FORMAÇÃO CONTINUADA: PROCESSOS IMPLEMENTADOS PELAS EQUIPES GESTORAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL
Resumo: Este texto tematiza a formação continuada com base em dados de pesquisa que abordou a configuração do trabalho das equipes gestoras de Educação Infantil (EI) nas Secretarias Municipais de Educação (SEME) do Espírito Santo. Com ancoragem em referenciais teórico-metodológicos bakhtinianos, a pesquisa de abordagem qualitativa e de caráter exploratório, desenvolveu procedimento de aplicação de questionário. A análise dos dados evidencia a necessidade de investimento em políticas públicas que garantam a formação continuada para todos os docentes, além de implementação de indicadores consistentes de formação continuada e de gestão educacional que considerem as especificidades da primeira etapa da educação básica para qualificação do campo da EI.
Palavras-chave: Formação docente; Gestão educacional; Educação Infantil.
INTRODUÇÃO
No contexto da legislação brasileira, a Constituição Federal (BRASIL, 1988) responsabiliza o Estado pela garantia de creche e pré-escola às crianças de 0 a 5 anos de idade e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB (BRASIL, 1996) reconhece a Educação Infantil (EI) como primeira etapa da educação básica. Essas premissas legais reafirmam o direito de todos à educação, atribuindo aos municípios a responsabilidade pela EI, em cooperação técnica e financeira com a União e os estados.
Assim, diante de movimentos legais e de demandas sociais, os municípios, com suas peculiaridades, mobilizaram seus setores para responder às premissas de garantir esse direito, articulando o planejamento e a organização da EI em meio às complexidades do atendimento às crianças pequenas. Tal articulação, em muitos municípios, fica sob a responsabilidade de docentes que integram as equipes gestoras de EI que atuam nas SEME.
Nessa esteira de construção e organização da primeira etapa, o planejamento de ações no campo da EI configura-se como prática primordial. Assim, em âmbito local e nacional, produções e estudos sinalizam a importância de conhecermos os movimentos que circundam o trabalho das equipes gestoras da primeira etapa da educação básica (KRAMER, 2001; NUNES, 2005; MELO; PORTO, 2003, KRAMER; NUNES, 2007; CAMPOS, 2012; FERNANDES; GIMENES; CAMPOS, 2013; CÔCO, 2013).
Nesse contexto, a pesquisa intitulada Formação e trabalho das equipes gestoras de EI, concluída em 2015, focalizou os diálogos situados na discussão do atendimento educacional às crianças de 0 a 5 anos de idade como responsabilidade mais direta da gestão pública municipal. Balizados pelo referencial teórico-metodológico bakhtiniano, tivemos como opção metodológica a pesquisa de abordagem qualitativa, de caráter exploratório, com procedimento de aplicação de questionário, sustentado numa etapa inicial de observação do trabalho das equipes gestoras de EI no contexto do Espírito Santo.
O questionário Optamos pela disponibilização do questionário online, visando favorecer o contato com os sujeitos dos distintos municípios do estado. foi organizado em oito seções temáticas, com questões abertas e fechadas, possibilitando aos respondentes transitar entre essas seções. Com os resultados da pesquisa, enfatizamos as infinitas possibilidades dialógicas que se constituem quando nos propomos à escuta das diferentes e inúmeras vozes dos sujeitos em relação às questões envolvidas em sua atuação como integrantes das equipes gestoras de EI nas SEME.
No total de 78 envios do questionário, correspondentes aos municípios capixabas, 48 sujeitos responderam ao instrumento, abrangendo 39 (50%) municípios. Cientes de que estamos ligados como elos na cadeia discursiva (BAKHTIN, 2011), buscamos compreender o alcance da pesquisa para além de nossos sujeitos diretamente envolvidos, considerando que sua atuação se relaciona às instituições de EI dos municípios, aos docentes e às crianças. Desse modo, em relação ao total de 1.622 instituições de EI Esses dados quantitativos foram disponibilizados pela Secretaria de Educação do Estado do Espírito Santo (SEDU). Fonte: INEP, 2014.
Nesse mote, as seções temáticas do instrumento da pesquisa fomentam análises acerca do perfil das 48 (100%) das participantes da pesquisa são do sexo feminino, optamos por nos referir a elas pela expressão gênero feminino.integrantes das equipes gestoras, de concepções no campo da EI, situando o trabalho das integrantes dessas equipes articulado ao planejamento e à avaliação, bem como à formação inicial e continuada.
