A CONCEPÇÃO DE GESTÃO NA POLITICA MUNICIPAL DE JOÃO PESSOA: UM ESTUDO SOBRE O PRÊMIO ESCOLA NOTA 10

Resumo: Este artigo intitulado A concepção de Gestão na Política Municipal de João Pessoa: um estudo sobre o Prêmio Escola Nota 10 analisa uma experiência em avaliação educacional cujo objetivo é analisar a concepção de gestão da educação no Programa Prêmio Escola Nota 10. O texto está organizado em: introdução, parte na qual apresentamos ideias gerais; a Geração da Política tópico em que apresentamos a emergência das políticas de avaliação educacional e os reflexos nas esferas Estadual e Municipal; o contexto da produção do texto onde se analisa a concepção de Gestão da Educação no Prêmio Escola Nota Dez a partir dos folders de divulgação; nas considerações finais refletimos sobre os limites e avanços da Política Educacional de Avaliação em João Pessoa/PB.

Palavras-chave: Política Educacional; Gestão da Educação; Avaliação Educacional


1. Introdução

Esse artigo busca nutrir o debate sobre as atuais políticas educacionais de avaliação centralizando-se na análise da iniciativa elaborada pelo Órgão Gestor da Educação Municipal de João Pessoa/PB no período de 2009 a 2011, objeto de pesquisa do mestrado em educação. Neste texto nosso objetivo é analisar a concepção de Gestão da Educação no Programa Prêmio Escola Nota 10 decorrente da Política Educacional do Município de João Pessoa.  A experiência de avaliação externa investigada foi institucionalizada por meio do Decreto Municipal nº 11. 607/2008 de 23 de dezembro de 2008 que cria o Prêmio Escola Nota 10, quando o Programa de Avaliação do município de João Pessoa também a ser discursivamente conhecido como Prêmio. O Programa é composto por um conjunto de indicadores que buscam capturar informações sobre as práticas dos/as O presente texto estará observando o uso da linguagem inclusiva de gênero, em especial, porque a escola é uma instituição social majoritariamente conduzida por mulheres, principalmente nas primeiras etapas da educação básica: educação infantil e ensino fundamental I. gestores/as escolares, dos/as docentes e o rendimento escolar dos/as discentes, composto por: uma prova de conhecimentos (para os/as alunos/as do Ensino Fundamental), formulários de acompanhamento/monitoramento das práticas administrativas e pedagógicas dos/as gestores/as escolares e dos/as docentes.

Neste artigo analisaremos o contexto em que a política foi construída, os indicadores e instrumentos voltados para avaliar a gestão escolar do Prêmio Escola Nota 10 no período que compreende os anos de 2009 a 2011. Enfocaremos a geração da política, o texto que traduz a política, orienta e avalia as práticas de gestão. O referido texto foi organizado na seguinte sequência: 1) introdução, esta parte na qual apresentamos ideias gerais sobre a temática a ser discutida, apresentando nossas intenções ao/a leitor/a; 2) a Geração da Política (o contexto da regulação e influência), tópico em que apresentamos a emergência das políticas de avaliação educacional, destacando as principais características por períodos e os reflexos destas políticas nas esferas Estadual e Municipal; 3) O contexto da produção do texto: onde se analisa a concepção de Gestão no Prêmio Escola Nota Dez a partir dos registros contidos nos folders de divulgação; as considerações finais, momento no qual refletimos sobre os limites e avanços da Política Educacional de Avaliação de João Pessoa/PB mensurada no Prêmio Escola Nota 10.

Conforme mencionado, o Prêmio Escola Nota 10 é a bonificação do Programa de Avaliação resultante da Política Educacional de Avaliação do Município de João Pessoa que intencionava induzir o desenvolvimento de habilidades e competências dos gestores/as, docentes e discentes, e cujo modelo apresenta semelhanças no que vem sendo denominado por estudiosos da área como Avaliação Educacional. Estudiosos como Afonso (2005), Freitas (2009) consensuam que iniciativas desta natureza tem sido recorrentemente utilizadas como parte do julgamento das atividades que são planejadas e executadas no processo de ensino aprendizagem, configurando-se como um fenômeno contemporâneo no âmbito das Políticas Educacionais. A Avaliação Educacional ou Externa, após sucessivas experiências, recentemente tem apresentado modelos que, além de uma estrutura de grande alcance, possui em seu conjunto objetivos definidos de acordo com o nível e modalidade de ensino, para o qual se criam instrumentos de captura de informações de diferentes setores da escola.

