OS IMPACTOS DO PROGRAMA DE MODERNIZAÇÃO DA GESTÃO PÚBLICA – METAS PARA A EDUCAÇÃO (PMGP –ME) NAS PRÁTICAS DE GESTÃO ESCOLAR EM PERNAMBUCO

Resumo: Esta pesquisa versa sobre o Programa de Modernização da Gestão Pública/Metas para a Educação do estado de Pernambuco (PMGP – ME). Desse modo, objetivou avaliar o Programa de Modernização da Gestão Pública/Metas para a Educação do estado de Pernambuco, buscando apreender particularmente a concepção de gestão escolar no interior dessa política, além de identificar seus possíveis impactos nas práticas de gestão escolar. Utilizou-se da abordagem qualitativa e para a coleta de dados os documentos da política em análise: PMGP e a Nota Técnica. Percebeu-se um discurso da política em que a educação visa o desenvolvimento econômico. Detectou-se, também, a ideia de gestão democrática, mas que imprime pouca autonomia para a escola.

Palavras-chave: Educação; Gestão Escolar; Política Educacional.


INTRODUÇÃO

Este estudo está inserido na pesquisa intitulada Avaliação educacional, bônus do desempenho e gestão escolar no contexto dos padrões da regulação da política educacional de Pernambuco, que investigou o modo como as escolas estaduais de Pernambuco, atualmente, vivenciam as práticas de gestão escolar no âmbito de uma política de educação estadual que articula avaliação educacional, recompensa do professor pelo seu desempenho por meio de fornecimento de bônus, e metas e resultados no interior do Programa de Modernização da Gestão Pública.

A gestão das escolas tem sido foco frequente de estudos e pesquisas desenvolvidas aqui no Brasil. Isso se deve aos contornos que marcam a política educacional brasileira atual. É do nosso conhecimento que as últimas décadas do século passado e início desse século estão marcados por mudanças estruturais na organização social, política e econômica no mundo e no nosso país.

Tomando a questão da ampliação do atendimento educacional, medidas foram tomadas tendo como preceito básico para a condução das ações e melhoria da qualidade do ensino, o processo de descentralização das ações, o que trouxe para o chão das escolas maiores responsabilidades. Medidas estas que trouxeram maiores responsabilidades para a gestão escolar no âmbito da política educacional.

Nessa perspectiva vão se caracterizando as políticas reguladoras, onde se insere o Programa de Modernização da Gestão Pública (PMGP) para a área de educação, implementado em 2008 pelo ex-governador Eduardo Campos. Este Programa está focado na melhoria dos indicadores educacionais do estado, em que o governo definiu metas a serem cumpridas ano a ano, pelos gestores escolares e pelas Gerências Regionais de Educação (GREs). O Programa se afirma como um conjunto de iniciativas para melhorar os indicadores educacionais (diminuição das taxas de repetência, evasão escolar e analfabetismo). Tais considerações nos leva a questionar: Quais os impactos dessa política nas práticas de gestão escolar?

Para responder o questionamento acima, objetivamos, no âmbito geral, avaliar o Programa de Modernização da Gestão Pública/Metas para a Educação do estado de Pernambuco, buscando apreender particularmente a concepção de gestão escolar no interior dessa política, além de identificar seus possíveis impactos nas práticas de gestão escolar.

Para atender esses objetivos optamos por realizar uma análise dos documentos que são referentes para essa política, especificamente trabalhamos com o documento oficial do PMGP e a Nota Técnica do IDEPE. Esses tipos de fontes “requer uma análise mais cuidadosa, visto que os documentos não passaram antes por nenhum tratamento científico” (OLIVEIRA, 2007, p. 70). Desse modo, realizamos uma leitura cuidadosa para identificar concepções expostas pelo documento.

Esse trabalho pautou-se numa abordagem qualitativa que, embora seja “criticada por seu empirismo, pela subjetividade e pelo envolvimento emocional do pesquisador” (MINAYO, 2001, p. 14), proporciona um aprofundamento maior com o objeto de estudo.

