IMPLANTAÇÃO DO PLANO DE AÇÕES ARTICULADAS NO RN: PROCESSO DE DEMOCRATIZAÇÃO DA GESTÃO POR MEIO DOS CONSELHOS ESCOLARES
Resumo: A comunicação apresenta e analisa os fundamentos teóricos e os dados de uma Pesquisa vinculada ao Observatório da Educação (CAPES), que avalia o PAR (2007-2011) no RN. O estudo considera as ações desenvolvidas na área da gestão democrática no município de alto IDEB de Mossoró-RN. Discute numa perspectiva teórico-metodológica crítico-dialética a imbricação das relações federativas e da práxis de planejamento educacional ocorrida por meio do processo de democratização da gestão escolar quando da implantação do PAR, em particular, a existência de Conselhos Escolares. Identificamos que essa dimensão da gestão democrática no Município é precária, pois o Colegiado existe em metade das escolas e funciona sem regularidade, relativizando o IDEB enquanto indicador isolado de qualidade da gestão.
Palavras-chave: PAR; gestão democrática; conselho escolar
Introdução
A promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88), e, posteriormente, a institucionalização da Lei nº 9.394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB/96), documentos que regulamentam os princípios balizadores do federalismo e da gestão democrática da escola pública (estabelecido no Art. 206, inciso VI da CF/88), fundamentos estes que passam a referendar e referenciar as políticas públicas do estado e dos governos nacionais que implementam a reforma do estado de cunho neoliberal e gerencial, especialmente, a partir da gestão do Presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC-1995/2003). E, de forma contraditória, os mesmos documentos que regulam os processos de democratização da gestão pública por meio da transferência de poder aos atores situados na ponta do sistema escolar, princípio defendido pelas entidades de classe e os movimentos sociais durante o processo de redemocratização nos idos dos 1980.
Nessa conjuntura multifacetada os órgãos superiores da administração pública federal, no caso específico da educação pública, o Ministério da Educação (MEC) passa a instituir e implementar políticas que consubstanciem as diretrizes de modernização da gestão sob a égide do federalismo e da democratização da gestão escolar, isso com o objetivo fundante de garantir um padrão de qualidade para a educação – conforme prevê a Constituição Federal de 1988 (inciso VII do artigo 206). A partir desse momento torna-se prioridade dos Governos melhorar a qualidade da educação superior e básica públicas.
Os governos nacionais buscando melhorar a qualidade da educação pública e implementar o modelo federativo instituído pela CF/88 iniciam o processo de descentralização/democratização da gestão escolar e avaliação da qualidade da educação básica e superior, motivos, dentre outros, que levaram a criação do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE-2007) pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Lula), no início do seu segundo mandato. Esse Plano foi apresentado pelo MEC em abril de 2007 com o objetivo de capitanear e ordenar diversos programas da Educação Básica e Superior desenvolvidos pelo Governo Federal, alguns programas já existentes e outros novos. O intento era instrumentalizar novos mecanismos de gestão, financiamento e avaliação das políticas públicas educacionais, para que elas apresentassem mais eficiência e eficácia nos resultados, isto é, mais performance.
Dentre as ações do PDE inclui-se a criação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, regulamentado pelo Decreto Federal nº 6.094 de 24 de abril de 2007, esse Plano pressupõe, dentre outras metas, a implementação do regime de colaboração entre a União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios, logo,
O papel atribuído à União é o de exercer, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir a equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino, mediante assistência técnica e financeira [...] (CAMINI, 2010, p. 537).
A partir de abril de 2007, a assinatura do termo de acordo pelos gestores representantes dos entes federados – estados e municípios – operacionalizou o Compromisso Todos pela Educação que previa, dentre outras ações, a implantação do Plano de Ações Articuladas (PAR). O PAR propicia que, de forma compartilhada com estados e municípios, o MEC desenvolva uma política federalista orgânica de planejamento educacional estratégico que objetiva planejar, financiar, executar e avaliar ações administrativas e pedagógicas implementadas nos diversos níveis e modalidades da Educação Básica com a intenção de melhorar os indicadores do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB).