Considerando o foco e os limites desse artigo, buscamos inicialmente compor um panorama do contexto da pesquisa, abordando a formação na esteira de Nóvoa (2011) integrando a vida pessoal e profissional, considerando os docentes em seu contexto de constituição no conjunto da vida e em dialogia com nosso referencial teórico-metodológico bakhtiniano e compreendendo os sujeitos em intensa trama relacional dialógica.
Na sequência, a arquitetônica deste artigo apresenta enunciados que explicitam e marcam concepções e princípios dos movimentos de formação continuada implementados pelas equipes. O propósito temático se subdivide em dois tópicos. Inicialmente dialogamos com os indicadores da formação continuada implementada pelas equipes gestoras de EI nos municípios. No segundo tópico apresentamos os movimentos formativos implementados pelas equipes gestoras de EI em interlocução com as concepções e temáticas. Aproximados ao perfil das integrantes de equipes gestoras de EI e das concepções relacionadas ao campo da EI Dois eixos de análise que compõem o relatório da pesquisa. , analisamos os processos formativos desenvolvidos nas dinâmicas de atuação das equipes gestoras de EI. Nesse bojo, compartilhamos a seguir os indicadores da formação continuada implementada.
INDICADORES DA FORMAÇÃO CONTINUADA IMPLEMENTADA PELAS EQUIPES GESTORAS DE EI
Na continuidade dos diálogos com a produção e conceitos da formação, exploramos o âmbito dos movimentos formativos implementados pelas equipes gestoras de EI. Assim na seleção para esse compartilhamento, apresentamos sete indicadores que evidenciam aspectos balizadores de ações formativas implementadas e desenvolvidas pelas equipes gestoras de EI. Nessa esteira destacamos os responsáveis pela execução, os responsáveis pelo acompanhamento, a periodicidade, os estímulos, a jornada, o local de realização e os participantes.
No que se referente aos responsáveis pela execução da formação continuada, 13 (27,08%) participantes indicaram a equipe gestora de EI, 12 (25%) evidenciaram a existência de equipe de formação do município e 10 (20,83%) informaram a existência de profissionais vinculados à contratação de assessoria ou consultorias externas.
Ao considerarmos esses três executores que se destacam na produção de dados, analisamos um organograma em movimento que tem procurado organizar-se no município para apoiar e possibilitar condições para melhor atuação das equipes gestoras de EI. Assim, os municípios têm encontrado outras maneiras de se estruturarem investindo em equipes específicas para a implementação da formação municipal. Dessa forma, ressaltamos que a contribuição e a dinamização desse movimento que configura num auditório social dialógico ampliado, potente, que se fortalece à medida que atua nessa processualidade de construção humana e social, (res)significam suas elaborações continuamente no sentido de investir positivamente nas vivências inovadoras que se encontram diante de sua realidade (NÓVOA, 2011).
Concernentemente aos responsáveis pelo acompanhamento da formação continuada, 22 (45,83%) participantes disseram ser a equipe gestora de EI; nove (18,75%) elucidaram a equipe de formação do município; oito (16,67%) informaram ser elas mesmas. Nesse outro indicativo percebemos que o fortalecimento processual de que há pouco falamos advém de uma organicidade executora centrada em movimentos de apoio ao trabalho. Em nada diminuiu o protagonismo das equipes gestoras de EI, pois, conforme podemos perceber com a produção dos dados, a maioria das equipes acompanha os processos formativos que vêm sendo implementados. Assim, compreendemos que, embora haja a presença de contratação de assessoria para apoio do trabalho, as equipes gestoras de EI estão compondo os movimentos formativos.
Acerca da periodicidade da formação, 16 (33,33%) participantes informaram encontros mensais; nove (18,75%) quinzenais; e seis (12,50%) cronograma específico. Percebemos, com esse indicativo, que a periodicidade mensal é a que mais tem ocorrência e sinaliza certa frequência no que se refere aos diálogos com/entre os docentes.
Concernentemente aos estímulos para frequentar a formação continuada, 14 (29,17%) destacaram que são liberados do trabalho; 11 (22,92%) disseram não ser oferecido nenhum estímulo; e oito (16,67%) ressaltaram que o estímulo é receber a certificação.