A experiência brasileira em Avaliação Educacional inicia-se concretamente na década de 1990 com a institucionalização do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) composto atualmente por três avaliações externas em larga escala: Avaliação Nacional da Educação Básica – Aneb; Avaliação Nacional do Rendimento Escolar – Anresc, também conhecida como Prova Brasil e a Avaliação Nacional da Alfabetização – ANA, que passa a ser realizada em 2013, criada com a instituição do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, em 2012. Em 1998, foi instituído o Exame Nacional Ensino Médio - Enem Criado em 28 de maio, de 1998, através da Portaria nº 438, do Ministério da Educação – MEC. Tal exame passaria por novo ajuste em 18 de junho de 2010, através da Portaria nº. 807 do MEC.. Em 2002, cria-se o Exame Nacional de Certificação de Competências de Jovens e Adultos – Encceja.

Conforme Freitas (2005), a criação desses instrumentos nacionais de avaliação vai gerar iniciativas regionais, geralmente protagonizadas pelos Órgãos Gestores dos Estados, a exemplo de São Paulo (1992/1996), Ceará (1992, 1994, 1996, 2000, 2001), Minas Gerais (1992/2000), Paraná (1995), Distrito Federal (1998), Bahia (1999), Roraima (2000). Assim, como uma resposta em cadeia, observou-se nos municípios um crescimento no uso desses exames, alguns reproduzindo a experiência dos seus Estados, outros criando seu próprio modelo, como no caso de João Pessoa que instituiu o Prêmio Escola Nota 10 que compõe o Programa de Avaliação Educacional, objeto de estudo deste artigo.

Nos tópicos seguintes passamos a tratar dos demais pontos que estruturam a proposta de comunicação, começando no próximo item com a apresentação resumida dos contextos que embasaram a construção da perspectiva de Avaliação Educacional que acabou se transformando no pilar da Política Brasileira de Educação.

2. A Geração da Política: o contexto da influência e da produção de texto

Os contextos em que a Política de Avaliação Educacional vem se consolidando como questão de interesse governamental é essencial para refletirmos sua trajetória. Evidências registradas no estudo desenvolvido por Freitas (2007) dão conta de que as primeiras iniciativas de construir um instrumento avaliativo, capaz de capturar informações, ocorreram em 1930. Inicialmente marcada pelo interesse estatístico de compilar dados quantitativos sobre a educação e, posteriormente pelo desenvolvimento da pesquisa educacional. Sua evolução é registra da por Freitas (2007) em 3 distintos períodos: a) “a emergência da ‘medida-avaliação’ na pesquisa em educação”; b) “instituição da medida-avaliação-informação como norma de uma Nova Regulação Educacional”; c) período nomeado como o “Estado-Educador brasileiro e sua atuação como Estado-Avaliador” (FREITAS, 2007, p. 133).

O primeiro período caracterizado como Emergência da medida-avaliação na Pesquisa em Educação demonstra que as iniciativas de implantação de mecanismos de avaliação buscavam manter o Estado atualizado no sentido do registro dos dados relativos ao movimento de escolarização. A mencionada autora sustenta sua hipótese nas afirmações de Lourenço Filho em conferências ocorridas entre 1938 a 1940, eventos nos quais ele expressa a ideia de que

Os mais altos valores humanos admitem comparação, subordinação, hierarquia. Ou admitiremos séries contínuas de suas expressões, que poderão ser verificadas no indivíduo, confrontado com grupos, como rendimento, ou só teremos para orientação no trabalho educativo o arbitrário ou a fantasia... (LOURENÇO FILHO apud FREITAS, 2007 p. 9).

A construção de instrumentos surge em função das necessidades da época onde a conhecer a realidade, criar uma cultura de “consciência técnica” e fazer diagnósticos passou a ser vista como subsídio para a construção de políticas públicas educacionais coerentes com a realidade socioeducacional. Ao citar o estudo de Sandra Zákia Sousa Freitas (2007) diz que sua pesquisa constatou que na segunda metade da década de 1980 a avaliação começou a ganhar sentido para a escola, pois passou a ser utilizada para direcionar intervenções que garantissem a aprendizagem. Neste período denominado como Instituição da Medida-Avaliação-Informação, uma nova Regulação Nacional passou a ser balizadora da pela criação, institucionalização, desenvolvimento e consolidação do SAEB.

