EXPERIÊNCIAS DE FORMAÇÃO DE DIRETORES: CONTRIBUIÇÕES

Resumo:Este trabalho analisa experiências de formação de diretores de escola realizadas pela Universidade Federal de Juiz de Fora. São cursos desenvolvidos desde 2009, do nível de aperfeiçoamento até o mestrado profissional. Trazemos essas experiências para dialogar com pesquisas realizadas com gestores brasileiros nos anos de 2009 a 2014 e com a publicação El liderazgo escolar em América Latina y el Caribe: Un estado del arte em base a ocho sistemas escolares de la región, da Oficina Regional de Educação para América Latina e Caribe e da Organização das Nações Unidades para a Educação, a Ciência e a Cultura. A meta 19 do Plano Nacional de Educação e o Programa Nacional de Formação e Desenvolvimento Profissional de Diretores Escolares colocam o tema na ordem do dia.

Palavras-chave: diretores de escola; formação de diretores; liderança educacional.


INTRODUÇÃO

O desempenho dos diretores escolares tem se revelado um importante elemento de sucesso das escolas públicas e dos sistemas de ensino. Cada vez mais há expectativa de que eles exerçam um papel de liderança nas escolas, sendo capazes de mobilizar a comunidade escolar, atuar em prol da gestão democrática e realizar uma série de tarefas que dizem respeito não só aos aspectos administrativos e financeiros, mas também às práticas pedagógicas. Essa é uma realidade que se apresenta em vários países e também no Brasil. A meta 19 do Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado em 2014, estabelece a necessidade de programas para a formação de dirigentes escolares e o desenvolvimento de novas formas de provimento do cargo (BRASIL, 2014). Dando sequência a esse objetivo, o Ministério da Educação (MEC) lançou o Programa Nacional de Formação e Desenvolvimento Profissional de Diretores Escolares em portaria de 04 de dezembro de 2015 (BRASIL.MEC, 2015). O tema da formação de diretores escolares está na ordem do dia.

O trabalho que ora apresentamos tem como objetivo analisar recentes experiências de formação de diretores de escola desenvolvidas em nosso país, especialmente aquelas levadas a cabo na Faculdade de Educação (Faced) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), pelo Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (CAEd). São cursos desenvolvidos a partir de 2009, abrangendo desde a formação em nível de aperfeiçoamento até o mestrado profissional stricto senso em Gestão e Avaliação da Educação. Participam dessa formação gestores da educação pública de vários estados e municípios brasileiros. Eles incorporam a esse processo as experiências iniciais oferecidas por diferentes unidades acadêmicas e áreas de conhecimento. São parte das políticas formação docente e de gestores escolares de redes de ensino de entes federativos subnacionais.

Ao estudar essas experiências dialogamos com pesquisas realizadas (surveys) com gestores de vários estados brasileiros nos anos de 2009, 2011 e 2013 e com as informações disponibilizadas pela publicação El liderazgo escolar em América Latina y el Caribe: Un estado del arte em base a ocho sistemas escolares de la región (2014) Pesquisa coordenada por José Weinstein, Gonzalo Muñoz e Macarena Hernández. Desenvolvida pela secretaria técnica do projeto OREALC/UNESCO Santiago de estudos sobre liderança escolar na América Latina, a cargo da Faculdade de Educação da Universidade Diego Portales., da Oficina Regional de Educação para América Latina e Caribe (OREALC), Organização das Nações Unidades para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).

Decidimos iniciar o presente texto apresentando alguns dados que permitem o conhecimento do perfil de diretores de escolas brasileiras em seis estados da Federação. Com isso, iniciamos o diálogo com a pesquisa da OREALC/UNESCO (2014), de modo a reforçar a ideia de que há semelhanças entre os diretores escolares de vários países da América Latina, de que o investimento em sua formação é uma necessidade continental e de que podemos aprender uns com os outros.

A segunda seção de nosso trabalho traz alguns resultados de pesquisas que mostram o que já é feito em termos de formação de diretores, as necessidades postas ao exercício do cargo atualmente e levanta a necessidade de pensarmos na relação entre teoria e prática. Em seguida apresentamos algumas experiências de formação de diretores de escola. Nosso intuito é chamar a atenção para a necessidade de relacionar teoria e prática também na formação desses profissionais.