Justifica-se a pertinência desse trabalho a possibilidade de discussão sobre o conteúdo e direcionamento dos documentos que embasam a política educacional do estado de Pernambuco.

CONTEXTUALIZAÇÃO DA POLÍTICA EDUCACIONAL DE REGULAÇÃO EM PERNAMBUCO

As políticas educacionais fazem parte das políticas públicas e se configuram como um conjunto de interesses voltados para a melhoria na área da educação. Através dos avanços, no campo teórico, e das lutas dos movimentos sociais, os interesses dessas políticas vão sendo modificados, incorporando novas concepções teóricas. Azevedo (2004) apresenta algumas das diversas abordagens que contribuem para o estudo das políticas educacionais como política pública. Entre elas, a que o Estado atua como regulador das relações sociais, a serviço da manutenção do capitalismo.

A abordagem neoliberal, presente nessa política educacional, segundo Azevedo (2004), põe em xeque o modo de organização social e política gestora. Traz a máxima de “menos Estado e mais mercado”, concebida pelo liberalismo clássico. Dessa forma, para os neoliberais, o mercado possui capacidade de regular o capital e o trabalho, considerando que este teria condições de regularizar as necessidades sociais. Já que, entendem as políticas públicas como as principais responsáveis pela crise que perpassa as sociedades. Azevedo (2004, p.12) reitera que:

A intervenção governamental, de acordo com esta abordagem, tende a igualar artificialmente as condições de concorrência e de competitividade entre novos e velhos sujeitos, coibindo e ameaçando os estímulos individuais necessários à produção e à competição numa sociedade livre.

Em relação à política educacional, os neoliberais não questionam a responsabilidade estatal para esta área, pelo contrário, consideram importante esse setor ser subsidiado pelos recursos públicos, uma das poucas áreas que admitem exceção. Dentro dessa perspectiva, as políticas educacionais tomam a característica do governo vigente, o qual é responsável pela implementação de programas e projetos de manutenção do sistema educacional.

Outra característica consiste na forte vinculação com a avaliação educacional, que vêem tomando contornos, do que Afonso (2009) vai chamar, de Estado avaliador. Podemos dizer, com base em Vianna (2009), que atualmente crescem as medidas de regulação da educação pública via política de avaliação educacional. Concomitantemente com os estudos dessas políticas educacionais, fez-se fundamental a compreensão sobre avaliação educacional. Entendido que a avaliação não é externa aos processos de educação. Ela não é uma ação isolada.

A avaliação não é um valor em si e não deve ficar restrita a um simples rito da burocracia educacional, necessita integrar-se ao processo de transformação do ensino/aprendizagem e contribuir, desse modo, ativamente, para o processo de transformação dos educandos. (VIANNA, 2009, p. 13).

Segundo o autor, a avaliação precisa estar ligada à pesquisa educacional voltada para a realidade dos problemas educacionais relevantes. Assim como a importância da contextualização das problemáticas, outro aspecto importante é a sua funcionalidade, e sua relevância dentro do sistema educacional. O que fazer com os dados dessas avaliações? É uma das perguntas muito debatidas na área de educação, já que segundo Vianna (2009, p.23) “as avaliações de sistemas levantam um número considerável de informações que nem sempre são tratadas adequadamente”.

Nesse campo, vemos se avolumar as medidas de regulação da educação pública via política de avaliação educacional. Destacam-se nessas medidas a utilização de diferentes procedimentos de avaliação externa com a aplicação de exames estandardizados a estudantes (ESTEBAN, 2011). No Brasil as avaliações externas são aplicadas a estudantes dos diversos níveis e modalidades de ensino, tais como o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (para o ensino superior), Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM), Prova Brasil e Provinha Brasil, dentre outros. Essas ações levam diferentes analistas a afirmar que estamos diante de uma abrangente e eficiente política de avaliação educacional em nível nacional (CASTRO, 2009; ESTEBAN, 2011).