O período demarcado entre 1988-2002 revela uma conjugação de esforços e recursos para a instalação de um mecanismo capaz de medir, avaliar e informar e também contribuir para a efetivação da reforma da gestão da Educação Básica, para isso várias iniciativas foram experimentadas com vistas de, num futuro próximo, engendrar condições para que o Estado Regulador e Avaliador A partir da década de 1980 o interesse demonstrado pela avaliação, sobretudo por parte de governos neoconservadores e neoliberais, passou a ser exercido por força normativa, com vistas a responsabilização. Essa ação começou a ser traduzida pela expressão “Estado Avaliador” (NEAVE, 1988; HENKEL, 1991; O’ BUACHALLA, 1992; HARTLEY, 1993). viesse se efetivar. Mobilizados em alcançar esses objetivos, concomitantemente, outras ações políticas, institucionais, técnicas, administrativas e operacionais foram desencadeadas para que a mudança de paradigma fosse concretizada, dentre elas, cuidou-se de estabelecer normas jurídico-legais e político-administrativas que garantissem o sucesso das mudanças pretendidas na regulação educacional (CASTRO, 1989).

Do ponto de vista jurídico-legal, a condução acelerada de produção de leis concorreu para estabelecer e consolidar mecanismos de avaliação por intermédio da “força normativa” do Estado; na verdade, é a força desencadeada pela lei que instaura um cenário onde a avaliação passa a ter um lugar essencial nas políticas públicas. Outras interferências, como as interlocuções com Organismos Internacionais, estão associadas às regulações da época, entretanto, não é nosso foco e nem temos espaço aqui para dialogar sobre o tema. Todavia, os interesses locais por metodologias que pudessem respaldar com veracidade e cientificidade a realidade educacional associada às pressões de modernização do Estado para forçar mudanças nos sistemas educativos nacionais, as avaliações externas foram assumidas pelo Estado Nacional. Nesse sentido, a relação do Estado na administração e governo da sociedade introduz um sentido que desloca da tradicional “regulação legal-burocrática para a “regulação avaliativa conjugada a informação educacional” cuja acepção redefinirá a relação entre Estado, educação e sociedade” e, nomeadamente, dará inicio a 3º fase, denominada “Estado-Educador brasileiro e sua atuação como Estado Avaliador”, para caracterizar o período mais recente da avaliação (FREITAS, 2007, p. 168).

A referida autora acentua o sentido educativo apropriado pelo Estado educador na busca promover mudanças técnicas e culturais por meio de mecanismos que funcionam pedagogicamente, difundindo valores e disciplinando as práticas educativas. Para Afonso (2005) o Estado, ao utilizar-se das avaliações externas, passa a adotar um ethos competitivo, neodarwinista, admitindo “a lógica do mercado através da importação para o domínio publico de modelos de gestão privada, com ênfase nos resultados ou produtos dos sistemas avaliativos” (AFONSO, 2005, p.49).  Essa condição da avaliação está associada a uma gestão que segue uma lógica gerencial na qual a participação, eficiência e resultado, viabilizam a implantação de um novo paradigma ou, como diz Freitas, uma “nova arte” de gestão pública, permeada por ideologias que darão suporte para que o Estado organize iniciativas voltadas para “a experiência pedagógica formadora (educativa) de gestores, técnicos, professores e cidadãos da sociedade em geral nos moldes da cultura gerencial” (FREITAS, 2007, p. 63).

O Estado passa a ser indutor da utilização da avaliação como mecanismo de imposição de uma ideologia gerencial reguladora balizada em princípios como: modernização da gestão, flexibilidade administrativa e controle hierárquico gerencial. No subtítulo seguinte veremos que essas características marcantes dos períodos analisados se refletiram na Esfera Estadual e Municipal.