O organograma estrutural que sistematizou o diagnóstico e o planejamento do PAR contempla quatro dimensões: Gestão Educacional; Formação de Professores e de Profissionais de Serviço e Apoio Escolar; Práticas Pedagógicas e Avaliação; e, Infraestrutura Física e Recursos Pedagógicos. As dimensões são divididas em áreas O Guia Prático de Ações do PAR (2007-2011), apresenta 5 áreas, quais sejam: Área 1 – Gestão Democrática: articulação e desenvolvimento dos sistemas de ensino; área 2 – Desenvolvimento da Educação Básica: ações que visem a sua universalização, a melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem assegurando a qualidade nas condições de acesso e permanência e conclusão na idade adequada; área 3 Comunicação com a sociedade; área 4 – Suficiência e estabilidade da equipe escolar e área 5 – Gestão de finanças (BRASIL, 2007). e estas, por sua vez, em indicadores.
De forma particular no desenvolvimento desse trabalho analisaremos a área da gestão democrática, notadamente, o primeiro indicador O Guia Prático de Ações do PAR (2007-2011), apresenta 9 indicadores, relativos à gestão democrática – 1) Conselho Escolar (CE); 2) Conselho Municipal de Educação (CME); 3) Conselho de Alimentação Escolar (CAE); 4) Projeto Pedagógico (PP); 5) escolha da direção das escolas; 6) Plano Municipal de Educação (PME); 7) Plano de Carreira para o Magistério; 8) estágio probatório de professores e demais profissionais da educação; e, 9) Plano de Carreira para os profissionais de serviços e apoio escolar (BRASIL, 2007, grifo nosso). – Conselho Escolar –. A seleção desse indicador ocorreu porque pretendemos verificar como esse colegiado encontra-se configurado no município de Mossoró-RN, isto por tratar-se de um instrumento fundamental para implementação da gestão democrática na rede municipal de ensino e, também, compreender o porquê do diagnóstico do PAR do Município apontar que o indicador – Existência e Funcionamento dos Conselhos Escolares – apresentava uma pontuação com escore dois, uma condição classificada como insuficiente pelos consultores do MEC que realizaram a avaliação conjuntamente com a Administração Municipal.
Federalismo e planejamento educacional brasileiro: conjuntura de implantação do PAR
O Estado nacional brasileiro doravante a Constituição Federal de 1988 e a LDB/96 passa a organizar-se com base no sistema federativo. Busca-se combater as contradições regionais, fortalecendo-se os entes federados via apoio financeiro focalizado e assessoria na construção de práticas eficientes e eficazes de gestão pública, em especial no campo das políticas públicas educacionais, o objetivo é a melhoria da qualidade educação pública no sentido de ampliar os conhecimentos e competências instrumentais dos alunos para adequar-se ao mercado de trabalho capitalista, flexível e de alta competitividade.
A construção do pacto federativo entre a União, os Estados e os Municípios tem reflexo linear na concepção dos planos, programas e projetos estabelecidos pelo Governo Federal, uma vez que esse modelo federativo é responsável pela distribuição de competências comuns.
O Plano de Ações Articuladas (PAR), objeto de estudo nesse artigo, tem como cerne de concepção e implementação os critérios estabelecidos pela legislação que instituiu o pacto federativo brasileiro, isto é, o regime de colaboração que passa a estabelecer as parcerias e compartilhar os direitos e responsabilidades.
Para compreender a configuração assumida pelo pacto federativo brasileiro contemporâneo, é necessário saber que ele emerge a partir do processo de redemocratização do Estado nacional nos idos dos anos 1980. O federalismo renasceu juntamente com suas propostas balizadoras destinadas ao cenário político brasileiro. O federalismo assume uma proposta complexa que, ao longo de sua constituição, vem estabelecendo diferentes configurações legais e institucionais. Segundo Abrucio (2005), o federalismo tem por finalidade a organização política do Estado, na busca de criar soluções que reduzam as assimetrias regionais marcadas por desigualdades e, ainda, de horizontalizar o poder. No Estado Federativo, predominam em tese a colaboração e o compartilhamento entre os entes federados, que são: União, Estados, Distrito Federal e Municípios, para que juntos assumam o processo de tomada de decisões, respaldando-se em suas respectivas autonomias.