O estado de Pernambuco é um dos exemplos da implantação da política regulatória, já que sua reforma educativa no que diz respeito à educação primou por ações de avaliação do seu sistema educativo atrelado ao oferecimento do bônus por desempenho. Esse sistema de monitoramento é composto por equipe técnica e sistema informatizado. Ele permite registrar, medir, analisar e consolidar informações referentes à frequência, tanto dos alunos quanto dos professores; o planejamento das aulas, ou seja, o que foi previsto e o que foi realizado, também é possível saber a idade e a série em que tais alunos estão matriculados.

O Sistema de Avaliação Educacional de Pernambuco (SAEPE) e a remuneração por desempenho foram idealizados desde os anos 2000 (na gestão do governador Jarbas Vasconcelos), mas foi aprofundado e reelaborado pelo governo de Eduardo Campos que assumiu em 2007. Assim, foi aperfeiçoado o SAEPE e definido o Bônus de Desempenho Educacional (BDE), que consiste numa “premiação por resultados que beneficia os servidores lotados e em exercício nas unidades da rede pública estadual de ensino, baseado em metas objetivas a serem alcançadas pela escola” (PERNAMBUCO, 2008a, p. 7).

O resultado do SAEPE, junto com os dados do fluxo escolar, geram o Índice de Desenvolvimento da Educação de Pernambuco (IDEPE). A bonificação é baseada na média de proficiência dos estudantes no SAEPE e na média da taxa de aprovação dos estudantes (medida pelo Censo Escolar), cálculo que gera o IDEPE.

A escola que alcançar a partir de 50% da meta estabelecida será contemplada com o Bônus de Desempenho Educacional. Para participar do BDE é necessário que a escola tenha o seu IDEPE, que é calculado utilizando o resultado do SAEPE e da taxa de aprovação, medido pelo censo escolar. (PERNAMBUCO, 2008a, p. 2)

Ou seja, a política educacional pernambucana vem implementando ações de regulação que impactam diretamente o cotidiano das escolas e, certamente, impactam as práticas de gestão escolar que tendem a ser impregnadas de novos sentidos e significados em busca do atendimento das metas predefinidas.

A POLÍTICA DE EDUCAÇÃO EM PERNAMBUCO: CARACTERIZANDO O PROGRAMA DE MODERNIZAÇÃO DA GESTÃO PÚBLICA (PMGP)

O Programa de Modernização da Gestão Pública (PMGP) é uma ampliação do Projeto de Modernização da Gestão e do Planejamento do Estado de Pernambuco (PENAGE-PE) instituído pelo então Governador Mendonça Filho e regulamentado pelo decreto nº 29.289, de 07 de junho de 2006. O Governador Eduardo Campos (2007–2014) foi responsável por consolidar o Programa que se insere no contexto do modelo administrativo gerencial de Estado (SILVA, 2013).

O Projeto é descrito por Silva (2013) como não sendo inovador, pois o estado de Minas Gerais havia tido tal experiência. Logo, segundo autor, não se trata de uma coincidência conceitual, e sim, de partes de um mesmo movimento que tem o Movimento Brasil Competitivo (MBC) como idealizador e articulador de um novo segmento de reforma gerencial no país.

Para entender o Programa é preciso conhecer o modo como ele está estruturado. O Programa abrange a gestão do Estado de um modo geral. No âmbito educacional, apresenta o “Metas para Educação”, onde a Secretaria de Educação estabelece indicadores objetivos relativos às ações que influenciam na aprendizagem dos estudantes e metas individuais para cada escola. Possui como termo norteador o documento chamado “Termo de Compromisso”, onde estão os objetivos educacionais e metas claras por escolas para alcançar o Índice de Desenvolvimento da Educação de Pernambuco (IDEPE). Possui também o Sistema de Avaliação Educacional de Pernambuco (SAEPE) e o Bônus por Desempenho Educacional (BDE) que é um incentivo para as escolas que alcançam as metas estabelecidas e o Sistema de Monitoramento de indicadores de processos e resultados.