2.1 A Regulação e influência da Política de Avaliação Educacional nos Estados e Municípios

Os marcos legais da educação brasileiras: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1996), o Plano Nacional de Educação (Lei. 17.002/2001) e, principalmente, pelo Plano de Desenvolvimento da Educação afirmam-se como balizas importantes para as Políticas Nacionais de Avaliação por exercerem sua função reguladora. Juntamente com esses marcos, na década de 1990 uma série de eventos veio contribuir com essa função, entre os quais destacamos: Seminário Nacional sobre Medidas Educacionais, que aconteceu de 24 e 25/06/1992, sob a organização do INEP/MEC e com o apoio do PNUD; Seminário sobre Educação Fundamental e Competitividade Empresarial, ocorrido de 3 a 4 de agosto do mesmo ano, realizado pela Secretaria Nacional de Educação Básica/MEC, juntamente com o Instituto Herbert Levy e a Fundação Cesgranrio; também no mesmo ano, o IX Encontro Nacional de Dirigentes dos Órgãos do Sistema estatístico da Educação; o Seminário Internacional de Avaliação Educacional realizado de 16 a 18 de outubro de 1995; o Seminário Internacional sobre Avaliação do Ensino Médio e Acesso ao Ensino Superior, de 30 de junho a 02 de julho de 1997; o Seminário Internacional de Avaliação Educacional, em dezembro de 1997 e; o Primeiro diálogo Brasil – EUA: Avaliação e Indicadores da Educação Básica, em fevereiro de 1998.

Com base no exposto verificam-se movimentos de pressão para a ampliação do número de experiências avaliativas. Afonso (2005), ao investigar o tema no âmbito mundial, destaca que o fenômeno da avaliação educacional tem se verificado em diferentes países, em lugares distintos no sistema mundial, podendo caracterizar “um crescente controlo nacional sobre os processos avaliativos, uma imposição cada vez maior de uniformidade de estilos, práticas e objetivos, e um aumento frequente das acções de avaliação” (AFONSO, 2005, 62). Nesse sentido, vai ser observado no Brasil no período entre 1992 e 2002, um crescimento gradativo das avaliações externas demonstradas no quadro seguinte.

Quadro 1: Sistema de avaliação da Educação Básica criado por estados brasileiros - 1990 a 2001
Fonte: FREITAS, Dirce Ney. 2007
Estado Ano de Criação

Sistema

Programa/Projeto

Tipos de Avaliação

Enfoque

MG

 

1992

Programa de Avaliação da Escola Pública de Minas Gerais

 

Externa

Desempenho dos alunos

2000       

SIMAVE

PROEB
Subprograma Avaliação continuada

Externa

Desempenho dos alunos

SP

 

1992

Programa de Avaliação Educacional da Rede Estadual

Projeto Escola Padrão

Externa

Desempenho dos alunos

1996

SARESP

Autonomia das Delegacias de Ensino e da Unidade Escolar

Externa

Desempenho dos alunos

CE

 

 

 

 

1992

Sistema Permanente de Avaliação das Escolas do Ceará

 

Externa

Desempenho dos alunos

1994

Avaliação Institucional

Todos pela Educação de Qualidade para Todos

Interna

Desempenho Escolar

1996

SPAECE

 

Externa

Desempenho Escolar

2000

SPAECE
Unificou a avaliação institucional e avaliação de rendimento escolar

Programa Melhoria da Educação Básica do Ceará

Externa

Desempenho Escolar

2001

SAP (divulgação e uso dos resultados da avaliação institucional e do rendimento escolar)
SPAECE – NET

SPAECE – NET articulado com o SADRE (monitoramento e avaliação do programa/projeto)

Interna

Desempenho Escolar

BA

1999

Projeto de Avaliação Externa

Programa Educar para Vencer (conjunto de projetos que visam propiciar a autogestão da qualidade de ensino)

Externa

Desempenho Escolar

RO

2000

Projeto Avaliação Institucional e Qualidade de Ensino (monitoramento)

SADE

Programa de Avaliação Estatística

Subprojeto do SAEB no Estado

 

Avaliação da Escola

Desempenho dos alunos

PR

 

1995

Programa de Avaliação do Sistema educacional do Paraná

PQE – 1994 a 2001

Externa

Desempenho das Escolas

 

 

Programa Estadual de Avaliação do Rendimento Escolar – 2002

Interna

Desempenho Escolar

DF

1998

Avaliação do Rendimento Escolar

Integrada ao processo nacional de avaliação, podendo ser complementada localmente.

Externa

Desempenho Escolar

Diante das informações contidas no quadro, averígua-se que as experiências com a Avaliação Educacional (externa e/ou em larga escala) iniciam-se nos estados subnacionais na década de 1990, mais precisamente em 1992, período denominado por Freitas de Medida-Avaliação-Informação, em que o Estado Nacional utiliza medidas jurídico normativas para regular a educação (respondidas, no quadro, por 7 Estados), percentual relativamente pequeno para o quantitativo de Estados da Federação. Não é possível afirmar neste estudo as motivações que interferiram na adequação às determinações normativas, mas podemos afirmar, pois é de conhecimento público, que vários estados adequaram-se a esse direcionamento em anos posteriores as informações utilizadas neste artigo, como é o caso do Estado da Paraíba que regulamentará sua Política de Avaliação em 2012.