Entretanto, no que se refere à colaboração entre os entes federados, é válido destacar a dependência um do outro, tanto no processo de tomadas de decisões como no processo compartilhamento de tarefas em prol de certo objetivo, estabelecendo a ideia de que o sistema está organizado em relações entre iguais.
Nessa perspectiva, supõe-se que não existe relação de subordinação entre os entes federados e que estes se constituem igualmente estabelecendo relações de colaboração. Dessa forma, a organização do Estado implica a existência de autonomia dos entes federados e uma relação de cooperação intergovernamental, articuladas entre si, visando estratégias que sejam alcançadas e objetivando o bem comum.
Conforme Abrucio (2005), no que diz respeito à “soberania compartilhada”, afim de garantir autonomia entre os governos e interdependência, destaca que “é importante ressaltar que os níveis intermediários e locais detêm a capacidade de autogoverno como em qualquer processo de descentralização, com grande raio de poder nos terrenos político, legal, administrativo e financeiro, mas sua força política vai além (ABRÚCIO, 2005, p. 43).
Segundo Luce e Farenzena (2007), o processo de descentralização, considerando o regime de colaboração, envolve a transferência de responsabilidades e competências do poder central para as esferas estaduais e municipais.
É necessário haver um equilíbrio entre modos de cooperação e competição entre os entes federados. Nesse sentido, Abrucio (2005, p. 45) considera como estratégias para adequar esses dois mecanismos implementar “[...] regras legais que obriguem os atores a compartilhar decisões e tarefas [...]”, com relação as políticas públicas, e criar fóruns federativos com a participação de todos os entes para que possam negociar e acionar seus direitos.
Como advogam Cabral Neto, Castro e Barbalho (2014), uma das grandes dificuldades desse modelo de pacto federativo está pautada no que diz respeito às
[...] as relações estabelecidas entre o governo nacional e os governos subnacionais, porque eles não são entes plenamente autônomos. Desse modo, a constituição de um sistema federativo requer o necessário estabelecimento de uma relação de interdependência entre os entes federados que permita, ao mesmo tempo, a efetivação da repartição de responsabilidade e garantia de integralidade do Estado nacional exigindo, portanto, a construção de pactos (CABRAL NETO; CASTRO; BARBALHO, 2014, p. 46).
Corroborando com os Autores, é notório perceber as dificuldades de concretização desse atual modelo de regime de colaboração, pois, mesmo após a redemocratização e promulgação da Constituição de 1988, o país ainda detém práticas centralizadoras. Todavia, passa a conceder grande parte das responsabilidades à União, em virtude da fragilidade dos outros entes (estados e, principalmente, os municípios). É necessário que predomine dentro do regime federativo o posicionamento firme sobre a descentralização, pois, em conformidade com Cabral Neto (2014, p. 50), [...] “práticas centralizadoras dificultam a concretização dessa forma de organização do Estado”.
No tocante à forma de organização federada, Cabral Neto (2014) adverte que se deve direcionar o enfoque em destacar suscintamente às competências concorrentes e comuns destinadas a todos os entes federados, contribuindo dessa forma para o fortalecimento do regime de colaboração.
No tocante a esse planejamento educacional, segundo Sena (2013), este é um dos fatores para o caminho destinado ao alcance dos objetivos, principalmente no que se refere às políticas. Planejar significa organizar, criar metas a serem alcançadas. No setor público, o planejamento foi marcado pelas marcas do sistema econômico vigente, o qual também influenciou todos os outros setores. No Brasil, o processo de planejamento torna-se mais complexo, devido ao país assumir feição do federalismo cooperativo.