O Termo de Compromisso contempla todos os indicadores de processo que influenciam na melhoria da qualidade do ensino, como infraestrutura, quadro de pessoal e currículo (PERNAMBUCO, 2008b, p.9). Assim, para assegurar o cumprimento desse Termo, foi concebido o Sistema de Monitoramento nas escolas estaduais. Esse sistema que objetiva o alcance das metas estabelecidas para as escolas prevê um conjunto de atividades gerenciais focadas no desenvolvimento dos processos-meios. Segundo o Programa, também permite:

O registro, a consolidação, a medição e a análise das informações referentes à freqüência dos alunos e dos professores; as aulas previstas e as efetivamente ministradas; o desenvolvimento do currículo, a idade e a série em que os alunos estão matriculados (PERNAMBUCO, 2008b, p.10).

O monitoramento ocorre nas diversas instâncias da seguinte forma hierárquica: 01 (um) técnico educacional habilitado em pedagogia realiza o acompanhamento diário das atividades na escola, outro técnico com a mesma formação situado na Gerência Regional de Educação (GRE) fica responsável por monitorar um conjunto de 10 escolas. As GREs por sua vez têm suas ações acompanhadas por 01 (um) técnico educacional da Secretaria Executiva de Gestão Escolar (SEGE). A análise dos resultados e averiguação das ações executadas em conformidade com o Termo de Compromisso e o Plano de Ação das Escolas fica a cargo do gestor de monitoramento. Ele é quem coordena as ações de monitoramento na rede de ensino.

O SAEPE serve também como referência para o monitoramento das escolas, pois “avalia a aprendizagem dos alunos e o fluxo escolar, medido pelo Censo e que determina a taxa de aprovação em cada ciclo: 1ª a 4ª série; 5ª a 8ª série e Ensino Médio” (PERNAMBUCO, 2008b, p. 10). Esse sistema de avaliação foi idealizado na gestão do governador Jarbas Vasconcelos, mas só no governo de Eduardo Campos, em 2007, foi aprofundado e reelaborado. A partir de 2008 passou a ser realizado anualmente. Os resultados do SAEPE são referentes à aprendizagem dos estudantes e a taxa de aprovação, medido pelo censo escolar que compõem o IDEPE. O índice estadual é o cruzamento de dados do SAEPE E do fluxo escolar.

Sobre o BDE, a Nota Técnica do IDEPE (PERNAMBUCO, 2008a, p.7) diz que é a uma premiação por resultados que beneficia os servidores lotados e em exercício nas unidades da rede pública estadual de ensino, baseado em metas objetivas a serem alcançadas pela escola. Não faz parte do salário normal dos servidores, é mais um incentivo. Ainda segundo a Nota Técnica, ele é instituído e regulamentado pelas leis 13.486 de 01 de julho de 2008, 13.696 de 18 de dezembro de 2008 e o decreto nº 32.300, de 08 de setembro de 2008.

Por visar mudanças para obter uma gestão bem sucedida, o PMGP entende, numa perspectiva neoliberal, que o sistema educacional “enfrenta uma crise gerencial” (GENTILI, 1996, p.17) e por essa razão, o Estado introduz mecanismos que regulem a eficiência desse sistema.

CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO, ESTADO E A GESTÃO ESCOLAR

Um dos argumentos para a implementação do Plano de Metas do governo de Pernambuco (2008b, p.3) diz que “é com a educação que conseguimos avançar em novas oportunidades. É com gente qualificada que conseguimos superar as taxas de desemprego e melhorar os indicadores sociais do nosso Estado e, consequentemente, a qualidade de vida dos pernambucanos”. Contextualizando assim, que há um empreendedorismo no estado que impulsiona um desenvolvimento econômico tornando, por isso, prioritário o investimento na área da educação, já que:

Este cenário só aumenta a nossa responsabilidade. É fundamental que o Estado esteja preparado para receber estas conquistas, potencializando as oportunidades que vão elevar a qualidade de vida dos pernambucanos com mais empregos e geração de renda. E, é consenso entre todas as esferas de Governo que não há desenvolvimento econômico sem que seja priorizada a educação (CAMPOS, apud,PERNAMBUCO, 2008, p. 3).