Nossas considerações finais buscam relacionar esses aspectos que apontamos para o debate ao desafio atual da formação de diretores no Brasil. É uma forma de contribuição às discussões sobre o tema.

DIRETORES DE ESCOLA NO BRASIL – CARACTERÍSTICAS POR ALGUMAS PESQUISAS

Os dados apresentados pela publicação El liderazgo escolar em América Latina y el Caribe: Un estado del arte em base a ocho sistemas escolares de la región (OREALC/UNESCO, 2014) são o estímulo inicial para trazermos algumas características de diretores de escola de alguns estados brasileiros. Como mostrado nesse relatório latino-americano, as informações sobre o Brasil referem-se apenas ao estado do Ceará, ente federativo subnacional. Pretendemos agora ampliar o escopo da informação sobre nosso país com resultados advindos de outras investigações brasileiras e reforçar o argumento de que, assim como foi verificado para os demais países participantes do já citado relatório, também precisamos melhorar o investimento na formação dos diretores de escola no Brasil.

Começamos com uma pesquisa realizada pelo CAEd/UFJF (2009), Pesquisa Nacional sobre Gestão e Liderança EducacionalEssa pesquisa consta entre as referências da publicação da OREALC/UNESCO (2014) sobre liderança escolar, mas seus resultados não chegam a ser apresentados.. Foi um survey, respondido por diretores de escolas, dos estados de São Paulo (SP), Minas Gerais (MG), Rio de Janeiro (RJ), Pernambuco (PE), Ceará (CE) e Rio Grande do Sul (RS).

Trabalhamos com as informações sobre o perfil desses gestores, incluindo a sua formação, suas atividades na direção escolar e seu processo de escolha.

O questionário online foi aplicado entre janeiro e março de 2009, tinha 128 questões e essa iniciativa também contou com apoio das secretarias de Educação dos estados envolvidos. A amostra foi definida com escolas urbanas, de redes municipais e estaduais, com pelo menos 300 alunos. Há ainda três estratificações: por estado, por rede de ensino (municipal e estadual), e por tamanho da cidade (município pequeno, até 100.000 habitantes; médio, entre 100.000 e 500.000 habitantes; e grande com mais de 500.000 habitantes)Uma apresentação dessa pesquisa também foi feita em Teixeira e Malini (2012)..

A tabela a seguir mostra a participação de diretores de redes municipais e estaduais em cada um dos estados que atenderam à pesquisa.

Fonte: CAEd/UFJF (2009).
Tabela 1 – Participação dos entrevistados na pesquisa por estado.
Estado Número de questionários
Participação na base prevista Participação na base efetiva
CE 241 223
MG 617 532
PE 249 210
RJ 420 279
RS 273 219
SP 1200 1014

Passamos, a seguir, à apresentação de algumas características dos entrevistados, por estado, agregando redes municipais e estaduais de ensino. Elas trazem luz sobre quem são os profissionais que ocupam o cargo de direção escolar e demandam por formação. Também no Brasil a função é predominantemente exercida por mulheres.

Fonte: CAEd/UFJF (2009).
Tabela 2 – Distribuição dos entrevistados por sexo por estado e total O total nesta tabela e nas seguintes se refere ao percentual aferido no conjunto dos seis estados. Os dados referem-se sempre a percentuais válidos.(%)
SP RJ MG RS PE CE Total
Feminino 83.38 84.53 81.13 84.40 79.52 70.85 81.66
Masculino 16.62 15.47 18.87 15.60 20.48 29.15 18.34

O relatório da OREALC/UNESCO (2014, p. 15) apresenta dados da Argentina, Chile, Equador e Republica Dominicana que concordam com uma maioria de mulheres na função de gestão escolar. No entanto, Murillo (2012), citado pelo mesmo relatório OREALC/UNESCO (2014), já chamava a atenção para a dispersão da distribuição desses dados, ainda que a maioria dos diretores da região fosse composta por mulheres. Já a Colômbia, o México e o Peru têm uma maioria de homens entre os diretores de escola.