Para superar esse modelo de federalismo cooperativo, a LDB/96 busca superar essas dificuldades, ao estabelecer que os planos educacionais e as políticas adotadas pelos Estados devem ser elaborados e executados em consonância com o PNE (SENA, 2013, p. 138). Dessa maneira, o Plano de Desenvolvimento da Educação consubstanciado por meio do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação (2007), tem buscado construir estratégias que regulamente esse potencial regime de colaboração (CAMINI, 2010, p. 537).
Plano de Desenvolvimento da Educação (2007) e o Plano de Ações Articuladas (2007-2011)
O governo brasileiro, a fim de materializar as normativas referentes ao regime de colaboração, criou vários programas objetivando fortalecer o regime. Nessa proposta, um dos mecanismos criados no governo FHC (1999/2009) diz respeito a programas e parâmetros nacionais para amparar os estados e municípios na organização dos seus sistemas de ensino. Os órgãos superiores, nesse caso, o Ministério da Educação (MEC), passam a pensar em políticas para substanciar as propostas de modernização da gestão educacional a partir da reforma do Estado, com objetivos de propor melhorias no sistema educacional, elevando os índices de desempenho da educação básica, além de superar algumas lacunas existentes historicamente.
Em 2007 o Governo Lula elabora o PDE/Plano de Metas Compromisso pela Educação. O PDE foi apresentado como uma política de governo relacionada especialmente à educação básica, tendo por finalidades programas e ações que substanciassem, por meio do planejamento, melhorias no modelo educacional vigente. Porém, um dos equívocos do plano foi em relação à sua elaboração, que, segundo Camini (2010, p. 53), “[...] De maneira geral verificou-se a elaboração de um plano sem ampla consulta e debate com as entidades científicas e sindicais do campo educacional”. Assim, o plano em sua elaboração não levou em consideração a opinião dos educadores, da sociedade civil, nem de outras instâncias.
No entanto, para a efetivação do plano, surgiram programas e ações, dentre eles, o Plano de Ações Articuladas (PAR), que é um documento fundado pelo Ministério da Educação em conformidade com o Plano de Desenvolvimento da Educação, sendo uma das suas ações a regulamentação do Plano de Metas “Compromisso Todos pela Educação”, por meio do Decreto n. 6.094, de 24 de abril de 2007.
O Decreto supracitado propõe o regime de colaboração entre União, Municípios, Distrito Federal e Estados, além da participação da família e de toda a comunidade escolar. As instâncias federativas se comprometem em planejar em nível local, ofertando programas e ações de assistência técnica e financeira que propendessem melhorias nos índices educacionais. Dessa forma, o PAR atende essas características, sendo um documento composto de ações e subações com a finalidade de melhorias nos índices educacionais, principalmente no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Para Costa e Valente (2014, p. 190), o PAR e o IDEB são considerados “[...] Os principais elementos para consolidação do regime de colaboração proposto pelo MEC, a partir do decreto Compromisso todos pela Educação”.
O Plano de Ações Articuladas (PAR), arquitetado na conjuntura do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), iniciou em 2007 e tem permanência plurianual. Ele tem proferido uma conjuntura de articulação entre gestores e educadores dos sistemas de ensino, no sentido de buscar melhorias na atual política educacional, dando sua contribuição para a melhoria do ensino. Estruturalmente, o PAR está dividido em quatro dimensões: Gestão Educacional; Formação de Professores e de Profissionais de Serviço e Apoio Escolar; Práticas Pedagógicas e Avaliação; Infraestrutura Física e Recursos Pedagógicos. As dimensões são divididas em áreas e estas, por sua vez, em indicadores. Logo, na configuração organizacional e operacional do PAR, a gestão educacional desponta como uma das dimensões fundamentes para melhoria dos indicadores da qualidade da Educação Básica, em função dessa diretriz direcionamento nossa discussão a seguir.
A Gestão Educacional e o PAR
Sob os reflexos da reestruturação econômica capitalista ocorrida a partir dos anos 1990 e 2000, as políticas sociais, inclusive as educacionais, passam a sofrer os reflexos da ideologia econômico-política neoliberal, que repercute na construção de nova proposta de organização dos estados nacionais.