Ou seja, a educação foi pautada como a base que sustentará o desenvolvimento de Pernambuco, possibilitando, prioritariamente, qualificação para as pessoas adentrarem no mercado de trabalho. O Programa evidencia a relação entre educação e trabalho, quando justifica a sua implementação dizendo que “é o meio mais eficaz para o Estado alcançar os objetivos desejados” (PERNAMBUCO, 2008b, p.5). Dessa maneira, a educação se torna a principal estratégia de elevar a economia, distanciando-se da educação para formação humana. A educação que seja capaz de formar um sujeito crítico, com conhecimento vasto, e detentor de uma visão ampla, não só do seu trabalho, mas do contexto geral no qual está inserido.

O desafio da educação vinculada ao trabalho é entender o sujeito em formação como alguém que não vai ser somente instrumentalizado para atender às exigências de um mercado de trabalho específico, mas alguém preparado para assumir uma postura crítica perante a sociedade, exercendo de fato sua cidadania dentro e fora de um ambiente de trabalho. (FRIGOTTO, 2005)

O Programa tem como “missão” o objetivo de assegurar, por meio de uma política de Estado, a educação pública de qualidade, focando em resultados, visando garantir o acesso, a permanência e a formação plena do aluno, pautada nos princípios de inclusão e cidadania.

Aqui buscamos entender a concepção de educação expressa nos documentos. Primeiro foi necessário compreender que a concepção de educação está ligada à uma fração do modo de vida dos grupos sociais que a criam e recriam, entre tantas outras invenções de sua cultura, em sua sociedade (BRANDÃO, 1995). Ainda de acordo com o autor, a educação participa do processo de produção de crenças e ideias, de qualificações e especialidades que envolvem as trocas de símbolos, bens e poderes que, em conjunto, constroem tipos de sociedades. E esta é a sua força.

Os documentos vão expressar uma preocupação com a educação integral com a inclusão e cidadania, no entanto em grande parte essas preocupações estão ligadas a uma inclusão para o mundo do trabalho e a cidadania para se limitar essa questão.

O Plano de Metas contido nesse Programa e elaborado pelo governo Eduardo Campos constitui o eixo da política de gestão educacional do estado pernambucano no momento atual. Como já afirmamos, as políticas educacionais refletem as características do governo vigente, e vão se expressar na adoção de programas e projetos no interior do sistema educacional. O que podemos identificar de início, é que há no governo atual de PE políticas reguladoras pautadas num processo de avaliação de desempenho dos alunos.

Nesse contexto, percebemos uma característica forte do Estado preocupado com a melhoria de indicadores, ou seja, com o resultado final, através de avaliações, ao invés de preocupações com o processo da prática educacional.

Sobre a concepção de Estado, Hofling (2001, p.31) afirma que “é um conjunto de instituições permanentes que possibilitam a ação do governo”. Complementar à essa ideia, o sociólogo Max Weber (apud MOTTA, 1945, p.26) aponta que “o Estado possui um aparelho ideológico que transmite o sistema de ideias que interessam à classe dominante e ao próprio Estado”. O autor então cita a escola como esse aparelho ideológico do Estado. Ou seja, para Weber o Estado é responsável pela organização e controle da sociedade e para isso se utiliza de alguns tipos de aparelhos, sejam eles repressivos, econômicos ou ideológicos, para garantir a estabilidade social. Para isso, são colocadas em ação as políticas públicas.

Estruturado no conceito de Estado avaliador/regulador (AFONSO, 2009, p.50), o PMGP diz monitorar o desempenho dos estudantes ao longo do tempo, como forma de avaliar continuamente o projeto pedagógico de cada escola, possibilitando a implementação de medidas corretivas quando necessário (PERNAMBUCO, 2008a, p.3). Sendo assim, possui o sistema de avaliação educacional de Pernambuco (SAEPE), que segundo o programa:

Fornece informações anuais sobre o desempenho das escolas. Dados que subsidiam a tomada de decisões, com o objetivo de solucionar os problemas detectados além de permitir a realização de intervenções para melhorar resultados e verificar se as metas estabelecidas foram atingidas (PERNAMBUCO, p. 2008b, p. 11)

Ou seja, os resultados obtidos pela avaliação devem estar em consonância com as metas estabelecidas pelo Termo de Compromisso, que é um documento assinado pela gestão escolar e pela Secretaria de Educação com o propósito de assegurar o cumprimento de metas individuais de cada escola. A avaliação reaparece claramente relacionada com funções gestionárias tendendo a ser, como refere House (1993, citado por AFONSO, 2009, p. 118), uma “avaliação centrada na eficiência e na produtividade sob o controlo direto do Estado”.

