos trabalhar nas reformulações necessárias em relação ao curso de Pedagogia, considerando, no entanto, os desafios e as contradições, frente à complexidade do mundo contemporâneo. É necessário também que as políticas de formação docente garantam o acesso aos programas de bolsa de incentivo no processo de formação inicial, aos estudantes das licenciaturas, conforme previsto no  Decreto Lei n. 12.796, de 4 de abril de 2013 Os parágrafos 4º e 5º dispõem sobre a formação continuada e formação inicial dos profissionais do magistério para atuar na educação básica., que altera  a LDB, no que diz respeito à formação dos profissionais da educação.

Assim, a escolha da carreira docente, conforme investigado nesse estudo, está ligada à crença de que há possibilidades de transformação da sociedade por meio da educação. É necessário, portanto, que haja um esforço conjunto dos atores envolvidos nos cursos de licenciaturas, sobretudo nos cursos de Pedagogia, licenciatura responsável pela formação dos docentes que atuarão na  educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental, basilares nos processos de escolarização.

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