Quanto à faixa etária, no caso brasileiro (CAEd/UFJF, 2009) as três maiores frequências (23,88%, 22,78% e 19,02%) estão nas faixas que vão de 40 a 54 anos (40 a 44, 45 a 49 e 50 a 54). Também comparando aos dados encontrados por Murillo (2012), não há grande variação em relação ao que foi verificado para outros países da América Latina, onde a idade média é de 44 anos.

À investidura no cargo de diretor escolar precedeu qual o tipo de formação? A experiência na gestão escolar tem exigido a oferta de formação continuada?

Com relação à formação de diretores, o relatório da OREALC/UNESCO (2014) afirma, considerando o estudo de Murillo (2012), que:

La gran mayoría de los directores, especialmente los que trabajan en escuelas urbanas, tienen estudios universitarios de grado y existe un grupo relevante (20%) que tiene adicionalmente estudios de postgrado (la variabilidad en este caso iria desde Colombia con más de 50% de directores con postgrado, hasta varios países que tienen menos del 10% en esa situación, como Paraguay, Argentina, El Salvador o Uruguay). (OREALC/UNESCO, 2014, p. 6).

As três tabelas a seguir mostram o nível de escolaridade mais elevado, considerando até a graduação, dos diretores participantes da pesquisa CAEd/UFJF (2009), quantos possuem pós-graduação e quantos deles possuem formação específica em administração escolar. Cabe assinalar que os dados mostram os efeitos de algumas mudanças nas políticas educacionais brasileiras, especialmente a partir da década de 1990 e da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.394, de 1996. A disposição de elevação do nível de formação de todo o pessoal do magistério associada ao princípio da gestão democrática pode ser um fator que explique as maiores frequências entre aqueles que possuem curso superior, com pedagogia ou licenciatura. Ou seja, a formação em nível superior passou a ser meta e exigência da LDB. Portanto, se aplica também àqueles que desejam ser diretores de escola.

Fonte: CAEd/UFJF (2009)
Tabela 3 – Distribuição dos entrevistados por nível de escolaridade mais alto por estado e total (%), considerando até graduação.
SP RJ MG RS PE CE Total
Ensino médio ou anterior 0,10 0,00 0,00 0,00 0,00 0,45 0,08
Normal (Antigo Magistério) 0,10 9,71 1,69 1,38 0.95 0,90 1,78
Superior – Pedagogia 57,07 29,50 26,55 24,31 23,33 33,18 39,50
Superior – Licenciatura 21,86 42,45 54,61 48,17 56,19 45,74 38,61
Superior – Outros 20,87 18,35 17,14 26,15 19,52 19,73 20,03
As maiores frequências acima estão entre os que fizeram curso superior. Mas não entre os que são pedagogos, exceto pelo caso de São Paulo. Isso está associado a mudanças nos processos de provimento do cargo de direção escolar, que passaram a permitir que licenciados se candidatassem. Junto a isto, alguns estados e municípios adotaram eleições pela comunidade escolar ou exames como recurso para provimento do cargo. Esses podem ser motivos que expliquem o alto percentual de diretores com especialização (pós-graduação lato sensu, de 360 horas), que figura na tabela 4. Buscam em nível mais elevado a formação que não tiveram na graduação.
Fonte: CAEd/UFJF (2009)
Tabela 4 – Distribuição dos entrevistados por modalidade de pós-graduação por estado e total (%)
SP RJ MG RS PE CE Total
Nenhum 17,36 22,66 16,79 19,27 14,35 8,07 16,91
Aperfeiçoamento (180 horas) 13,69 10,43 6,98 8,72 8,13 4,48 10,14
Especialização (360 horas) 65,28 62,95 74,91 70,64 75,60 85,65 70,28
Mestrado 3,57 3,60 1,13 1,38 1,91 1,35 2,51
Doutorado 0,10 0,36 0,19 0,00 0,00 0,45 0,16

Quem não tinha a habilitação para a administração escolar, buscou formação, majoritariamente, na pós-graduação lato sensu. E essa informação ganha peso quando associada aos dados da tabela 5. Entre os diretores que têm formação específica em administração escolar, exceto pelo caso de SP, a maior parte buscou esse conhecimento na especialização. Se de um lado temos SP, do outro está o CE com 55,61% de diretores com especialização. É condição neste estado a pós-graduação lato sensu em gestão escolar para o acesso ao cargo.