Entretanto, o município de João Pessoa, antecedendo o Estado, teve sua primeira experiência em Avaliação Educacional (externa) consolidada em 2009, tempo que se enquadra no período denominado de Estado Avaliador e Estado Educador cujo ethos é“regulação baseada na noção de ‘quasemercado’ na educação” e a “modernização da gestão”, sendo este ultimo desencadeador de quatro princípios: orientação para resultados, objetivos e mensuráveis, a flexibilidade administrativa a autonomia gerencial e, por fim, o controle hierárquico gerencial. Vejamos no subtítulo seguinte como a Política de Avaliação foi regulamenta e que concepção de Gestão Educacional foi assumida pelo Município.

3. O contexto da Produção de Texto: A concepção de Gestão da Educação no Prêmio Escola Nota 10

A política de educação do município de João Pessoa define a avaliação educacional como via de valorização dos/as docentes, discentes e de qualificação da gestão escolar. Adota instrumento de acompanhamento das práticas docentes, de gestão e prova escrita para o acompanhamento do desempenho escolar, é externa, e materializou-se no Programa de Avaliação nominado de Prêmio Escola Nota 10. OPrêmiofoi instituído pelo Decreto Municipal nº 11. 607/2008, de 23 de dezembro de 2008, cujo conteúdo declara a aferição da aprendizagem e Gestão Escolar das Escolas Municipais de Ensino Fundamental (EMEFs). Em decorrência, o Decreto nº 6.492/2009 de 17 de março de 2009 vem regulamentar a premiação, registrar o processo de avaliação e a bonificação, quantificar os indicadores de qualidade, declarar os objetivos e finalidades. Oficialmente o Decreto nº 6.492/2009, em seu art. 2º, apresenta como finalidade:

É baseado na valorização do desempenho e da gestão escolar, com a finalidade de avaliar o grau de desenvolvimento de competências e habilidades dos alunos e dos trabalhadores da educação [...] que atuam nas Escolas Municipais do Ensino Fundamental, fornecendo referenciais importantes que orientem os procedimentos necessários, para a efetiva operacionalização do processo educativo pela rede municipal de ensino. (grifo nosso).

O trecho do documento em análise sintetiza a política de educação do município que opta por uma estratégia de valorizar o desempenho dos/as profissionais da educação e dos/as discentes através de bonificação e premiação, acreditando que esta ação poderá alterar o grau de desenvolvimento de habilidades e competências dos/as alunos/as e trabalhadores/as da educação. Há uma visível intenção de intervir na gestão escolar para, através dela, qualificar os processos inerentes às práticas educativas. A forma de intervenção é possibilitada por um conjunto de indicadores centrais que tratam da avaliação da Gestão Escolar, Avaliação das Atividades Interdisciplinares, Avaliação da frequência na Formação Continuada e a Avaliação da Aprendizagem dos/as alunos/as, referenciais que devem ser seguidos para a obtenção da premiação.

Neste artigo abordaremos dois dos indicadores, os indicadores da Avaliação da Gestão Escolar e de Patrimônio e Despesa de custo do Prêmio Escola Nota 10,  com essa finalidade selecionamos os itens que compõe os citados indicadores nos três anos em que o Prêmio foi objeto de investigação.

Quadro 2: Indicadores da avaliação da gestão escolar do Prêmio Escola Nota Dez – 2009 a 2011
2009

2010

2011

- Declaração do CME de que o Projeto Político-Pedagógico da EMEF está atualizado;
- Declaração da Gestão escolar de que o Programa de Desenvolvimento Escolar está em Execução;
- Relatório financeiro e de atividades pedagógicas do ano de 2008;
- Cronograma de Planejamento Escolar;
- Cronograma de reunião do Conselho Escolar;
- Quadro de horário escolar, planejado de modo a deixar livres os dias relacionados às disciplinas de cada professor na Formação Continuada;