Com essa reestruturação estatal vários setores da administração pública foram atingidos por essa maré de mudanças, inclusive as políticas educacionais e a escola pública que passam a organizar-se seguindo esses propósitos. Assim, emerge o princípio da gestão democrática da escola pública, também garantido na CF/88, em seu Art. 206, Inciso VI, tendo em vista que o ensino será proposto com bases na “gestão democrática do ensino público, na forma da lei” (BRASIL, 1988). Esse passa ser um modelo a ser seguido por todas os que compõem a escola pública. Dessa forma, faz-se necessário que o ambiente escolar se organize com base na participação em que todos sejam ouvidos e atendidos, na busca ao bem comum que é a melhoria da qualidade do ensino.
O Plano de Ações Articuladas contempla em uma das suas dimensões a Gestão Educacional, e uma área direcionada a Gestão Democrática. A estrutura e organização do PAR, vislumbra como um dos paradigmas de gestão pública, a democratização da gestão escolar pública.
Dessa forma, esse mecanismo de gestão transfere a responsabilidade dos órgãos superiores aos órgãos inferiores na escala federativa. Para FRANÇA, 2015, p. 198, “A Educação adota o gerencialismo na realização dos seus serviços, e tem, como estratégia, a descentralização das atividades, tradicionalmente desenvolvidas pelo Estado, para a comunidade escolar”. Esse paradigma gerencial tem seu foco direcionado a resultados baseados nos indicadores de desempenho o qual o PAR está diretamente relacionado, no momento em que, ao aderir o Plano os municípios assinam o termo de compromisso, comprometidos com a elevação do IDEB.
A responsabilidade de gerir o dinheiro público fica nas mãos das instâncias que compõem o espaço escolar, ao mesmo tempo que estes também ficam responsáveis pelo sucesso ou fracasso. Um dos grandes entraves para atender esse modelo corresponde que, “A descentralização de algumas responsabilidades não veio acompanhada de recursos suficientes e de apoio técnico, administrativo e pedagógico que permitam criar escolas autônomas e efetivas. (CASTRO, 2007, p. 140).
A descentralização acontece, de maneira que a autonomia não é dada o quanto seria preciso levando em consideração a burocracia conferida pelos órgãos superiores, para gerir por exemplo uma quantidade insuficiente de recursos recebidos pelas escolas tendo em vista suas inúmeras necessidades. Vale ressaltar ainda que, muitas das diretrizes que condizem com a gestão democrática não vem sendo operacionalizada de modo que os atores sociais responsáveis pela escola têm apenas executado as tarefas, não deliberam no planejamento, na execução e avaliação das políticas públicas desenvolvidas nas instituições educacionais públicas.
Por fim, entendemos este modelo gerencial de gestão, como uma modelo fragilizado principalmente por sua fragmentação e burocratização. Dessa forma, os indivíduos e os atores coletivos precisam unir-se para buscar o fortalecimento do espaço escolar, constituindo uma cultura de participação, para que juntos superem o pragmatismo atribuído pelas estratégias de mercado que influenciam diretamente na organização do sistema educacional.
A implementação da gestão democrática por meio das ações do PAR: o funcionamento dos Conselhos Escolares no município de Mossoró/RN
Os Conselhos Escolares foram instituídos no Brasil antes mesmo dos pioneiros da educação no estado de Santa Catarina, nas escolas rurais no ano de 1925. Nessa fase, seu objetivo consistia na fiscalização dos familiares no trabalho das escolas, pois, segundo Sobrinho e Barbosa (2014), naquela época, o governo não tinha estrutura destinada para realizar o acompanhamento dessas instituições. Após a redemocratização do Estado, os Conselhos adquiriram espaço na arena política, sendo uma das estratégias da gestão democrática do ambiente escolar.