Fonte:CAEd/UFJF (2009).
Tabela 5 – Distribuição dos entrevistados por formação específica em administração escolar por estado e total.
SP RJ MG RS PE CE Total
Graduação com habilitação em administração escolar 66,37 18,05 13,96 2,75 12,50 10,31 34,45
Especialização na área de administração escolar 29,67 37,91 10,57 25,69 24,04 55,61 28,01
Mestrado na área de administração escolar 0,89 1,08 0,00 0,00 0,48 0,00 0,53
Doutorado área de administração escolar 0,10 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,04
Não possuem 2,97 42,96 75,47 71,56 62,98 34,08 36,97

Pela tabela 5, pudemos observar que o maior percentual, exceto nos casos de SP e CE, é o de diretores que não têm formação específica em gestão escolar. Quando passamos a observar o tempo de trabalho como gestores, podemos notar que as maiores frequências estão nas faixas de 5 a 9 e de 10 a 19 anos de exercício.

Fonte: CAEd/UFJF (2009).
Tabela 6 – Distribuição dos entrevistados por tempo de trabalho na gestão escolar por estado e total.
SP RJ MG RS PE CE Total
Até 1 ano 4,46 4,00 9,87 4,13 6,19 7,24 5,93
De 2 a 4 anos 9,70 13,09 18,79 16,97 18,57 20,81 14,43
De 5 a 9 anos 28,42 23,64 34,35 27,52 30,95 40,72 30,39
De 10 a 19 anos 45,45 40,36 31,69 44,04 36,67 24,89 39,21
Mais de 19 anos 11,98 18,91 5,31 7,34 7,62 6,33 10,04

Vale a pena, em momento futuro, explorar o cruzamento desses dados. A associação de formação específica, com nível mais alto de escolaridade e tempo de serviço pode evidenciar que ainda temos um grande número de diretores de escolas em estados brasileiros que precisam de formação para a gestão escolar. Os dados a seguir indicam exatamente isso. Nem a formação continuada tem dado cabo dessa tarefa.

Considerados os dois anos anteriores à pesquisa (CAEd/UFJF, 2009), 41,54% dos entrevistados não haviam participado de atividades de formação continuada.

Dentre os 57,63% que afirmaram ter participado de formação continuada no mesmo período mencionado acima, a avaliação sobre o impacto na prática foi como demonstrada abaixo:

Fonte: CAEd/UFJF (2009).
Tabela 7 – Avaliação da formação continuada sobre a prática.
Descrição Percentual
Não mudou nada 0,56
Reforçou aquilo que já estava fazendo 16,05
Fez-me rever algumas práticas 27,54
Mudou significativamente as práticas que desenvolvia 6,66
Acrescentou novas práticas, principalmente “didáticas” 10,44
Acrescentou novas práticas, principalmente “gerenciais” 38,75

Diante das várias competências que os diretores escolares devem reunir, os efeitos da formação continuada ainda são muito tímidos. Seria desejável que produzissem efeitos mais amplos sobre o conjunto de suas atividades. Pelos dados acima, a formação, quando ajuda, o faz em uma perspectiva ou outra: ajuda nos aspectos pedagógicos ou ajuda nos aspectos administrativos. E, além disso, ainda ocorre de modo quantitativamente insuficiente para atender o público que demanda por ela.

BREVE BALANÇO DA FORMAÇÃO DE DIRETORES

O papel que os diretores escolares exercem tem sido relacionado aos resultados de desempenho que o sistema educacional apresenta (ALVES, 2008; TEIXEIRA; MALINI, 2012). A investigação de Oliveira (2014) mostra que o modo como os diretores lidam com a implementação de políticas tem relação direta com sua formação. As políticas levadas às escolas e associadas à distribuição de recursos, como Mais Educação, Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e PDE Escola, colocaram os gestores na posição de intérpretes e mobilizadores da comunidade em prol do planejamento escolar. Isso exige muitos saberes associados.

