CURSOS DE LICENCIATURA NA REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL? A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NOS INSTITUTOS FEDERAIS
Resumo: Este trabalho é parte de uma pesquisa em andamento que investiga a implementação dos cursos de licenciatura no Instituto Federal do Tocantins visando identificar a configuração da política institucional de formação de professores adotada por essa instituição e desvelar a concepção de formação de professores da Rede Federal de Educação Profissional. A pesquisa está sendo pautada em estudos bibliográficos, documental e de campo com alunos, professores e gestores, com a finalidade de compreender o ciclo dessa política. Como resultados provisórios, os estudos apontam a necessidade de refletir sobre a formação de professores ofertada nos institutos federais para que esses cursos não se reduzam à formação do especialista da área do conhecimento, em detrimento da formação pedagógica.
Palavras-chave: institutos federais; educação profissional; formação de professores.
INTRODUÇÃO
A formação de professores sempre foi alvo de debates no cenário acadêmico e motivo de diálogos e reflexões nas diversas instituições que lidam com educação. De modo geral, a população brasileira fazendo parte ou não da categoria de trabalhadores em educação, emite opiniões sobre os rumos da educação e da escola, de maneira mais particularizada, apontando, na maioria das vezes, os que representam o “chão da escola” (diretores e professores) como os principais responsáveis pelo fracasso escolar.
Em muitas ocasiões ouvimos populares e a mídia nacional discutirem a educação como política pública fruto de encadeamentos maiores, ou melhor, como a “grande política”, isto é, aquela que se propõe a discutir os alicerces da ordem social, capaz de promover transformação ou conservação das estruturas sociedade. Na maioria das vezes, o assunto fica reduzido às compreensões parciais do cotidiano.
Com o objetivo de contribuir com o debate, está em andamento uma pesquisa em nível de doutorado que investiga o processo de expansão e implementação dos cursos superiores em educação nos institutos federais (IF), tomando como objeto de análise os cursos de licenciatura do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Tocantins (IFTO), na perspectiva de identificar a configuração da política institucional de formação de professores adotada por essa instituição, bem como desvelar a concepção de formação de professores da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica.
De modo mais específico, a pesquisa pretende conhecer as motivações que justificam a origem dos cursos de licenciatura ofertados pelo IFTO; investigar a configuração desses cursos, a partir de suas características pedagógicas, curriculares e administrativas, considerando suas naturezas e finalidades; descrever e correlacionar à integralização das disciplinas de saberes epistemológicos, dos fundamentos da educação às disciplinas de formação específica da área de conhecimento, examinado as convergências e os distanciamentos entre elas.
Parte-se do princípio de que para a oferta de um curso é preciso, inicialmente, estudos sobre sua demanda para em seguida promover sua organização administrativa e pedagógica, a definição do currículo e das componentes curriculares, a estruturação do corpo docente, o aparelhamento da unidade acadêmica e demais providências que possam contribuir e influenciar o processo formativo desses futuros professores.
O CONTEXTO DA PESQUISA E A ELEIÇÃO DO TEMA
No ano de 2008, o Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou a Lei 11.892, criando os novos institutos federais de educação, ciência e tecnologia. Desde então, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Tocantins (IFTO), passou a constituir uma das unidades da Rede Federal de Educação Profissional, tornando-se uma instituição pluricurricular e multicampi, especializada na oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino.
A partir dessa legislação, o IFTO passou a disponibilizar 50% de suas vagas para ministrar educação profissional integrada ao ensino médio, aos concluintes do ensino fundamental e para o público da educação de jovens e adultos, 20% das vagas destinadas aos cursos de licenciatura e programas especiais de formação pedagógica e os outros 30% das vagas destinadas a outros níveis de ensino.
Atualmente o IFTO é constituído por oito Campi distribuídos em Araguatins, Araguaína, Paraíso do Tocantins, Porto Nacional, Colinas do Tocantins, Dianópolis, Gurupi, e Palmas, além de três Campi Avançados situados em Pedro Afonso, Formoso do Araguaia e Lagoa da Confusão.
Se anteriormente a maioria das escolas técnicas ofertava predominantemente o ensino médio técnico, com a Lei 11.892/2008, passaram a ofertar diversos cursos, abrangendo o ensino médio integrado à educação profissional, cursos tecnológicos de nível médio e superior, cursos de educação de jovens e adultos, na modalidade da educação profissional, cursos de graduação, contemplando licenciatura e bacharelado e cursos de pós-graduação em nível de especialização, mestrado e doutorado, além dos cursos de educação a distância como atividades regulares, alterando radicalmente a estrutura organizacional e pedagógica dessas instituições (OLIVEIRA, 2012).