Esses passaram a ganhar reconhecimento na política educacional, sendo institucionalizados a partir da redemocratização do Estado, em que na democratização estava prevista a superação do sistema escolar seletivo e excludente. Esse sistema é inserido mediante análise da trajetória histórica das reformas discutidas nas últimas Conferências Mundiais, a saber: a Conferência Mundial de Educação para Todos, ocorrida na Tailândia, em 05 de março de 1990, e a Conferência de Abertura do Fórum Internacional Políticas Públicas de Educação na América Latina, realizada em 2010.
Percebe-se que em todas essas Conferências foram discutidas e estabelecidas estratégias e diretrizes a serem implementadas pelos países participantes e, portanto, incorporadas ao Plano Decenal Brasileiro de Educação. A orientação que deveria embasar as reformas traduzia-se na frase “Educação para a equidade social”. Essa era a direção que os países deveriam seguir para diminuir as desigualdades sociais.
As estratégias e diretrizes orientadas nas Conferências Mundiais foram implantadas e, posteriormente, serviram de base para elaborar a nova Lei de Diretrizes e Bases da (LDB), a fim de concretizar os direitos estabelecidos na Constituição Federal e regulamentar seus princípios. De acordo com essa nova legislação, referente à gestão democrática, na Lei 9.394/96, a gestão democrática foi estabelecida em forma de Lei e de regulamentação local de cada sistema de ensino, assegurada no Art. 3º, VIII. No tocante aos conselhos, essa lei assegura a participação da comunidade escolar e local, em conselhos escolares ou equivalentes (Art. 14º, II).
Diante dessa realidade, os sistemas de ensino no Brasil passam a implementar formas de gestão democrática, com vistas à melhoria da qualidade do ensino e, assim, surge a necessidade de criação e efetivação dos Conselhos Escolares, como órgão de caráter descentralizador de poder, com o propósito de contribuir enquanto mecanismo de participação dos mais diversos membros da comunidade escolar.
Entretanto, constata-se através deste estudo e reflexão inicial que o sistema educacional brasileiro tem promovido a orientação para a criação e implementação dos Conselhos Escolares dos sistemas de ensino nos estados e municípios brasileiros, no entanto, ainda são constatadas práticas não democráticas presentes nas escolas públicas brasileiras.
Dentre os municípios que aderiram ao PAR no estado do Rio Grande do Norte, podemos citar o município de Mossoró, que está localizado no Semiárido nordestino, com clima predominantemente quente e seco. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a área total do município é de 2.099,333 km², atribuindo-lhe a dimensão de maior município do Rio Grande do Norte, em se tratando de extensão territorial. Seu índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M) é 0,720.
Ao realizar o diagnóstico para elaboração do PAR, os indicadores foram pontuados como insuficientes, assim, gerando ações. Através da análise contida na justificativa do PAR (2007-2011) do município de Mossoró, na Dimensão de Gestão Educacional, Área Gestão Democrática: Articulação e Desenvolvimento dos Sistemas de Ensino, no indicador “Existência e Funcionamento de Conselhos Escolares (CE)”, observou-se que a Secretaria de Educação desse município sugeriu a implantação de 54% dos Conselhos Escolares nas instituições de Ensino Fundamental, bem como a capacitação de 100% dos conselheiros através de cursos de aperfeiçoamento pelo Programa Nacional de Fortalecimento de Conselhos Escolares.
Dessa forma, percebemos um município que, até então, menos de 50% das escolas possuíam Conselhos Escolares. Tendo em vista que o CE é um colegiado que busca efetivar da gestão democrática no ambiente escolar. Entendemos que, o conselho tem por objetivo auxiliar a gestão escolar nas tomadas de decisões e em todas as áreas cabíveis no ambiente escolar, além de criar mecanismos que possam possibilitar a melhoria da instituição, o que resulta na melhoria da qualidade do ensino. A implantação do conselho em uma instituição de ensino visa realizar algumas observações pertinentes para a materialização de alguns processos. Essas observações estão dirigidas a conhecer a realidade da escola e dos alunos que nela estão inseridos, contribuindo para superar as necessidades apresentadas.