Segundo Burgos e Canegal (2011, p. 26-28) A pesquisa foi feita em uma parceria entre o CAEd/UFJF e o Departamento de Sociologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Foi uma pesquisa etnográfica em duas escolas do Rio de Janeiro e duas de Recife., a escola percorreu, entre as décadas de 1970 e 1990, uma trajetória que pode ser descrita como “da gestão da pobreza à ênfase no desempenho escolar”. O gestor escolar ficou entre duas tendências: uma é a dos “influxos das políticas modernizantes impostas pelos gestores, e outra de baixo, da cultura cristalizada no exercício da atividade do diretor” (BURGOS; CANEGAL, 2011, p. 41). A conclusão dos autores expressa com exatidão o que julgamos necessário no atual cenário da educação brasileira, no que diz respeito à formação dos gestores escolares.

(...) Além de um forte investimento na capacitação técnica do diretor, será preciso construir politicamente um novo consenso a respeito do papel da escola, incorporando à noção de êxito escolar, não apenas a proficiência dos estudantes em disciplinas específicas, mas também o seu efeito na difusão de valores compatíveis com a república democrática desenhada em 1988. E para essa escola existir, o diretor terá que ter as bases de sua autoridade reconstruídas, aliando competência administrativa e condições institucionais compatíveis com o exercício de uma verdadeira liderança política e pedagógica da escola. (BURGOS; CANEGAL, 2011, p. 42).

Mas a formação que tem sido oferecida no Brasil não parece atender a esse preceito. Pelo menos é o que diz a avaliação de egressos de alguns desses processos formativos. Ainda em 2009 foram divulgados os resultados da pesquisa Perfil dos Diretores de Escola da Rede Pública (FUNDAÇÃO VICTOR CIVITA, 2009). Foi realizada em 13 capitais de estados brasileiros, com 400 gestores escolares. Obteve dados sobre quem são os diretores de escola, o que fazem, as atividades que mais exigem sua dedicação e seu processo de formação. Nessa investigação, 80% dos entrevistados afirmaram ter feito pelo menos um curso de gestão (com mais de 40 horas) entre 2006 e 2009, como formação continuada. Com relação à avaliação dos cursos “51% dizem que o curso ensinou novas ferramentas ou programas de trabalho, 41% ressaltam que o conteúdo do curso ajudou na gestão da aprendizagem, 9% dizem que o curso era muito teórico e difícil de ser aplicado na prática” (FUNDAÇÃO VICTOR CIVITA, 2009, p. 39).

Outra importante fonte para essa constatação é a pesquisa Práticas de Seleção e Capacitação de Diretores Escolares, coordenada por Heloisa Lück (FUNDAÇÃO VICTOR CIVITA, 2011). Das 24 secretarias estaduais de educação que participaram da pesquisa, 23 afirmaram ter investido em formação para seus diretores nos últimos cinco anos. Estados como São Paulo, Paraná, Maranhão, Roraima, Tocantins, Ceará e Pará informaram ter oferecido mais de 360 horas de formação para seus diretores Os estados de São Paulo e Ceará também tiveram diretores como entrevistados na pesquisa realizada pelo CAED/UFJF (2009).. Mas os conteúdos dos cursos ainda são considerados muito teóricos e pouco auxiliam a desenvolver as competências que a pesquisa sugere que sejam necessárias aos diretores de escola. São elas, a saber: competências de resultado, planejamento, liderança, pedagógicas e administrativas (FUNDAÇÃO VICTOR CIVITA, 2011).

Uma última pesquisa que citamos foi realizada e coordenada pela Assessoria Especial de Gestão Escolar da Secretaria de Estado da Educação do Espírito Santo (SEDU-ES). A pesquisa Perfil dos Gestores Escolares da Rede Estadual do Espírito Santo (SEDU-ES, 2011) ouviu 380 dos 402 gestores escolares da rede estadual durante os meses de fevereiro e março de 2011. As informações foram coletadas através de um questionário estruturado, autoaplicável, apresentado aos gestores em reuniões previamente agendadas nas 11 Superintendências Regionais de Educação que compõem o Sistema SEDU. Os questionários foram processados por uma equipe de estatísticos da própria Secretaria (TEIXEIRA; MALINI, 2012).