- Declaração do Departamento Administrativo Financeiro (DEPAF) de que o Programa de Desenvolvimento Escolar está em execução;
- Apresentação do cronograma de reuniões mensais de planejamento escolar;
- Apresentação dos cronogramas de reuniões bimestrais do Conselho Escolar;
- Quadro de Trabalhadores da Educação lotados na EMEF, com seus respectivos horários e funções;
- Declarações requisitadas junto aos setores competentes, atestando informações enviadas ao Censo Escolar (DTIC) e a frequência bimestral dos alunos beneficiários do Programa Bolsa-Família (NAFE);

- Cronograma de reuniões mensais de planejamento escolar e de reuniões bimestrais do Conselho Escolar com apresentação das respectivas atas;
- Cadastro atualizado no Sistema Acadêmico Municipal (SAM) dos trabalhadores da Educação lotados na EMEF, com os respectivos horários e funções;
- Cadastro atualizado no Sistema Acadêmico Municipal (SAM) dos alunos matriculados na escola;

- Quadro de trabalhadores da Educação lotados na EMEF, com seus respectivos horários e funções;
- Declaração requisitada junto ao setor competente, atestando o envio de informações do Censo Escolar;
- Declaração requisitada junto ao setor competente, atestando o envio de informações da frequência dos alunos para o Projeto Presença.

- Documento comprobatório de frequência mensal de 100% de todos os trabalhadores de educação, nas atividades de sua competência na EMEF. As ausências nas unidades de ensino deverão ser legalmente justificadas;
- Diários de classe atualizados e em bom estado de conservação.

- Cadastro atualizado no Sistema Acadêmico Municipal (SAM) que demonstre a aprovação de, no mínimo, 90% dos alunos;
- Declarações que atestem informações enviadas ao Censo Escolar (DTIC) e frequência bimestral dos alunos beneficiários do programa Bolsa-Família/NAFE;
- Diários de classe atualizados e em bom estado de conservação.

Examinando as finalidades da Política e dos Indicadores de Avaliação do PEN10  vamos dimensionando a concepção de Gestão defendida pelo Órgão Gestor da Educação do município de João Pessoa/PB. A nosso ver há um indiscutível direcionamento para uma prática de uma gestão controladora e preocupada com a operacionalização de processos organizacionais primários, e da supervisão dos/as docentes em relação à assiduidade. Existe também uma ênfase na pontuação de ações corriqueiras e inerentes à função da gestão escolar que exige elucubrar quais as intenções que motivaram a definição dos itens uma vez que a gestão, para pontuar e ganhar o Prêmio se deterá nestes. Uma questão pertinente é: que gestão se quer para as escolas? Os itens elencados nos levam a construir uma visão de que a Gestão Escolar deva ser assumida por um/a profissional com requisitos voltados para o desenvolvimento de tarefas, distanciando-se do que a legislação e a literatura educacional preconizam.

É visível a alteração dos indicadores ao longo dos anos, por aglutinação ou exclusão de itens que pode ser uma demonstração de flexibilidade por parte da gestão municipal. Em linhas gerais mudou-se a letra, não o conteúdo. Visto dessa forma, o conjunto de itens, por outro ângulo de análise, demonstra, em síntese, uma grande dificuldade dos/as gestores/as em operacionalizar os processos administrativo-pedagógicos. Provavelmente os indicadores foram priorizados no sentido de reverter essa dimensão, levando-nos a interpretar que, referente à operacionalização desses processos, há certo comprometimento na elaboração, cumprimento de prazos e cuidado com o patrimônio público. A iniciativa que parece ser uma atitude simples induz a pensar que os/as gestores/as não têm controle sobre os procedimentos administrativos.

Outro olhar indica pressão para que o/a gestor/a se envolva mais com os contingentes técnico-administrativos. Ora, essencialmente, a escola deve ter profissionais que são responsáveis pelos diversos setores administrativos cabendo a estes a gestão do seu setor. Envolver os/as gestores/as numa prática de vigilância de procedimentos primários e parte de um conjunto de práticas operacionais é resumir suas ações a tarefas (tarefeiro/a). Provavelmente, ao focar nessas ações, sua atuação de acompanhamento educacional, pedagógico e estratégico será relegada ao segundo plano e sua prática reproduzirá um histórico de gestões tradicionais, que há tempo vêm sendo repensadas com vistas a adequar as escolas a um contexto mais dinâmico de administração.

O 2º Indicador, de Patrimônio e Despesa de Custo, aparece descolado do primeiro, mas seu cumprimento incide sob o mesmo sujeito, o/a Gestor/a Escolar. O quadro seguinte apresenta o indicador com seus respectivos itens, pensados na mesma perspectiva do primeiro.