A função da regulação normalmente é manter o equilíbrio, tanto físico quanto social, de qualquer sistema. É possível identificar perturbações que podem tornar o sistema desequilibrado, e dessa maneira, poder transmitir ordens para os órgãos executores. (BARROSO, 2005).

Concomitantemente com os estudos de políticas educacionais, fez-se fundamental a compreensão sobre avaliação educacional, pois, esta não é externa aos processos de educação. Segundo Vianna (2009, p.13) a avaliação não é uma ação isolada, não deve ficar restrita a um simples rito da burocracia educacional, necessita integrar-se ao processo de transformação do ensino/aprendizagem e contribuir, desse modo, ativamente, para o processo de transformação dos educandos.

Logo, e segundo o autor, a avaliação precisa estar ligada à pesquisa educacional voltada para a realidade dos problemas educacionais relevantes. Assim como a importância da contextualização das problemáticas, outro aspecto importante é a sua funcionalidade.

A avaliação educacional não objetiva subsidiar, exclusivamente, a cúpula administrativa; à avaliação deve seguir-se um trabalho bem planejado de difusão dos resultados e das suas análises, a fim de que a sociedade (interna e externa ao sistema) acompanhe o trabalho institucional e possa julgar o seu mérito, inclusive e eficiência transformadora da sua ação. (VIANNA, 2009, p.15)

Freitas (2012), denomina de neotecnicismo o conceito que centraliza a ideia de controle dos processos para garantir resultados definidos a priori como “standards”, medidos em testes padronizados. Segundo a Nota Técnica (2008a, p.3):

O cálculo do IDEPE acompanha os procedimentos estabelecidos pelo Ministério da Educação para o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), cujo objetivo é o de que, em 2022, bicentenário da nossa independência, a qualidade da educação do Brasil seja comparável à dos países desenvolvidos hoje.

O IDEPE propõe dar visibilidade à qualidade da educação estadual, compondo-se da média dos alunos nas avaliações de Língua Portuguesa e Matemática do SAEPE e da taxa de aprovação conforme o Censo Escolar. Esse tipo de prestação de contas, segundo Afonso (2009, p.122), reforça o já designado “paradoxo do Estado neoliberal”, pois,  o Estado não abre mão de controlar mais de perto os resultados escolares e educacionais, mas, ao mesmo tempo, permite que os resultados/produtos do sistema educativo sejam controlados pelo mercado ao serem estandardizados.

Observando a gestão escolar no interior dessa política e suas implicações na prática do cotidiano escolar. Como já visto, a necessidade de mão-de-obra qualificada fez com que o governo justifica-se a implantação de um modelo de gestão voltado para resultados educacionais que suprissem essa demanda. O “estado avaliador”, como denomina Afonso (2009, p.49), admite a lógica do mercado, através da importação para o domínio público de modelos de gestão privada, com ênfase nos resultados ou produtos dos sistemas educacionais. Neste sentido, o Estado adota uma cultura gestionária (ou gerencialista) no setor público e cria mecanismo de controle e responsabilização mais sofisticados.

Diante disso, a gestão escolar configura-se nesse ambiente de cobranças e ações para resultados macropolíticos onde o governo afirma que para uma gestão bem sucedida “uma série de ações estão sendo desenvolvidas no sentido de fortalecer a autonomia das escolas [...]” (PERNAMBUCO, 2008b, p.11, grifo nosso). É conflitante esse ponto de vista, já que o PMGP contém um termo de compromisso a ser assinado pela gestão da escola e pela secretaria de Educação onde assegura o cumprimento das ações da política educacional na elaboração do projeto político pedagógico. Fragilizando a gestão escolar e reduzindo a sua autonomia em cumprimento de metas de melhoria de indicadores como o Índice de Desenvolvimento da Educação de Pernambuco (IDEPE).