De forma resumida, pode-se dizer que os objetivos da pesquisa eram traçar um perfil do gestor das escolas da rede estadual do Espírito Santo, desde sua formação inicial e continuada, passando pela forma de designação para a função que ocupam, chegando enfim aos padrões de atuação cotidiana, pressupondo sua jornada de trabalho semanal declarada à pesquisa.

Sobre a formação inicial, 44,6% fizeram sua primeira graduação em Pedagogia. Quando a pergunta foi se a primeira graduação os preparou para a gestão escolar, 75,4% das respostas se concentram entre “não preparou nada”, “preparou muito pouco” e “preparou pouco” (SEDU-ES, 2011). Mas a avaliação em relação à formação continuada dos que participaram da pesquisa é diferente. Entre os entrevistados, 37,5% e 34,6% creem que os cursos “colaboram muito” e “colaboram”, respectivamente, para melhorar a gestão da escola. A razão para isso, que se distribuiu com maior frequência, foi “com a ajuda do curso, consegui traçar um planejamento para a minha escola”, com 31,8% das respostas (SEDU-ES, 2011).

Essa resposta reforça a revelação da pesquisa coordenada por Heloisa Lück em 2011 (FUNDAÇÃO VICTOR CIVITA, 2011). Os diretores de escola precisam aprender a planejar. Os dados mostram que a melhor avaliação existe quando os gestores identificam no curso uma oportunidade de aprender a “traçar um planejamento” para a escola. Isso pode ser associado ao que, também, foi encontrado pela pesquisa do CAEd/UFJF (2009), que mostra a preferências dos gestores entrevistados pelos cursos em que “práticas” foram acrescidas a seu cabedal de conhecimento.

A pesquisa realizada pela OREALC/UNESC (2014) sintetiza as informações sobre as experiências de formação nos países observados por ela – Argentina, Ceará (Brasil), Chile, Colômbia, Equador, México, República Dominicana e Peru – da seguinte forma:

Si bien es un ámbito en que se están experimentando cambios, el área de formación y desarrollo del liderazgo directivo se presenta como unos de los ámbitos más débiles de la política para los directores escolares en los distintos casos estudiados. No existe en los sistemas escolares una política de formación que abarque los distintos niveles y etapas de la carrera directiva, y no se identifica a nivel global una oferta de formación articulada explícitamente con los estándares existentes en algunos países, o bien com determinadas orientaciones centrales – en caso de que estos no existan (OREALC/UNESCO, 2014, p. 91).

Não é o caso de prescindir da formação teórica ou de um escopo formativo mais amplo sobre as políticas públicas, análise de indicadores sociais e resultantes dos processos de avaliação, das concepções epistemológicas envolvidas nas escolhas sobre currículo, por exemplo. Mas, o desafio pode estar em associar esse conjunto de saberes ao exercício de planejamento, contando com o fato de que planejamento envolve também habilidades de concertação de vontades dentro da comunidade escolar, o que é condição da gestão democrática. É nessa direção que se dá o esforço realizado na UFJF nas experiências de formação de gestores.

FORMAÇÃO DE GESTORES NA UFJF

A Faced/UFJF, por meio do CAEd, dedica-se mais intensamente há seis anos à formação de gestores. Essa linha de atuação está relacionada à criação do primeiro Mestrado Profissional em Gestão e Avaliação da Educação Pública (PPGP), em novembro de 2010. Antes disso, porém, já havia duas frentes de formação de gestores, em cursos na modalidade de ensino a distância. Nessa instituição há um esforço de especialização na formação dessa categoria profissional, que envolve desde cursos de aperfeiçoamento, passando pela especialização e atingindo nível mais alto de qualificação com o Mestrado Profissional.