O Instituto Federal do Tocantins oferta dez cursos de licenciatura assim distribuídos: Campus de Araguatins, Licenciatura em Ciências Biológicas e Computação; Campus de Paraíso, Licenciatura em Química e Matemática; Campus de Gurupi, Licenciatura em Artes Cênicas; Campus de Porto Nacional, Licenciatura em Computação e Campus Palmas, com os cursos de Licenciatura em Física, Matemática, Letras e Educação Física. Esses Campi e cursos constituem o locus de investigação da pesquisa.
Para a finalidade desse estudo foram considerados os cursos de licenciatura criados entre 2009 a 2013, uma vez que esse recorte temporal abrange o período da criação dos institutos federais, e ainda, articula-se com que preceitua o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) do IFTO, desenvolvido para o período de 2010-2014.
Os questionamentos que fundamentam este trabalho são desdobramentos da trajetória desenvolvida durante o curso de mestrado realizado na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, cujo foco central foi a análise da criação do curso técnico em Gestão do Agronegócio ofertado pelo IFTO - Campus Palmas.
À época, essa investigação revelou a falta de clareza, por parte de gestores e professores, quanto ao perfil do profissional que se desejava formar; a desvinculação do curso em relação ao mercado de trabalho; a dissociabilidade do ensino, pesquisa e extensão na formação profissional; a ausência de integração curricular de forma contextualizada e interdisciplinar das áreas de formação geral e formação profissional; a ausência de aulas e/ou atividades práticas impossibilitando a vivência da teoria estudada e o indício de que a criação do referido curso não se deu a partir de uma demanda específica, mas foi motivada para atender aos interesses de um grupo de professores e gestores, no contexto do processo de expansão da Rede Federal de Educação Profissional (OLIVEIRA, 2012).
Foi durante o percurso desta pesquisa realizada em nível de mestrado, da vivência como professora do IFTO e como membro da coordenação de gestão de processos educacionais do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), que cresceu o interesse e a necessidade de conhecer o processo de expansão dessa Rede e, sobretudo, o modus operandi utilizado para a implementação dos cursos de licenciatura no IFTO, suas complexidades e seus reflexos na formação dos professores tocantinenses.
Desse modo, na investigação do problema de pesquisa ganharam pertinência os seguintes questionamentos: quais características assumem os cursos de licenciatura ofertados no IFTO e como se configura a proposta institucional de formação de professores adotada pelo Instituto Federal do Tocantins? Que variáveis norteiam essa política institucional? Que motivos explicam a criação dos cursos superiores em educação implementados neste Instituto e em que condições foram criados? Quais as condições de funcionamento desses cursos de licenciatura, no que se refere à estrutura física e pedagógica? Como os Campi foram aparelhados para a oferta de tais cursos? Como se dá a integralização das disciplinas de saberes epistemológicos, fundamentos da educação às disciplinas de formação específica à área do conhecimento? Como se articula a tríade ensino, pesquisa e extensão? Qual é o perfil dos professores formados pelo IFTO?
A relevância das respostas aos questionamentos estabelecidos acima está pautada em sua contribuição social no que tange a uma melhor compreensão dos aspectos que permitirão identificar e justificar as características do processo de expansão dos cursos de licenciatura do IFTO, desvelando sua origem, sua natureza, suas complexidades, suas finalidades e a política de formação de professores adotada por essa unidade e pela Rede Federal de Educação Profissional.
AS ESTRATÉGIAS DE INVESTIGAÇÃO
A pesquisa em curso acerca da expansão e implementação dos cursos de licenciatura ofertados no IFTO está sendo realizada a partir de uma série de procedimentos metodológicos. A primeira etapa de trabalho consistiu no levantamento bibliográfico de dissertações, teses e demais produções acadêmicas com o propósito de identificar o acervo científico sobre esse tema, para fins de estudo e análise comparativa.
Em seguida, o reconhecimento dos documentos da Rede Federal de Educação Profissional que orientam os procedimentos para a criação dos cursos superiores (leis, decretos, resoluções, pareceres). E por fim, o levantamento e análise dos documentos institucionais produzidos pelo Instituto Federal do Tocantins, entre os quais, o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), elaborado para o período de 2010-2014, Projeto Pedagógico Institucional dos Campi e o Plano Pedagógico Curricular (PCC) dos cursos de licenciatura destacados anteriormente.