Quadro 3: Indicadores de patrimônio e despesa de custo do Prêmio Escola Nota Dez – 2009 a 2011
2009

2010

2011

1) Patrimônio
■ Manutenção adequada da estrutura física da escola;
■ Conservação do mobiliário;
■ Limpeza da escola.
2) Despesas de Custeio;
■ Redução de consumo de água;
■ Redução do consumo de energia;
■ Redução de consumo de telefone;
■ Material de expediente

■ Manutenção adequada da estrutura física, conservação do mobiliário e limpeza da escola;
■ Utilização adequada do material de expediente;
■ Redução do consumo de água;
■ Redução do consumo de energia;
■ Redução do consumo de telefone.

■ Conservar a estrutura física e o mobiliário, manter a escola limpa e utilizar adequadamente o material de expediente;
■ Reduzir o consumo de água, evitando o desperdício, sem prejuízo das atividades pedagógicas;
■ Reduzir o consumo de energia, evitando o desperdício, sem prejuízo das atividades pedagógicas;
■ Reduzir o consumo de telefone, evitando o desperdício.

No ano de 2009 observa-se uma clara orientação de economia, talvez em função de um contexto econômico e político que passa a ser foco central nas políticas governamentais. No ano de 2010 o direcionamento é mantido, somente em 2011 se verifica que a modificação feita no texto procura dar uma conotação pedagógica às práticas de controle de custos, que no sentido apresentado garantem que o rigor no controle dos gastos não interferirá nas atividades pedagógicas. Novamente uma questão nos inquieta: qual a função do/a gestor/a na concepção do Órgão Gestor da Educação no Município de João Pessoa/PB? Ao tomarmos como referência o conteúdo do texto, concluímos que seu papel está restrito à operacionalização de procedimentos administrativos, sua função de liderança, de mediação e de agente que fomenta a prática reflexiva não é valorizada. E mais, o/a gestor/a passa a ser o/a intermediador/a das opções políticas dos macrogestores públicos (prefeitos/as e secretários/as) que visam essencialmente controlar custos, cultura gestionária assinalada por Afonso (2005).

Diminuir as despesas públicas exigiu não só a adopção de uma cultura gestionária (ou gerencialista) no setor público, como também induziu a criação de mecanismos de controlo e responsabilização mais sofisticados. A avaliação aparece como pré-requisito para que seja possível a implementação desses mecanismos (AFONSO, 2005, p. 113).

Conforme ilumina Afonso, a avaliação, nesses moldes, funciona como via de implementação de um modelo gestão pouco comprometido com as questões de ordem educacional que, no caso em análise, nos parece contraditório, pois, conforme declarado no Decreto que regulamenta o Prêmio Escola Nota 10, o foco se posiciona dentro de um patamar pedagógico, se assim o é, por que não reiterar pontos que fortaleçam e centralizem a aprendizagem?

O Estado (nacional e subnacional) tem induzido algumas ações, muito embora elas sofram alterações locais, que utilizam da avaliação como mecanismo de imposição de uma ideologia gerencial, que através do exercício de “medir”, “avaliar” e “informar”, os/as profissionais da educação e as famílias vão se familiarizando com princípios políticos, administrativos, pedagógicos e educativos que reordenam a educação. Esses princípios estão relacionados às teorias gerencialistas apontadas na literatura como advindas de três modelos teóricos gerencialistas: Managerialism ou neotaylorismo, Consumerism, Public Service Orientation (ABRUCIO, 2006; ABRUCIO 1999 apud FREITAS, 2007, p. 173).

Nessa ótica passamos a entender a perspectiva de gestão decorrente da Política Avaliação Educacional construída pelo órgão Gestor da Educação do Município de João Pessoa/PB notadamente alimentada pelos modelos “Pós-Burocrático” que se baseia na busca de eficiência máxima por meio da padronização do desempenho humano e no investimento em mecanismos de controle e supervisão, exigindo padronização das práticas e instrumentos de acompanhamento (ABRUCIO, 2006, p. 178). Também é possível associar a iniciativa ao Managerialism ou neotaylorismo pelo valor à competitividade e o fomento a qualidade associada a pouco recurso e ao Consumerism, pela relação que a iniciativa reforça com os consumidores (estudantes e famílias), a sua fiscalização, incremento à competição, e estabelecimento e relações que fomentem o aumento da qualidade com poucos recursos.