Um dos cursos oferecidos pelo CAEd foi o de Formação de Gestores da Educação Pública, para diretores de escolas e administradores educacionais em redes estaduais e municipais de ensino. O curso teve turmas em 2008 e 2009 e seus alunos concluíram a formação em 2011. Como membro da Rede Nacional de Formação Continuada do MEC, atendeu à demanda de formação das redes de ensino, encaminhada ao MEC quando da elaboração dos Planos de Ações Articuladas (PAR) em 2007. Essa formação foi oferecida via plataforma Moodle. Atendeu 1200 alunos na turma de 2008, distribuídos em 97 municípios brasileiros de vinte estados da Federação. A turma de 2009 contou com 1700 alunos em 94 municípios, dessa vez concentrados em seis estados. As cidades funcionavam como polos, em que coordenadores locais faziam a função de tutores locais. Eles auxiliavam os alunos no acesso à plataforma Moodle e organizavam os encontros presenciais.

Esta característica permitia que o curso fosse designado como semipresencial. A mediação dos conteúdos era feita por agentes de suporte acadêmico (ASAs), exercendo função de tutoria e planejamento. Atuavam com base na programação das disciplinas feita pelos professores formadores. O curso contava ainda com material didático impresso complementar, formado por textos produzidos por professores universitários especialistas nos vários temas abordados. Foi um primeiro ensaio de emprego dessa modalidade para a formação de gestores.

Outros dois cursos foram oferecidos pelo CAEd/Faced em nível de especialização. Um deles foi destinado a 3200 alunos, diretores escolares, administradores educacionais ou candidatos a essas funções, que faziam parte do Banco de Gestores da Secretaria de Educação do Estado do Ceará (SEDUC-CE). Também nesse caso o curso foi oferecido via plataforma Moodle, com materiais didáticos impressos complementares. A preparação das disciplinas era feita pelos professores formadores. A mediação dos conteúdos era de responsabilidade dos ASAs, profissionais vinculados ao CAEd e que atuavam em rede com tutores locais. Estes trabalhavam próximos fisicamente aos alunos, em cidades do estado do Ceará. Progressivamente as funções de mediação foram transferidas para os ASAs e foram atribuídas, aos tutores locais, tarefas de suporte aos discentes, na relação com o ambiente virtual de aprendizagem, como ocorria no já citado curso da SEB. O curso de especialização no Ceará teve início em maio de 2009 e duração até novembro de 2012. A longa duração para um curso de 360 horas se deveu à necessidade de adaptação do ritmo do curso ao fato de que os gestores estavam em serviço durante a formação. Essa é uma possibilidade que dificilmente teria se dado se não fosse um curso na modalidade semipresencial.

Esse curso foi oferecido, também, em uma segunda edição para 1.500 diretores de escola e técnicos da Secretaria de Estado da Educação de Goiás (SEDUC-GO).

Teve duração entre março de 2012 e março de 2014 e seguiu a mesma estrutura do curso oferecido no Ceará. A novidade nesses cursos foi a instituição de trabalhos de conclusão elaborados como planos de ação, propostas de intervenção nos locais de trabalho dos alunos, uma tentativa de associação entre teoria e prática.

Essas experiências podem ser comparadas a um laboratório para a instituição do PPGP Para mais informações pode ser acessado o sítio eletrônico http://www.mestrado.caedufjf.net/., stricto sensu, em 2010. O curso recebeu 123 alunos em 2010, 140 em 2011, 140 em 2012, 133 em 2013, 126 em 2014 e 147 em 2015. Recebeu alunos, nesse período, vindos das redes de ensino estaduais do Amazonas, Ceará, Bahia, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul; das redes de ensino dos municípios de Belo Horizonte (MG), Juiz de Fora (MG) e Limeira (SP), bem como do Distrito Federal; das universidades federais de Juiz de Fora e Viçosa (MG). Desse conjunto, em torno de 80% têm concluído sua formação com sucesso a cada turma.

Os alunos do PPGP cumprem a maior parte dos créditos do curso nos encontros presenciais de janeiro e julho na UFJF, nos períodos de março a junho e de agosto a novembro cursam as disciplinas pelo ambiente virtual de aprendizagem.