A respeito da jornada da formação continuada, 20 (41,67%) participantes realizaram a formação fora do horário de trabalho, 15 (31,25%) no horário de trabalho e nove (18,75) em parte do horário de trabalho. Destacamos quanto a esse indicativo quanto precisamos avançar nesse tempo que empreende a realização da formação. A oferta fora do horário de trabalho sobressai aos demais dados e enuncia o desafio de encontrarmos outras formas de possibilitar não apenas o cumprimento de uma prerrogativa legal, com tempos específicos e visíveis de formação, mas também ambientes formativos diversos e ampliados que ofereçam, além das discussões práticas e teóricas da docência, a constituição de redes de relações, de solidariedade e espaços de colaboração que impulsionem a autonomia da formação por profissional.
A respeito do local de realização da formação continuada, 42 (87,50%) participantes disseram que são realizadas no município, um (2,08) fora do município e um (2,08) fora e no município. A respeito desse indicador, analisamos que as parcerias entre os municípios ainda são um desafio. Nesse aspecto, é importante avançar, ampliar os horizontes para fortalecer as negociações e assim, em meio às negociações, conquistar espaços outros de formação, cumulando mais vozes para compor uma crescente rede dialógica e ultrapassando, então, as fronteiras dos municípios.
Sobre as participantes da formação continuada, 25 (52,08%) participantes informaram que compõem os participantes da formação um conjunto de profissionais da rede atuantes na EI, nove (18,75%) conjunto de profissionais da rede e cinco (10,42%) pedagogos.
Nesse sentido, diante de mais essa importância, ainda é pertinente que, ao ser concebida a formação pela equipe gestora de EI, nesse planejamento se considerem as cinco dimensões (prática, profissão, pessoa, partilha e público) que Nóvoa (2011) nos indica, e assim possamos dimensionar o perfil docente das etapas, instituições, rede e, com as vozes desse contexto educacional, processualmente balizar a construção dos encontros que visam ao fortalecimento das práticas pedagógicas e à implementação de políticas públicas de formação específicas para cada etapa.
Ao pontuarmos os indicadores no desenvolver dessa dialogia, exploramos também metodologias dinamizadas na atuação das equipes gestoras de EI, objetivando visualizar a formação ampla e por vezes imprecisa que vem sendo composta e implementada pelas equipes. Dessa maneira, analisamos a produção de dados reinterando alguns dos indicadores que versamos e integrando nossas análises com os enunciados das participantes.
As equipes gestoras de EI informaram o movimento de contratação de empresas Indicador - Responsável pela execução da Formação Continuada.com responsabilidade em realizar a formação e elucidaram também que a formação está atrelada ao material apostilado que é implementado na EI. Verificamos que três (6,25%) participantes informaram essa realidade, das quais duas em detalhes, tais como a identificação da empresa, a responsabilidade pelo material apostilado e a formação, e uma participante elucidou com riqueza os arranjos da formação que implementam e vivenciam.
Nesse conjunto, os discursos indicam um mercado crescente, com negociações e ofertas de “pacotes” distintos para “resolver” os desafios das equipes no que se refere ao cumprimento de oferta da formação. Nas minúcias do enunciado detalhado por uma participante, percebemos o distanciamento da equipe que, exausta devido às tantas tarefas que desempenha, fala a esse respeito demonstrando certo alívio por ser menos uma responsabilidade.
Assim, a participante evidenciou que a “saída” para a implementação da formação é a contratação de empresa e demarcou que essa é a opção que hoje existe para garantir a formação. Ao mesmo tempo, anunciou que seria importante ser responsável pelas dinâmicas de formação e indicou nesse momento a elaboração com base no diálogo com as instituições, marcando e considerando a potência da dialogia no processo de elaboração da formação, e ainda os conceitos em diálogos com Nóvoa (2011) e indicam dimensões de partilha e público significativos para o processo de construção da formação.