Somente após análise dessas informações é que será possível uma visão global acerca da expansão da Rede Federal de Educação Profissional no estado do Tocantins e o modus operandi da criação dos cursos de licenciatura no IFTO, de modo a subsidiar as demais etapas de investigação.
Tanto o PDI quanto o PPC serão analisados à luz do roteiro elaborado pela Profª. Drª. Ana Maria Eyng, da Pontifícia Universidade do Paraná, que estabelece a análise a partir de quatro dimensões: a primeira é a contextual, que abrange a trajetória histórica, a articulação escola-sociedade-curso, as características do macro contexto local e global e caracterização do curso. A segunda dimensão, conceitual, contempla os princípios, valores da educação, a missão educativa, a linha epistemológica, os fundamentos epistemológicos, sociológicos, antropológicos, psicológicos e pedagógicos e a concepção de educação. A terceira é a dimensão operativa que pressupõe as etapas formativas ofertadas, as características da aprendizagem por etapa/curso, perfil do egresso, perfil e atuação de professores, coordenadores e técnicos administrativos, a organização curricular, as diretrizes avaliativas e a estrutura organizacional. Por último, a dimensão avaliativa que analisa desde o curso no âmbito do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (Sinaes), à avaliação da e na Instituição, do e no curso e nas componentes curriculares (EYNG, 2002).
Em relação à organização e a integralização das disciplinas dos cursos, será adotada a categorização elaborada por Gatti e Nunes (2009) quando realizaram uma pesquisa que analisou os currículos de cursos de licenciatura em pedagogia, língua portuguesa, matemática e ciências biológicas de diversas universidades brasileiras.
Para essa análise, esses pesquisadores criaram sete categorias: os fundamentos teóricos da educação, os conhecimentos relativos aos sistemas educacionais, os conhecimentos específicos da área de formação, os conhecimentos específicos para a docência, os conhecimentos relativos às modalidades e níveis de ensino específicos, outros saberes que congregam disciplinas que ampliam o repertório do professor e a pesquisa e trabalho de conclusão de curso (TCC).
A segunda etapa da pesquisa constituirá na aplicação de questionários e realização de entrevistas semiestruturadas com os sujeitos que constituem o objeto da pesquisa, ou seja, gestores, professores e alunos.
Em relação aos gestores e professores, os questionamentos objetivam compreender se as condições de criação e estruturação física e pedagógica contribuem e/ou interferem na formação dos licenciandos e, ainda, identificar qual a concepção desses gestores e docentes em relação à formação de professores realizada no IFTO.
Quanto aos alunos, espera-se apreender a percepção dos mesmos sobre a estrutura física do Campus, a estrutura curricular do curso e a integração entre as disciplinas, as práticas pedagógicas adotadas, a relação entre ensino, pesquisa e extensão, o projeto de estágio supervisionado, a percepção quanto à qualidade da formação e sua preparação para atuar na docência. É importante ressaltar que embora constituam campos de descrição distintos, participantes, contexto e pesquisa se relacionam constantemente.
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA: ANÁLISES PRELIMINARES
Autores como Pimenta (2002), Gatti (2010, 2012), Nóvoa (1995), Alarcão (2003), Saviani (2009), reforçam o debate sobre a carreira e identidade do professor, dando destaque aos seus fundamentos epistemológicos e teórico-metodológicos, aos saberes que constituem a docência, subsidiando as reflexões sobre a prática pedagógica.
Para Saviani (2009), a formação de professores no Brasil precisa superar vários dilemas que influenciam diretamente sob a qualidade do ensino no país. Exige uma discussão que “não pode ser dissociada do problema das condições de trabalho que envolvem a carreira docente, em cujo âmbito devem ser equacionadas as questões do salário e da jornada de trabalho” (p.153).
Segundo o autor, além de “garantir uma formação consistente para assegurar condições adequadas de trabalho” (p. 153) ao professor, é necessário também, a transformação da “docência numa profissão atraente socialmente em razão da sensível melhoria salarial e das boas condições de trabalho” (p.154).