Na dissertação o aluno propõe um plano de ação educacional. Para isso, o mestrando destaca de sua realidade um caso a ser estudado e analisado e para o qual propõe uma solução, a partir da alternativa de tratamento ou por meio de uma forma de intervenção sobre a situação problema. Faz isso inspirado pela pesquisa acadêmica na área de Educação. A novidade está em reunir os produtos da pesquisa acadêmica e colocá-los a serviço da resolução de problemas que os gestores da educação enfrentam. Tenta-se, de certo modo, atender ao que as pesquisas revelam sobre a demanda de gestores em seu processo de formação: reunir teoria e prática.

Uma avaliação, por assim dizer, dessa experiência foi realizada pela pesquisa de Pardim e Maccari (2014). Parte de dissertação de mestrado em Administração pela Universidade Nove de Julho, de São Paulo, entrevistou a coordenação do PPGP e 80% dos alunos da primeira turma frequentes no momento da pesquisa.

Além de ser profissional e semipresencial, o PPGP é composto por um corpo docente multidisciplinar e interinstitucional, o que torna esse programa inovador em vários aspectos. Por apresentar tal característica, ele terá de arcar com o ônus de ainda não ter critérios orientadores que contemplem suas especificidades. Por outro lado, o programa tem o bônus de ser o primeiro com esse tipo de proposta, e, uma vez consolidado, poderá incentivar o surgimento de outros programas com características semelhantes.

(...) Os alunos, de modo geral, estão satisfeitos com o curso. Será necessário efetuar alguns ajustes, como reduzir ou reorganizar as disciplinas, visando focar no desenvolvimento da dissertação; bem como promover ações para incentivar a produção científica, técnica e tecnológica aos discentes (PARDIM; MACCARI, 2014, p. 580).

O curso ainda tem uma curta trajetória. Passou por uma primeira avaliação da Capes e terá a segunda avaliação em 2017. Com todas as características de inovação que tem, reúne desafios: corpo docente grande e multidisciplinar, a modalidade semipresencial, corpo discente numeroso e vindo de várias redes de ensino brasileiras (municipais, estaduais e federal) e alunos-profissionais que atuam em diferentes níveis da educação (básica e superior). É uma experiência que merece ser acompanhada de modo a buscar contribuições para a formação de gestores escolares.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

A reflexão desenvolvida neste trabalho ocorre após o lançamento pelo MEC do Programa Nacional de Formação e Desenvolvimento Profissional de Diretores Escolares (BRASIL.MEC, 2015).

As pesquisas que apresentamos podem servir para inspirar os formuladores de políticas e seus implementadores a seguirem buscando alternativas de formação para os gestores da educação, especialmente diretores de escola, que atendam as demandas da melhoria da qualidade da educação e do exercício de uma liderança compartilhada com a equipe escolar. A participação das redes de ensino aliada ao conhecimento acumulado pelas pesquisas acadêmicas sobre o tema há de inspirar políticas de valorização e formação dos gestores escolares em escala mais ampla pelo Brasil.

Os resultados das pesquisas que buscaram a avaliação dos diretores sobre processos formativos pelos quais passaram mostram que a associação entre teoria e prática é observada como algo novo e positivo. O aprendizado que age sobre a prática, que colabora para a solução de problemas concretos da atuação do gestor escolar, é bem-vindo. O emprego da modalidade semipresencial, momentos de trocas de experiências em encontro presenciais e processos de comunicação que se valham de tecnologias de informação em ambientes virtuais de aprendizagem, mais a criação de oportunidades de exercício de planejamento, de solução de problemas, de busca do conhecimento acadêmico para o fortalecimento da gestão democrática – esses são elementos que as experiências aqui relatadas sugerem como produtivos para a formação de gestores escolares. Os meios sugeridos podem ser eficazes em oferecer oportunidades de formação de lideranças.

Esses elementos deveriam ser considerados pelo novo Programa do MEC. É necessário investir em política formativa para a melhoria das ações nas escolas brasileiras neste tempo em que todos os profissionais da educação são confrontados com o papel importante de fazer cumprir as metas do Plano Nacional de Educação, aprovado em 2014, o que continua a entrelaçar a ampliação da oferta de cursos de formação de gestores à qualidade em todos os níveis da educação brasileira. As universidades públicas podem colaborar sobremaneira para esse esforço.

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