O município tem parceria com [nome da empresa e sistema apostilado]. Então a contrapartida deles é a responsabilidade da formação por que é nela que os professores aprendem como manusear as apostilas, e para essa finalidade temos uma carga horária no pacote que eles nos ofereceram pelo contrato que são 20 horas de formação. Se quisermos mais horas, como por exemplo um encontro com todos os professores reunidos e com palestrantes renomados, incluímos no contrato e o pacote vai mudando se adequando a necessidade que queremos e o município tem condições de arcar financeiramente, eles organizam tudo, desde o espaço até todo o encontro. É um apoio necessário por que temos muito trabalho e a formação exige muito de nós da equipe, se tivéssemos somente isso pra responder, seria também muito importante nós fazermos tudo junto com as escolas, mas não tem como. Essa foi uma saída que encontramos para termos a formação aqui no município. (P32)
Na continuidade da identificação desses movimentos formativos difusos, destacamos encontros que são implementados com foco nas idades das crianças de creche (0 a 3 anos) e pré-escolar (4 a 6 anos). Esse grupo cotejado ao indicativo de participantes da formação continuada, representado por quatro (8,33%) participantes, apresentou ações formativas que, além das idades, consideram a atuação docente. Nessa organização, assinalamos que o campo acadêmico vem compondo, pareado aos indicativos legais, um processo educacional que consiste na integralidade das crianças e compreende a creche e o pré-escolar como únicas etapas da educação básica. Com base nesse indicativo, analisamos que a dinâmica implementada pode fomentar a separação dentro da etapa e, por essa razão, é necessário atentar para os indicativos das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil - DCNEI (BRASIL, 2009). De todo modo, buscando o estranhamento desse fomento, acreditamos que as dinâmicas que empreendem momentos distintos para a faixa etária de 0 a 3 anos e de 4 e 5 anos de idade, conforme enunciado, evidenciam também o esforço para o atendimento e debates de especificidades da EI. Nesse sentido, afirmamos o ato responsável das participantes no sentido de cumprir as prerrogativas legais indicadas pelas DCNEI (BRASIL, 2009).
É organizada por área do conhecimento, sendo na EI duas modalidades, Creche e Pré-escola. Cada ano estudamos um tema que auxilia nas atividades desenvolvidas no decorrer de todo ano letivo. Então os professores elaboram trabalhos e projetos durante a formação temática mensal e aplicam na sala de aula com os alunos. Os professores participam da Jornada Pedagógica e de acordo com as atividades realizadas e a participação presencial na formação recebem um certificado de conclusão da Formação Continuada contabilizando 120 horas. (P45)
Desse modo, precisamos compreender como tem sido a integração das prerrogativas das DCNEI (BRASIL, 2009), e destacamos, com base nos enunciados das participantes, que as especificidades da EI e também da atuação dos profissionais se apresentam como questões importantes que ressoam na comunicação da formação que as integrantes de equipes gestoras implementam.
Diferentemente da formação que comunicamos há pouco, percebemos que oito (16,67%) das participantes informaram que as equipes gestoras mobilizam todos os docentes da EI para realizar sua formação. Não há grupos distintos, e sim um grande auditório social.
Ao dinamizarem as formações, convidam as docentes para protagonizarem os encontros mediante suas práticas com as crianças e, baseadas em temáticas, desenvolvem esse evento. Além dos encontros Indicativo – Periodicidade da Formação Continuada. temáticos mensais, informaram que anualmente se reúnem para a preparação de uma formação ampliada que integra outras equipes gestoras de EI de diferentes municípios. Constituindo-se como fórum, disseram que sua composição envolve as microrregiões e integra outros municípios que manifestem desejo por participar. Esse evento reúne oito municípios e já acontece há algum tempo, segundo informaram as participantes.
Os enunciados também elucidam outro tipo de fórum, e esse não tem cunho ampliado, mas está situado no município, com objetivo de discutir os enfrentamentos locais. Identificamos mobilizações que nos podem indicar ações autônomas desse conjunto de equipes. Nessa ação, visibilizamos a responsividade e alteridade que circundam as integrantes e que contribuem em culturas (res)significadas e, sem dúvida, com políticas formativas promissoras para a EI. Destacamos, ainda, que há, nesses relatos, enunciados de conquista formativa por parte das participantes que nós também reconhecemos. A conquista de um espaço formativo em que interagem diferentes realidades e no qual se configura a formação conforme as vozes ativas das docentes que desenvolvem as práticas junto às crianças.