A rede municipal de ensino no período do PAR (2007-2011) apresentava 118 unidades escolas naquela época. Desse total, 39 escolas do Ensino Fundamental na área urbana possuíam Conselhos Escolares e 40 escolas do Ensino Fundamental da área rural tinham Conselhos Escolares, de forma que estas são agrupadas em 8 núcleos de Educação Rural, sendo que cada Núcleo tem Conselho Escolar com representação das unidades escolares dos núcleos. Ou seja, para cada núcleo de 5 escolas, é constituído um CE, ficando apenas 8 Conselhos Escolares para cada, acompanhar 40 escolas.
Essa pontuação destinada ao município de Mossoró nos faz aprontar que o município não prioriza as práticas de gestão democrática, uma vez que, suas práticas estão entrelaçadas a um modelo gerencial de gestão. Vale ressaltarmos que essas práticas gerencialistas de gestão estão ligadas ao município ter parcerias com o terceiro setor, o qual segue esse modelo de gestão, em que para Santos (2011 P. 43), “[...] indicam como preceito básico para a condução das ações e melhoria da qualidade do ensino o processo de descentralização das ações e um gerenciamento eficaz do processo”.
Ao implantar o PAR, o município no que se refere aos conselhos escolares não detinha um apoio sólido de políticas e administração, levando em consideração que a organização da gestão municipal estava estabelecida nos princípios da eficácia e da eficiência pautados nos resultados educacionais, sendo esses, categorias da Fundação Airton Senna. Desse modo, as práticas democráticas de gestão se distanciavam do município, e dos ordenamentos jurídicos universais, levando em consideração que esse modelo de gestão estão garantidas nas leis que amparam a educação.
Considerações Finais
Nas duas últimas décadas percebemos que ocorreram avanços no campo das políticas educacionais brasileiras, notadamente, no campo da universalização do Ensino Fundamental, porém precisamos equacionar aspectos no que diz respeito ao acesso à Educação Infantil, ao Ensino Médio e a Educação Superior na dimensão pública, inclusive, nas faixas etárias adequadas aos níveis; como também, no referente a qualidade da educação pública e a democratização da gestão escolar. É no intuito de atender essas demandas que os governos têm criado planos, programas e projetos a fim de materializar o que está previsto nas diretrizes dos organismos multilaterais mundiais e na legislação nacional. A exemplo temos o PDE/PAR, que tem como proposta efetivar o regime de colaboração federativa brasileiro por meio da assistência técnica e financeira aos entes federados.
Ao analisar a experiência de um Município Potiguar no relativo a área da gestão Educacional, especificamente no tocante a gestão democrática e ao indicador dos Conselhos Escolares, percebemos que seu escore de avaliação é insuficiente, não existindo conselho escolar em metade das escolas pesquisadas, e mesmo naquelas que possuíam conselho não funcionavam adequadamente, havendo reuniões esporádicas. Diante dessas análises, percebemos que a participação da comunidade na gestão do sistema municipal de educação era incipiente e homologatória. A administração municipal estava direcionada a implementar o viés de gestão proposto por um programa gerencialista da Fundação Airton Senna que estava sendo desenvolvido no Município, em detrimento da gestão democrática de matiz democrático-participativa.
Desse modo apreendemos a necessidade do espaço escolar atender a importância de institucionalizar as práticas democráticas dentro das instituições de ensino, pois essas são responsáveis não só por passar conhecimentos científicos, mas também, por outros culturalmente adquiridos e construídos. A escola é um ambiente de arranjo social e sua cultura interfere diretamente nos sujeitos que nela estão envolvidos. Dessa forma, entende-se que as práticas democráticas nas unidades de ensino conduzam os sujeitos a uma cultura democrática.
Nesse sentido, o conselho é o espaço de oportunidade de participação das camadas excluídas historicamente da sociedade e, ainda, como espaço de fiscalização e controle das políticas públicas. Sendo assim, torna-se o lugar de tomada de decisões envolvendo todos os participantes que representam os diferentes segmentos da comunidade escolar, contribuindo para uma escola democrática.
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