Aqui nessa pesquisa concebemos a gestão escolar é um trabalho de planejamento, ela transforma metas e objetivos educacionais em ações dando concretude às direções traçadas pelas políticas. A gestão está a serviço da finalidade da escola. Segundo Botler (2007, p.136)

[...] O gestor escolar, no conjunto que lidera a ação coletiva na escola, desempenha papel fundamental de educador na formação coletiva em exercício não se restringindo á organização das ações do coletivo. O projeto da gestão torna-se o projeto da escola e delineia-se como atividade organizada, que coordena ações de um coletivo de humanos e que tem por objetivo resolver um problema que é do coletivo. (p.136)

Os objetivos da gestão escolar são os da educação. O gestor é delegado para responder por todos, mas ele não pode responder sozinho por todos. É necessário um trabalho em conjunto que possibilite a participação do coletivo na decisão, visando a autonomia das escolas públicas. Mas, na proposta de gestão escolar do PMGP, não fica claro espaço para esse trabalho coletivo com foco na autonomia. O que foi possível perceber é que o trabalho coletivo deve ir em busca do alcance de metas pré-determinadas, e que, muitas vezes, não são frutos de decisões coletivas.

Com a justificativa de motivar à participação de todos os profissionais o ex-governador, Eduardo Campos, nas palavras introdutórias do PMGP diz que:

O novo sistema também incentiva os profissionais que vivem o dia-a-dia da escola (diretor, professor, coordenador e funcionários) para trabalharem de forma agregadora e com mais entusiasmo, uma vez que uma política de incentivos também foi pensada para esses trabalhadores. (PERNAMBUCO, 2008b, p.5)

O incentivo que o governo menciona é nada mais, nada menos que a política de remuneração por mérito chamada de Bônus de Desempenho Educacional (BDE). Alguns estudiosos como Silva (2013) entendem que essa estratégia é de responsabilização ao professor e a gestão escolar pelo mau andamento do ensino público. Logo, o objetivo dessa política de promover a qualidade do ensino está vinculado à valorização da remuneração dos professores e demais profissionais da escola. Menezes (2010, p.5) adverte que:

A política de bônus serve apenas como um “cala boca” e fragmentador da mobilização dos docentes. Com sua concessão é aleatória, quem “ganha” o bônus acaba, por sua vez, sendo cooptado na ilusão de ampliação financeira em seus proventos.[...] É responsabilizar os professores pelo caos na rede pública e deixar cada vez mais difíceis as condições de trabalho e sobrevivência dos docentes.

De fato, a gestão está submetida às políticas públicas de tal maneira que a sua finalidade maior é alcançar bons resultados nos índices para gerarem status ao estado e/ou país. Assim, a gestão escolar será cobrada e cobrará os docentes através dos bons resultados das avaliações de larga escala.

CONCLUSÕES

O discurso da política revelado nos documentos considera a educação em sua vinculação mais forte com o trabalho, colocando como foco principal a educação para o desenvolvimento econômico. Do ponto de vista da concepção de Estado, detectou-se uma vinculação com a concepção de estado avaliador e estado regulador, que, nesse caso, busca vincular-se também com uma ideia de gestão democrática, mas na prática, imprime pouca autonomia para a escola.

Outra questão que provoca controvérsias é a política de remuneração por mérito, no caso o BDE. Pois, os profissionais são remunerados a partir do momento que atingem as metas.

Percebe-se nos documentos que implementam essa “nova” políticas públicas de educação em Pernambuco a ênfase na responsabilidade de professores e gestores sobre resultados alcançados. Essa responsabilização permite por em prática um “novo” conceito para gestão, conhecido como “gerencialismo”, o qual fundamentam o comportamento competitivo e a luta pela vantagem” e que tais valores estão sendo cada vez mais disseminados na educação.

Assim, esse é o pensamento e a forma de inserir no setor público uma cultura empresarial/competitiva que visa atender a lógica do mercado. Desta forma o governo diminui suas responsabilidades no fracasso educacional, pois bons exemplos aparecem como resultados não levando em consideração os contextos em que cada escola está inserida.

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