Temos um Fórum Municipal que abrange todas as faixas etárias da EI no qual debatemos e realizamos trocas entre os professores. No decorrer do ano organizamos estudos temáticos mensais com os professores visando melhorar o trabalho em sala de aula. Organizamos um momento em que os próprios professores se fazem protagonistas dos seus aprendizado, tornando-os "palestrantes" em alguns momentos e registramos tudo. (P40)
Em 2014 tivemos o XXIII Fórum da EI que foi sediado por [nome do município], juntamente com os oito municípios vizinhos que fazem parte dessa microrregião esse evento acontece há muitos anos [...]. (P26)
Identificamos processos formativos implementados pelas equipes gestoras nas instituições de EI. E ainda que no indicativo local de realização da formação continuada, a instituição de EI não tenha evidenciado seu lugar e protagonismo formador, é a partir dos enunciados das participantes que ficam marcados os movimentos e mais um potente lugar/indicativo de formação continuada. Nos tempos de planejamento das docentes, as sete (14,58%) participantes que informaram essa organização não fazem menção à nomenclatura formação em serviço: “a formação acontece nos momentos de hora atividade dos professores, e nas escolas usamos o tempo do planejamento para a formação” (P17). Outra participante confirma essa visão de que não há formação, o que existe é o planejamento nas instituições ao assinalar que “Não houve formação específica neste ano de 2014. Houve estudos de diferentes temáticas durante os planejamentos coletivos realizados uma vez por mês em cada instituição de ensino e coordenados pelo pedagogo da instituição” (P20).
Encontros anuais são recorrentes entre todas as participantes, mas destacamos que 22 (25,83%) participantes se organizam com encontros que “são oferecidos anualmente oportunidades de participação em seminários, fóruns e palestras entre outros” (P46), e que “ainda não ocorre formação, mas anualmente é realizado o fórum da EI (nome da microrregião) com palestras, relatos de experiências” (P5). Os enunciados indicam que, na compreensão dessas equipes, as formações têm sido implementadas esporadicamente, sem continuidade, e que não oportunizam reflexões contínuas sobre as práticas desenvolvidas pelos docentes (NUNES, 2005).
MOVIMENTOS FORMATIVOS IMPLEMENTADOS: CONCEPÇÕES E TEMÁTICAS
Com base nas indicações de Nóvoa (2011), percebemos, nos discursos analisados, ações formativas de partilha que consideram a profissão. Em nossa análise, esse movimento representado pelas duas matizes (partilha e profissão) fundamenta a formação e são indicações de conquistas que balizam concepções da formação continuada implementada pelas equipes gestoras de EI.
O movimento que indicamos, podemos correlacioná-lo com a análise realizada por Kramer e Nunes (2007) nas entrevistas com as equipes gestoras de EI do Rio de Janeiro. A proximidade analítica se justifica no que se refere às concepções, pois “as equipes responsáveis pela formação não percebem que, para se concretizar uma concepção, exige-se formar os profissionais de acordo com os princípios dessa nova concepção” (KRAMER; NUNES, 2007, p. 434). A análise que corroboramos com Kramer e Nunes (2007) evidencia que o processo formativo precisa mobilizar as novas concepções no campo da EI. Para tal é necessário ampliar as pesquisas no sentido de entender como estão sendo compreendidas as concepções indicadas pelas DCNEI (BRASIL, 2009) que integram a formação das docentes de EI. Desse modo, compreendemos que
No ano de 2014 as formações aconteceram em 5 encontros nas unidades de ensino com orientação e encaminhamento do material a ser estudado; 7 encontros com os pedagogos organizados pela equipe da EI; 6 encontros com os professores de projeto com a equipe de formação continuada; 3 encontros com os professores de educação física com a equipe de formação continuada e participação de todos os sujeitos envolvidos com a EI nos 3 dias de 9º seminário da EI de [nome do município]. (P2)
No encontro polifônico das vozes, analisamos que os enunciados tecem as singularidades do trabalho e indicam a elaboração formativa compartilhada e dinâmica que habitam as equipes gestoras de EI. Ainda o ativismo e vida dos discursos demonstram o detalhamento metodológico dos encontros formativos difusos implementados pelas equipes, apresentam auditórios sociais potentes que, em meio a um e/ou vários disparadores temários mensais, “um tema a cada mês é relacionado ao trabalho na EI. Estudam a teoria, vivenciam a prática e relatam uns aos outros” (P14).