Gatti (2012), afirma que as pesquisa relacionadas aos cursos de licenciatura, há décadas apresentam lacunas e evidenciam problemas quanto à efetiva contribuição para a formação inicial de professores da educação básica, entretanto, a autora afirma que mesmo com tantas informações,
[...] as gestões educacionais e as universidades têm apenas proposto reformulação deste ou daquele aspecto desses cursos, não tocando no âmago da questão tão bem salientado nas análises: sua estrutura institucional e a distribuição de seus conteúdos curriculares. Resta em aberto a questão do por que mudanças profundas não ocorrem nesses cursos. A intencionalidade posta nos documentos e regulamentações é alentadora, mas, fica ainda a questão política a enfrentar: qual a força política dos gestores para implementar reais e fortes mudanças institucionais e curriculares no que respeita à formação de professores? (p. 13)
Nas palavras de Gatti (2010, p. 1375),
no que concerne à formação de professores, é necessária uma verdadeira revolução nas estruturas institucionais formativas e nos currículos da formação. As emendas já são muitas. [...] É preciso integrar essa formação em currículos articulados e voltados a esse objetivo precípuo. A formação de professores não pode ser pensada a partir das ciências e seus diversos campos disciplinares, como adendo destas áreas, mas a partir da função social própria à escolarização – ensinar às novas gerações o conhecimento acumulado e consolidar valores e práticas coerentes com nossa vida civil.
A autora ressalta que a fragmentação na formação de professores é bastante clara e que os cursos de licenciatura ainda mantém uma forte tradição disciplinar que privilegia o direcionamento à preparação do especialista com domínio de conteúdos específicos da área de conhecimento, mas trata com menos atenção os saberes pedagógicos que fundamentam o exercício da docência.
Sobre essa questão, Nóvoa (1995) ressalta que a formação de professores não se constrói por processos de acumulação de conhecimentos ou de técnicas, mas, sobretudo, a partir das reflexões crítica sobre as práticas pedagógicas e experiências profissionais, que vão alicerçando a identidade profissional do educador.
Ao fazer uma retrospectiva sobre a história da Educação Profissional no Brasil, detecta-se em diversos momentos, discussões voltadas à responsabilização da Rede Federal quanto à tarefa de formação de professores, apresentando em alguns períodos experiências para a formação de docentes, especialmente aos que trabalhavam com ensino técnico, ou seja, bacharéis, sem formação pedagógica.
Todavia, essa prerrogativa tornou-se real quando da promulgação da Lei 11.892, que cria os novos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, com proposta de ofertar 50% das vagas à educação profissional de nível básico e médio, 20% para cursos de licenciatura e programas especiais de formação pedagógica e os outros 30% podendo ser destinado a outros níveis de ensino.
Tais definições legais devem ser analisadas no sentido de compreender os processos de implantação de cursos de formação de professores nos institutos federais, com a finalidade de identificar se há contradições presentes nestas políticas educacionais que se relacionam às políticas de formação docente e aos férteis debates nacionais sobre essa questão.
Dentre os estudos bibliográficos realizados acerca desse tema em específico, destaca-se a tese de doutoramento da pesquisadora Maria Adélia Costa, intitulada “Políticas de formação de professores para a educação profissional e tecnológica: cenários contemporâneos”, que teve como objetivo refletir sobre as políticas de formação de professores para a Educação Profissional e Tecnológica.
Nesse estudo, a autora partiu do pressuposto de que as propostas direcionadas à educação profissional estão restritas a programas de governo emergenciais, reducionistas e imediatistas, constituindo-se em marcos regulatórios que não se materializaram em políticas de Estado. Com base nisso, afirmou que esse contexto tem flexibilizado a inserção de profissionais não docentes nas salas dos cursos técnicos e ensino médio integrado a formação profissional.
Além de investigar as políticas de formação de professores para atuarem na educação profissional, a pesquisadora acrescentou em seu estudo a importante análise da “obrigação legal” impostas aos institutos federais, quanto à oferta de cursos de licenciatura. Os argumentos de que esses cursos destoam da vocação histórica da rede de educação profissional e que não há “sentido” da oferta de cursos de licenciatura em uma Rede que regulamenta e flexibiliza a formação e a prática docente por profissionais que não são professores, apresentam-se como elementos de análise e reflexão acerca da “missão” e da nova institucionalidade dos IF (COSTA, 2012).
Em outra pesquisa sobre formação de professores nos institutos federais, Lima (2012) observou que os IF têm atendimento às orientações do Ministério da Educação quanto à oferta de cursos priorizando as áreas de Ciência e Matemática, especialmente em licenciaturas em física, química, biologia e matemática.
Contudo, a autora demonstrou que essas áreas já eram contempladas por outros espaços formativos, o que implica em dizer que os modelos adotados nesses cursos no âmbito dos institutos federais, não representam nenhuma novidade, criando-se uma falsa ideia de que o déficit de professores nessas áreas prioritárias está sendo sanado.