Para além das características observadas em relação às intenções que permeiam a experiência avaliativa em pauta, uma reflexão sobre o “Estado-Educador brasileiro e sua atuação como Estado Avaliador”, conforme denomina a autora que tomamos como referência, merece ser acentuada. Muitas das ações promovidas pelo governo central como o SAEB, ENEM, desencadearam necessidades de aprendizagens e de apropriação de práticas que provavelmente incidiram na transformação laboral com a devida adequação aos modelos de gestão gerencial. Essas aprendizagens são desenvolvidas através das formações continuadas geralmente assumidas nos estados e municípios em parcerias com organismos estatais e privados. Essas aprendizagens formalizadas dão consumo à ideologia que permeia as políticas educacionais; profissionalizam a mão de obra para atuar “meros executores profissionalmente equipados para realizar qualquer objetivo que lhes seja colocado” (GIROUX, 1993, p. 21).

Essa afirmação, em certa medida, é verificada na Política de Educação do Município de João Pessoa que oferece formação para gestores/ras escolares como condição para candidatura de Diretores/ras Escolares e exercício após eleição. Sendo assim, cabe perguntar se a concepção de Gestão adotada na formação de gestores/as é a mesma que direciona os critérios do Prêmio, uma vez que os gestores/as devem sair qualificados para assumir tal função? São questionamentos que não foram possíveis de responder, mas que incomodam e refletem a afirmação de Giroux (1993).

Considerações finais

Esse artigo procurou analisar a concepção de gestão do Programa Prêmio Escola Nota 10 decorrente da Política Educacional do Município de João Pessoa. Para tanto, foi feito um levantamento das iniciativas federais relacionadas com a política de avaliação educacional em âmbito macro e suas influências em contextos mais localizados, estados e municípios. Com relação a capital paraibana percebeu-se que o Prêmio acaba por ser contraditório, pois existe uma distância entre o texto do decreto que lançou o prêmio afirma e o que efetivamente acontece no processo de análise do cumprimento dos indicadores de avaliação pelas escolas.

Na intenção, ou seja, no texto do decreto, o prêmio posiciona-se de forma mais pedagógica, destacando uma preocupação com o ensino aprendizagem. Entretanto, no gesto, ou seja, nos indicadores de avaliação priorizados a serem seguidos à risca pelas escolas e gestões que querem receber a premiação em tela, o prêmio acaba reproduzindo um modelo de gestão centrado no campo técnico-administrativo, em detrimento aos aspectos pedagógicos e de ensino aprendizagem, o que engessa sua intenção primeira.

Finalmente o Programa de Avaliação desenvolvido em João Pessoa, notadamente conhecido por sua condição de Prêmio, apresenta um concepção de Gestão que distancia-se da Gestão Democrática e Participativa que normatiza a educação brasileira e aproxima-se de modelos pós-burocráticos que acentuam a competição, a concorrência e a proatividade na execução de tarefas.

Referências

ABRUCIO, Fernando Luiz. Os avanços e dilemas do modelo pós – burocrático: a reforma da administração pública à luz da experiência internacional recente. In: PEREIRA, Luiz Carlos Bresser; SPINK, Peter. A Reforma do Estado e Administração Pública Gerencial. São Paulo, SP. Editora FGV, 2006.

AFONSO, Almerindo Janela. Avaliação educacional: regulação e emancipação: para uma sociologia das políticas avaliativas contemporâneas. 3. ed. São Paulo: Editora Cortez, 2005.

_______. Avaliação em educação: perspectivas de emancipação social ou regulação gestionária? In: MELO, Marcos Muniz. Avaliação na educação. Pinhais, PR: Editora Melo, 2007.

GIROUX, Henry. Escola Crítica e Política Cultural. 3. ed. São Paulo: Editora Cortez; Autores Associados, 1993.

FREITAS, Dirce Ney Teixeira de. Avaliação da educação básica no Brasil: dimensão normativa, pedagógica e educativa. Campinas, SP: Editora Autores Associados, 2007. (Coleção Educação Contemporânea).

FREITAS, Luiz Carlos; MRL de Sordi, MMS Malavasi, HCL Freitas. Avaliação Educacional: caminhando na contramão. Petrópolis, RJ. Editora Vozes, 2009

JOÃO PESSOA. Decreto Municipal nº 11. 607/2008. João Pessoa: PMJP/SEDEC, 2008.