Mobilizados pela partilha, que possibilita, por meio da relação, a convivência essencial para desenvolvermos parcerias profissionais, apresentamos, desde os enunciados das participantes, as temáticas específicas que compõem as formações implementadas pelas equipes gestoras de EI. Oferecidas aos profissionais da EI do município, as temáticas implementadas na formação com maior frequência e por ordem de ocorrência são:
1. Formação e Trabalho Docente;
2. Proposta Curricular;
3. Parceria com as Famílias e Alfabetização;
4. Articulação da EI e EF e Avaliação;
5. Tempo Integral;
6. Gestão e EI no/do campo;
7. O trabalho com bebês.
Depois que apresentamos as dez temáticas frequentes, reunidas em sete ordens de ocorrência, destacamos, com base nos enunciados e nas marcações das participantes, que são duas as temáticas mais recorrentes: formação e trabalho docente.
Em nossa análise, a opção da temática formação indica que a implementação formativa movimentada pela equipe gestora de EI tem focalizado a profissionalização dos docentes. Desse modo, quando as equipes gestoras promovem os encontros mensais de todos os profissionais docentes, impulsionam, mediante os encontros, a reflexão coletiva que, muitas vezes, não conseguem implementar por falta de tempo, conforme versa Nóvoa (2007). Então, no intuito de garantir o tempo para formação, as equipes têm implementado único encontro ao mês. Nessa ação, percebemos a conquista do tempo idealizado por temáticas prévias que consideram os desafios docentes e vêm sendo incorporadas à cultura formativa docente e às políticas públicas de formação. A articulação desse tempo mensal com a temática específica de formação contribui para a superação da formação pelo cumprimento legal e/ou certificação docente, pois considera dimensões integradoras dos movimentos formativos, tais como a partilha, a profissão e a pessoa. E, nessa dialogia, potencializam a articulação das redes coletivas que discutem a própria formação. Todavia, ainda que não seja possível indagar com esta pesquisa, é importante não perder de vista a participação dos envolvidos na deliberação sobre as políticas formativas, em especial, dos profissionais. Se, com esta pesquisa, buscamos valorizar as conquistas (sem invisibilizar as precariedades) configurando um panorama das lógicas formativas empreendidas, sabemos que essas lógicas ainda estão distantes de assinalar um projeto formativo centrado nas instituições (mesmo que fortemente dirigido a elas) e deliberado por seus profissionais.
Ao dialogarmos sobre a temática trabalho, assim como a formação, ressaltamos que as equipes gestoras estão investindo nas indicações das DCNEI (BRASIL, 2009), buscando contemplar nas temáticas o trabalho docente e implementando a discussão coletiva das especificidades da etapa EI e também da atuação. Desse modo, estão investindo no conhecimento para a identidade profissional que só pode transformar-se socialmente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mediante os dados que apresentamos, destacamos que mesmo sendo uma prerrogativa legal, a formação não tem sido resguardada por alguns gestores. Longe de desconsiderar as possíveis justificativas, enfatizamos que ainda que existam, é preciso cumprir a legislação, garantindo formação para todos os docentes em suas diferentes funções.
Evidenciamos significativa mobilização no investimento de dinâmicas que versam as especificidades da primeira etapa e esse indicativo configura o esforço das equipes gestoras de EI para cumprir as DCNEI (BRASIL, 2009).
Nesse sentido, destacamos o avanço na organicidade da formação continuada que tem contemplado, com maior porcentagem, um conjunto de profissionais atuantes na EI. Ainda sinalizamos o desafio no investimento de formação específica para as diferentes atuações, como o pedagogo que dinamiza as ações pedagógicas dos docentes regentes que se encontram inseridos no conjunto da formação que pauta a etapa da EI, mas não tem pautado a função dos diferentes profissionais da EI. De todo modo, é importante não perder de vista a formação como um projeto coletivo articulado à institucionalidade do trabalho na EI, portanto, em vinculação com a participação dos profissionais.
Diante das possibilidades formativas apresentadas, visibilizamos um movimento que reúne várias iniciativas de formação e, nesse contexto, precisamos aprofundar e ampliar nossas pesquisas perquirindo o cumprimento da formação profissional e cultural dos profissionais da educação.
REFERÊNCIAS
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