Lima (2012) concluiu que o processo de formação de professores na Rede Federal de Educação Profissional tem sido marcado por contradições, tendo em vista que, ao mesmo tempo em que contempla a proposta de expansão da Rede, está apoiada na defesa de uma formação pragmática idealizada pelo Estado neoliberal, sendo necessário por essa razão, um esforço coletivo dos órgãos centrais de educação em repensar os processos de formação dos professores.
Nos estudos desenvolvidos por Pansardi (2013), evidenciou-se que a formação de professores realizada na Rede Federal de Educação Profissional, tem seguido a mesma lógica de formação rápida e flexível. Segundo ele, a abertura dos cursos de licenciatura foi marcada pelo “aproveitamento do quadro docente pré-existente, sem desenvolver um quadro específico para as licenciaturas; com uma implantação aligeirada, com baixo investimento em bibliotecas e laboratórios específicos” (p.15), resultando, como consequência disso, na impossibilidade do desenvolvimento de projetos de pesquisa e extensão significantes para os cursos de licenciatura.
Gomes (2013) ao investigar a implantação de cursos de licenciatura no Instituto Federal do Norte de Minas Gerais, apontou que a reforma da Educação Profissional e a criação dos institutos federais, provocaram marcas profundas na instituição, tendo em vista o déficit de profissionais e de estrutura capaz de atender, satisfatoriamente, aos diversos programas governamentais sob sua responsabilidade.
Embora a pesquisadora destaque a relevância do processo de expansão da Rede, o novo formato imposto aos institutos federais, provocou a perda “temporária” da identidade secularmente constituída na excelência da formação do trabalhador, revelando condicionantes favoráveis, mas também obstáculos significativos quanto à criação dos cursos de licenciatura, que influenciaram na qualidade de tais cursos.
Também, em pesquisa produzida por docentes do Instituto Federal de Farroupilha foram selecionados 63 projeto pedagógicos de cursos de licenciatura dos institutos federais de todo Brasil com objetivo de caracterizar a formação de professores nos IF. Entre os resultados, verificou-se
[...] a falta de articulação entre as disciplinas de formação específica (conteúdos da área disciplinar) e a formação pedagógica (conteúdos para a docência); que os saberes relacionados a tecnologias no ensino estão praticamente ausentes e a existência de uma carga horária expressiva nos currículos dedicadas a atividades complementares, seminários, ou atividades culturais, entre outras, porém sem uma definição clara de como estas são desenvolvidas.
Observou ainda que raras instituições especificam em que consistem os estágios e sob que forma de orientação são realizados, não encontrando uma explicitação clara de como acontecem as práticas exigidas pelas diretrizes curriculares (LAMB; WELTER; MARCHEZAN, 2014, p.8).
Os resultados dessas pesquisas e de outros estudos sobre esse tema reforçam a necessidade de que novas investigações sejam produzidas para que se possa acompanhar o desenvolvimento do ciclo dessa política, percorrendo desde a composição da agenda, à sua formulação, implementação e avaliação.
Considera-se, portanto, que ao revelar as razões que motivaram a implantação dos cursos de licenciatura do IFTO e ao conhecer as características pedagógicas, administrativas e curriculares estruturais, será possível avaliar a configuração dessa política na instituição e contribuir com o debate sobre a formação de professores no Instituto Federal do Tocantins.
CONCLUSÕES PROVISÓRIAS
A formação de professores no Brasil constitui-se ainda um enorme desafio para o poder público, universidades, entidades educacionais e sociedade civil, por se tratar de uma tarefa bastante complexa, que não pode ser dimensionada a partir da adoção de esquemas e medidas simplistas e pouco eficientes.
Embora saibamos que a questão da formação de professores não resolve as mazelas do sistema de ensino brasileiro, é preciso repensar esses modelos de formação que ora centram-se nos conteúdos de conhecimento, ora centram-se nos procedimentos didático-pedagógicos.
Ainda que a política de formação de professores pela Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, estabelecida legalmente após a criação dos institutos federais seja recente, os estudos teóricos têm revelado que sua implantação tem se dado esvaziada de debates profícuos quanto às relações entre educação, trabalho, capital e sociedade.
Os estudos têm apontado também para a necessidade de refletir sobre os cursos de formação de professores no Brasil, de modo geral, e de maneira mais específica, para a configuração dos cursos implantados nos institutos federais de modo a evitar que seja priorizada a formação do especialista em determinadas áreas do conhecimento, em detrimento da formação didático-pedagógica do licenciando.
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